Novas regras para a demissão
A Reforma Trabalhista (Lei n; 13.46) traz mais de 100 modificações à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que entrarão em vigor 120 dias após a sanção pelo presidente Michel Temer, ocorrida em 13 de julho, e só valerão para contratações feitas a partir disso (leia Palavra de especialista, na página 4). Algumas dessas alterações afetam a saída do emprego. O professor de direito processual e material do trabalho da Universidade Católica de Brasília (UCB) Alessandro Costa explica que, pela antiga norma, eram admitidas três formas de desligamento: quando o trabalhador pedia para sair, a demissão por justa causa e a demissão imotivada. ;A nova legislação traz uma inovação: a possibilidade de demissão consensual, ou seja, um acordo entre o empregador e o empregado;, diz. Nesse caso, o patrão pagaria multa de 20% com relação ao valor depositado no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e o empregado pode sacar até 80% do fundo, mas perderia o direito ao seguro-desemprego.
Costa avalia a proposta como tentadora, pois, antes disso, quando a pessoa pedia para sair ou era dispensada por justa causa, não ganhava nada. ;A grande crítica é a possibilidade de que essa nova ferramenta seja utilizada para coagir o trabalhador ao consenso. Assim, o patrão, em vez de demitir, pressionaria o empregado a fazer um acordo, o que prejudicaria o empregado;, argumenta. O advogado trabalhista Gilberto Bento Júnior, sócio da Bento Jr. Advogados, não acredita nessa possibilidade. ;Discordo totalmente. Se a empresa fizer pressão e insistir, será assédio moral. Então, o funcionário poderá buscar os direitos dele na Justiça;, defende. De acordo com advogado trabalhista Fernando Damiani, o risco de pressão existe, mas as vantagens da nova ferramenta compensam. ;Em muitos casos, o empregado tinha vontade de mudar de emprego, mas, como a perda dele seria muito grande, ele começava a faltar e a fazer coisas que não eram da índole dele para ser dispensado. Essa nova opção é muito mais favorável;, opina.
A justificativa para a mudança é de que essa era uma prática comum e que a lei só a formaliza. ;Informalmente, era comum que o trabalhador fizesse um acordo para ser mandado embora sem justa causa e, depois, devolvia a multa de 40% ao empregador;, explica o juiz do Trabalho e professor da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Henrique Blair de Oliveira. Gilberto Bento Júnior acredita que a novidade da demissão acordada (a maior trazida pela reforma, segundo ele) não será muito aplicada na prática. ;Esses acordos não vão para a frente. Por que o trabalhador vai concordar com isso se ele pode esperar ser mandado embora e, aí, sacar tudo e ainda ganhar seguro-desemprego?;, questiona.
FIQUE SABENDO
Com a reforma trabalhista, os patrões continuam tendo de cumprir deveres na hora do desligamento. Gilberto Bento Júnior, advogado trabalhista e sócio da Bento Jr. Advogados, explica os principais:
Aviso prévio
Quando demitido sem justa causa, o profissional continua tendo direito a aviso-prévio, que pode ser indenizado (o empregado é desligado imediatamente e o empregador efetua o pagamento da parcela relativa ao período) ou trabalhado (o funcionário trabalha mais 30 dias após a dispensa). Na prática, o empregador tem a opção de avisar ao trabalhador sobre a demissão com 30 dias de antecedência ou pagar o salário referente a esses 30 dias sem que o empregado precise trabalhar.
Aviso prévio indenizado proporcional
Quando a dispensa é sem justa causa, para cada ano trabalho, há acréscimo de três dias no aviso-prévio, com limite de adicional de até 60 dias, portanto, no máximo o aviso-prévio poderá ser de 90 dias.
Pagamento da rescisão
Salvo se empresa combinar por escrito data diferente com o trabalhador, quando o aviso-prévio for indenizado, o pagamento deve ser feito até 10 dias após a dispensa. Quando o aviso-prévio for trabalhado, o valor deve ser depositado no primeiro dia útil após o desligamento.
Saldo de salário
Deve ser pago proporcionalmente com relação aos dias trabalhados no mês da demissão. Ou seja, é o salário mensal dividido por 30 e multiplicado pelo número de dias trabalhados. Com ou sem justa causa.
Férias e adicional constitucional de um terço
Todo mês trabalhado dá direito a uma proporção de férias, que equivale a um salário inteiro mais um terço. Após um ano de trabalho, esse valor deve ser depositado independentemente do motivo da dispensa. Só não será pago caso haja faltas não justificadas ou outras infrações constatadas.
13; salário
Deve ser pago todo fim de ano ou em época combinada em convenção coletiva. Caso ocorra dispensa, com ou sem justa causa, deve ser pago na proporção dos meses trabalhados, ou seja, divida o valor do salário por 12 meses para saber o valor proporcional de um mês trabalhado e multiplique pela quantidade dos meses que trabalhou para chegar ao valor correto. As datas de pagamento podem ser negociadas.
