Trabalho e Formacao

Empregadores valorizam cada vez mais as competências socioemocionais

O mercado corporativo moderno procura pessoas com esse tipo de habilidade, que envolve empatia, trabalho em equipe, gestão do tempo e, mais importante, relacionamento interpessoal. São atributos que não se aprende necessariamente em sala de aula, mas as instituições de ensino podem, sim, ajudar

Thays Martins
postado em 25/03/2018 15:57

Pesquisa do Senai revelou que os egressos têm bom desempenho em competências comportamentais

O mercado corporativo moderno valoriza cada vez mais pessoas com esse tipo de habilidade, que envolve empatia, trabalho em equipe, gestão do tempo e, mais importante, relacionamento interpessoal. São atributos que não se aprende necessariamente em sala de aula, mas as instituições de ensino podem, sim, ajudar

Imagine a seguinte situação: em uma reunião de trabalho, alguém discorda de você de modo acalorado. Você saberia lidar com esse cenário sem perder as estribeiras? De acordo com especialistas, conseguir manter o equilíbrio nesse tipo de ocorrência está entre as capacidades mais procuradas por empregadores nos trabalhadores. Claro que isso não significa agir de modo frio, sem sentimentos, muito pelo contrário: quer dizer ter maturidade emocional, social e psicológica, sabendo lidar com as próprias emoções e respeitando os outros. Empatia, proatividade, curiosidade, trabalho em equipe e relacionamento interpessoal entram para o rol das competências socioemocionais, que se tornaram as queridinhas dos recrutadores nos dias de hoje. São atributos que não dá para passar a ter estudando ou lendo teorias. A boa notícia é que esse tipo de habilidade não se adquire apenas como traço de personalidade ou a partir da criação familiar, é possível desenvolver e melhorar sempre, a partir da vivência e da força de vontade.

Em alta
;Essas são competências que estão em evidência. As pessoas têm que saber se relacionar. Mesmo no mundo virtual, a interação está muito presente. O bom profissional tem que saber usar a inteligência emocional. Todo mundo tem opinião e eu posso discordar dos outros, mas tenho que ter argumentos e saber ouvir;, explica a professora de gestão de pessoas da Fundação Getulio Vargas (FGV) Ligia Molina. Segundo a psicóloga e mestre em psicologia Adriane Reis, as pessoas que dominaram essas competências têm mais chances de se dar bem no mercado de trabalho. ;Claro, isso é positivo para o trabalhador também, que passa a saber lidar com o que sente, conseguindo mais satisfação e prazer no emprego;, destaca. Edna de Oliveira, vice-reitora de Gente e Gestão de pessoas do Centro Universitário Augusto Motta (Unisuam), elenca algumas habilidades desse tipo que são essenciais. ;Ser estável emocionalmente, ter resiliência, saber lidar com conflitos. Isso é imprescindível porque o mundo muda o tempo todo.;

Júlia, Marcela e Camila, alunas do 3º ano do ensino médio integrado a curso técnico em administração

De acordo com Edna, quem quer garantir empregabilidade daqui para a frente precisa passar a se preocupar com isso. ;O profissional do futuro tem de assumir as responsabilidades de buscar melhorar nesse sentido;, aponta. ;O mundo vai virar robô. O ser humano está sentindo falta de sensibilidade, todo mundo está muito ansioso, então esse conhecimento socioemocional se torna ainda mais importante;, diz. Ligia Molina, que é coach de carreira, concorda. ;A motivação para a maior parte das contratações é o currículo, mas 90% dos casos dos desligamentos se devem ao comportamento;, reforça. O caminho para melhorar nesse aspecto, ensina Ligia, é o autoconhecimento. ;A pessoa precisa saber quais são seus pontos positivos e negativos. Isso vale para a parte comportamental e também para a técnica. E é preciso melhorar de forma genuína. Assim ganham tanto a empresa quanto você;, diz. Edna de Oliveira, administradora de empresas, pondera que falta a muitas pessoas humildade para entender o que precisam melhorar.

Autoconhecimento
;É utopia pensar que tem alguém bom em tudo, então, você tem que conhecer suas forças e fraquezas;, destaca. Para a administradora e coach de carreira Leila Arruda, o mais importante no ambiente de trabalho moderno é saber lidar com o seu estado emocional. ;Por exemplo, saber expor o que está pensando tomando cuidado para não gerar atrito com seu jeito de falar.; Para chegar lá, a professora de psicologia da Universidade Católica de Brasília (UCB) Adriane Reis dá dicas.

;Conviver mais socialmente, participar da vida em comunidade é importante para aprender a lidar com diferenças de idade, valores, criação, algo que se transporta para o ambiente corporativo. De acordo com Edna, o convívio é necessário para desenvolver boas relações. ;Conecte-se com pessoas que se destacam no mercado de trabalho. E isso não só quando você estiver desempregado. O mundo precisa de conexão, a gente não é máquina, a tecnologia não substitui as relações.;

Formação acadêmica

A escola, os cursos técnicos e as faculdades têm preparado os profissionais socioemocionalmente? Para a professora de psicologia Adriana Reis, a resposta é não. ;Nem por tanta responsabilidade das instituições de ensino, mas mais por uma característica dos estudantes. Na minha realidade, a gente prevê que os alunos façam trabalhos em grupo, isso faz parte do processo de desenvolvimento de competências, mas existe uma grande resistência, eles reclamam, dizem que nem todo mundo tem o mesmo ritmo, preferem fazer sozinhos;, justifica. Para ela, essa é uma característica dessa geração. ;Por causa das novas tecnologias e da facilidade de acesso à informação, as pessoas ficam mais isoladas;, diz. ;O Ministério da Educação prevê o desenvolvimento dessas habilidades desde o ensino fundamental, a ideia é que os alunos cheguem ao ensino técnico ou superior mais bem preparados para lidar com essas questões sociais;, destaca. No entanto, essa não é a regra.

A coach Leila Arruda acrescenta que cada um precisa fazer um esforço para se desenvolver, não basta esperar a atuação de instituições de ensino. ;Qualquer escola ou faculdade ensina a parte técnica, mas a pessoa precisa ir atrás e praticar. O curso ajuda, mas não basta. O mesmo ocorre com as habilidades comportamentais;, observa. Entretanto, não se pode negar que há, sim, estabelecimentos educacionais investindo em atributos que vão além dos técnicos, pois perceberam que eles valem ouro no mercado de trabalho. E isso ajuda quem passa por uma formação assim a se sair bem profissionalmente. É o caso do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), que fez uma pesquisa de acompanhamento com egressos para medir as competências socioemocionais dos ex-alunos. Pessoas que fizeram cursos técnicos e de qualificação em escolas do sistema se saíram bem em testes que avaliaram aplicação de princípios éticos, capacidade de negociação, trabalho em equipe, resolução de problemas e flexibilidade para lidar com mudanças: tirando uma média de 8,5 pontos de um total de 10.

De acordo com Felipe Morgado, gerente-executivo de Educação Profissional do Senai Nacional, o resultado é explicado por ações feitas durante todo o curso. ; Aqui, nós desafiamos os alunos a resolverem problemas e a trabalharem em equipe por meio de situações reais;, diz. Para ele, essa é uma forma de preparar jovens profissionais para o futuro. ;A indústria 4.0 está aí. Cada vez mais, exige-se que as pessoas tenham criatividade e inteligência emocional, além de saber administrar o tempo e se adaptar rapidamente a novos desafios.; Por essa abordagem diferenciada, alunos da instituição são só elogios para a formação ministrada ali. ;Temos uma visão profissional diferente, seguimos normas de empresa. Dentro de sala, em matérias, e em eventos, entendemos como é o mercado e aprendemos sobre gestão de tempo, comunicação e trabalho em equipe;, conta Marcela Vieira Lima, 16 anos, aluna do 3; ano do ensino médio do Serviço Social da Indústria (Sesi), com integração ao curso técnico em administração no Senai do Gama.