Saque do FGTS
Quem foi dispensado sem motivo ganha o direito se sacar os valores do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, incluindo o depósito correspondente ao aviso-prévio e outras verbas pagas na rescisão. O FGTS atualizado corresponde a aproximadamente um salário por ano.
Multa de 40% sobre o saldo do FGTS
Nas demissões sem justa causa, o empregador deve pagar multa de 40% do valor depositado no FGTS do trabalhador. Após a reforma trabalhista, esse direito continua igual e não pode ser alterado por acordo entre empresa e trabalhador. No entanto, uma novidade é a demissão acordada, por meio da qual a empresa paga multa de 20% e o trabalhador pode sacar 80% do valor depositado.
Seguro-desemprego
Nos casos de dispensa sem justa causa, se o empregado trabalhou o tempo necessário exigido por lei, tem o direito de solicitar as guias para receber seguro-desemprego, que devem vir junto com o TRTC (Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho). Esse direito pode sofrer alterações após a reforma trabalhista e vai variar de acordo com os novos contratos de trabalho.
Homologação da rescisão
A obrigação de homologação sindical não existirá mais após a reforma trabalhista. A nova legislação não é clara sobre a obrigação de homologação da dispensa após 12 meses no Ministério do Trabalho.
A conclusão do dono pode ser de que será mais econômico mandar a pessoa embora e depois recontratá-la como terceirizada após 18 meses Alessandro Costa, professor de direito processual e material do trabalho da Universidade Católica de Brasília
A opção da demissão acordada é favorável para patrão e empregados Fernando Damiani, advogado
Ameaças ao emprego?
Um item da reforma que, de acordo com Alessandro Costa, pode ser usado para prejudicar o empregado é a autorização da terceirização. ;Se tenho um funcionário celetista, posso contratar um autônomo para fazer as mesmas funções e não terei que pagar nenhum direito previsto na CLT. A legislação diz que não posso despedir um empregado de carteira assinada e recontratá-lo nessa modalidade num período inferior a 18 meses, mas a conclusão do dono pode ser de que será mais econômico mandar a pessoa embora e depois recontratá-la como terceirizada;, diz.
O advogado Gilberto Bento Júnior não acredita nesse risco. ;A empresa não vai querer mandar um bom empregado embora para contratá-lo de outro modo depois, pois corre o risco de perdê-lo.; O trabalho intermitente é outra novidade que assusta Paulo Henrique Blair de Oliveira. ;Para mim, esse é um dos piores pontos da reforma. O patrão pode pensar que, agora, é possível contratar uma pessoa para cada dia da semana, o que gerará mais emprego. Mas a pessoa que tinha serviço fixo perde o emprego e é trocada por sete que não vão ter uma ocupação fixa nem direitos garantidos;, lamenta.
Leia
Direito e trabalho ; Análise das reformas trabalhistas
Autor: Cláudio Armando Couce de Menezes
Editora: LTr
184 páginas
R$ 64,05
O golpe de 2016 e a reforma trabalhista ; narrativas
de resistência
Autores: Fernanda Giorgi, Gustavo Teixeira Ramos, Hugo Cavalcanti Melo Filho, Jose Eymard Loguercio, João Gabriel Lopes, Thiago Agustinho, Valeir Ertle e Wilson Ramos Filho
Editora: Canal 6
391 páginas
R$ 68
DIREITOS ;
A polêmica questão sindical
A reforma retira a obrigatoriedade da presença dos sindicatos em discussões sobre demissões coletivas e rescisões contratuais. A dica é que trabalhadores se informem sobre os próprios direitos e procurem essas associações ou pessoas de confiança antes de conversas com o patrão
Eu acho
Aldanete da Cruz Motta, 43 anos, administradora, presta suporte técnico na empresa de
TI Global Web há 11 meses, tem carteira assinada há cinco anos
;A reforma trabalhista me preocupa muito, fico assustada porque o trabalhador é a parte mais vulnerável. Como ela só vai valer para novos contratos, eu teria muito medo de deixar meu emprego atual, mesmo que recebesse uma oferta bem superior. Eu não aceitaria a demissão acordada (que é uma novidade da legislação trabalhista): se posso levar o FGTS completo, não teria porque concordar em pegar só 80% e ainda uma multa rescisória menor e nenhum seguro-desemprego. Só é vantajoso para a empresa. Outra questão problemática é a dos sindicatos (mesmo que o da minha categoria não seja tão forte), que serão enfraquecidos, e, querendo ou não, são entidades que existem para nos proteger e pressionar o patrão. A única coisa que vejo de positivo na reforma é o fato de agora podermos parcelar as férias: eu sempre tive de pegar 30 dias corridos. Mas em um ano a gente fica muito cansado, será bom poder pegar alguns dias depois.;