A colega Júlia Karoline de Oliveira, 16, acrescenta que essas competências são adquiridas nas atividades práticas. ;Nós não ficamos restritos à sala de aula, temos que criar uma empresa, então, é uma aplicação real do que a gente aprende;, diz. Palestras e outras programações também ajudam os estudantes a traçarem metas para o próprio futuro. Camila Pereira, 17, por exemplo, pretende trabalhar no Exército. ;Tivemos um seminário muito motivacional com militares;, explica. Na opinião dela, as competências que está adquirindo podem ajudá-la bastante na carreira que escolheu.

Treinamento

Inteligência emocional
Entre 6 e 8 de abril, Brasília recebe o curso Método CIS. Durante o programa, os participantes terão aulas com conteúdo cujas bases se ancoram na neurociência, na física quântica, na psicologia positiva e na programação neurolinguística, com o objetivo de proporcionar mudanças reais em todas as áreas da vida, por meio das competências emocionais. Organizado pela Febracis (Federação Brasileira de Coaching Integral e Sistêmico), o curso ocorre no Centro Internacional de Convenções do Brasil (CICB). As inscrições custam R$ 1.700 e podem ser feitas pelo link bit.ly/metodoCIS. Informações pelo e-mail brasilia@febracis.com.br.

No mercado

Confira relatos de ex-alunos do Senai sobre inserção e habilidades comportamentais

O mercado corporativo moderno procura pessoas com esse tipo de habilidade, que envolve empatia, trabalho em equipe, gestão do tempo e, mais importante, relacionamento interpessoal. São atributos que não se aprende necessariamente em sala de aula, mas as instituições de ensino podem, sim, ajudar

O mercado corporativo moderno procura pessoas com esse tipo de habilidade, que envolve empatia, trabalho em equipe, gestão do tempo e, mais importante, relacionamento interpessoal. São atributos que não se aprende necessariamente em sala de aula, mas as instituições de ensino podem, sim, ajudar

Márcio Junio de Oliveira Santos, 23 anos, é técnico em automação e trabalha no Laboratório Sabin. Ele conta que o aprendizado emocional foi muito grande durante o curso no Senai e durante a Olimpíada do Conhecimento da instituição. ;Quando terminei, em 2014, as empresas se interessaram por meu currículo pelo fato de eu ter tido prática;, conta. ;Concorri à vaga no Sabin com pessoas bem mais experientes, mas, no Senai, aprendi a ter desenvoltura para passar nesses processos seletivos, o que me ajudou muito;, diz. Ele relembra que isso foi trabalhado com os alunos por meio de minicursos, treinamentos de controle emocional e nas próprias competições. ;Nós precisamos buscar manter o ambiente de trabalho o mais agradável possível, as pessoas são difíceis de lidar, então você tem que saber como falar, trocar ideias, trabalhar em equipe;, explica. Hoje ele estuda comércio internacional na UCB. ;Acho que mais para a frente o curso superior, aliado a essas habilidades comportamentais, pode me ajudar a conseguir um cargo mais estratégico.;

Técnica em eletrotécnica desde junho de 2017, Monaliza Rodrigues, 19 anos, conseguiu um emprego na fabricante de elevadores Atlas Schindler assim que terminou o curso. ;Um professor me indicou. Eu sempre fui muito tímida, mas, no decorrer do curso, com orientação dos professores, aprendi a me comportar num ambiente profissional, trabalhar em grupo, respeitar as diferenças, ser líder;, lembra. Para ela, essas competências são essenciais no ambiente de trabalho. ;Ter todo o conhecimento é importante, porém o estado emocional faz toda a diferença. Saber ouvir novas ideias e aplicá-las da melhor forma possível vale muito;, conta. Monaliza concilia o emprego com o curso superior em engenheira mecânica no Centro Universitário do Distrito Federal (UDF).

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Leia!

Uma questão de caráter ; por que a curiosidade e a determinação podem ser mais importantes que a inteligência para uma educação de sucesso
Autor: Paul Tough
Editora: Intrínseca
272 páginas
R$ 21,70


Com base em dados científicos, Tough defende que é possível proporcionar uma educação de qualidade tanto para estudantes privilegiados quanto para jovens que vivem em situação de pobreza e dependem de políticas públicas ineficientes, estimulando o desenvolvimento de competências comportamentais

*Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa

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