Trabalho e Formacao

Dono de startup de intercâmbio diz que nunca quis aplicar golpe

Empresário se defende, revela que recebeu 9 mil inscrições e que pretende devolver o dinheiro da taxa de inscrição de todos os candidatos. Em reportagem publicada pelo Eu, Estudante na quarta-feira (16), estudantes e ex-funcionários se mostraram indignados com a possibilidade de terem caído em uma fraude. Nenhuma lista de aprovados foi divulgada

Thays Martins
postado em 17/01/2019 19:13
Nesta quinta-feira (17), Elizeu Roberto Cândido, 30 anos, dono da startup paulista O Bolsista, procurou a equipe do Eu, Estudante para se pronunciar sobre o polêmico caso do edital, promovido pela empresa dele, que oferecia 500 bolsas de intercâmbio para jovens de baixa renda. Na quarta (16), reportagem publicada no site reuniu denúncias de candidatos e ex-funcionários que se sentem enganados pelo empresário. Elizeu se diz inocente e alega ser vítima de uma conspiração, que teria culminado na retirada do site da startup do ar. Ele afirma ainda que tem sido difamado. De acordo com o empresário, a startup tem condições de promover o intercâmbio prometido aos inscritos, mas não divulgou uma lista de aprovados por questões jurídicas. Em conversa com advogado, Elizeu decidiu não promover nenhum intercâmbio e devolver o dinheiro de todos os inscritos. Elizeu prometeu fazer um pronunicamento esclarecendo a questão. Depois disso, o empresário garante devolver o dinheiro em até 30 dias.

Empresário mudou de ideia e não vai enviar ninguém ao exterior

Inicialmente, uma das alternativas cogitadas seria a de devolver a verba arrecadada com as inscrições apenas para parte dos candidatos. ;O dinheiro está aqui. Agora não sabemos se vamos devolver ou se vamos fazer a viagem. Estamos discutindo;, informou por volta das 14h desta quinta-feira (17). O número de pessoas que se candidataram a uma bolsa ultrapassa os 2,5 mil estimados por uma ex-funcionária. Elizeu revelou que foram 9 mil. Para participar, era preciso ter renda familiar de no máximo três salários mínimos. Quem é inscrito no Cadastro Único de programas sociais do governo federal deveria pagar taxa de R$ 45 para concorrer. Os demais deviam desembolsar R$ 90. Com os registros, Elizeu deve ter juntado pelo menos R$ 405 mil (soma das inscrições caso todos os estudantes tenham pagado R$ 45), mas é provável que o valor total seja bem maior, já que nem todos depositaram o menor valor.
Elizeu abriu a empresa em 2018. A intenção era levar 500 jovens para o exteriorComo revelado por reportagem publicada pelo Eu, Estudante na quarta-feira (17), nem todos os testes do processo seletivo foram corrigidos porque Elizeu não pagou a professora contratada para revisar as redações e não terminou de pagar a empresa responsável pela promoção do certame. Questionado sobre isso, o proprietário de O Bolsista havia dito, a princípio, que tinha a intenção de divulgar um resultado parcial, considerando somente as provas dos 300 candidatos cujas redações foram corrigidas. ;O pensamento era de devolver o dinheiro de todos que não passaram. A ideia era reformular O Bolsista. Entre os 300, quem colocou Chile e Argentina (como destino escolhido) iria viajar e, entre os que escolheram o Canadá, nem todos.; Por volta das 19h50 desta quinta-feira (17), Elizeu ligou novamente para a redação do Eu, Estudante e revelou que mudou de ideia, decidindo, por fim, pela opção de reembolsar todos os 9 mil inscritos. ;Se for para processar, tudo bem, mas os valores seriam estornados;, garante.

Ciclo de problemas

Elizeu estuda relações públicas numa faculdade particular em São Paulo e relatou que, antes da data marcada para a divulgação dos resultados do processo seletivo, terça-feira (15), candidatos e outras pessoas começaram a especular sobre o passado dele (como o fato de ter morado na rua e de ter respondido a um processo judicial). Elizeu acredita que aspectos da vida dele têm sido usados contra ele, de modo a questionar a credibilidade do projeto. ;Eu cresci num orfanato, morei na rua. O público entende que eu sou um bandido. O fato de eu ter sido uma pessoa que teve problemas judiciais e depressão não quer dizer que eu seja bandido;, defende-se.
[SAIBAMAIS]Elizeu acredita que fatos do passado dele teriam motivado um candidato a hackear o site da empresa O Bolsista e tirá-lo do ar na terça-feira (15), supostamente impedindo que os resultados do edital de bolsas de intercâmbio fossem divulgados. Como mostrado na reportagem do Eu, Estudante de quarta-feira (16), segundo a pessoa que supostamente teria entrado no sistema do site na versão de Elizeu, a grande quantidade de acessos é que teria derrubado o portal. ;O nosso site podia ter até 800 mil pessoas ao mesmo tempo, então não é porque tinha muita gente como ele falou", retruca Elizeu. ;Eu estou sendo condenado sem nunca ter feito nada;, reclama. ;O site só voltou ontem à noite;, conta. De acordo com Elizeu, os resultados não puderam ser liberados por outro meio porque, quando o site saiu do ar, ele também não conseguiu mais acessar o próprio e-mail, ligado ao sistema do site, para poder pegar a lista de selecionados.

Sobre a live transmitida no Instagram, na terça-feira, quando apareceu citando nomes de alguns aprovados, Elizeu disse que coletou dados de outro documento. ;Eu tinha um Excel que tinha pessoas que passaram e não passaram. Não era o correto passar esse documento, lá tem algumas informações antes de dizer o nome das pessoas;, declara. ;Foi muito fácil nos condenar enquanto ainda estávamos no prazo;, comenta. ;A matéria de vocês está fazendo com que pessoas me liguem e me chamem de bandido;, critica ele, que disse ter passado a noite no hospital.


Motivação

A inspiração para lançar um edital de bolsas de estudo para jovens de baixa renda nasceu, conforme conta Elizeu, da própria experiência. ;Cresci em orfanato, fiz um monte de coisa, trabalhei, tive depressão, consegui uma bolsa de estudos para estudar na Anhembi Morumbi. Lá, eu percebi que quem tinha dinheiro saía para estudar fora;, observa. ;Foi aí que tive a ideia (de fazer o projeto). Eu fui para o Chile de ônibus e ia morar na rua, fiquei na casa de uma pessoa por três meses e, quando voltei, consegui um emprego na Ambev, foi incrível. Queria que as pessoas tivessem essa experiência;, explica.

Salários atrasados

Elizeu admitiu que os ex-funcionários da startup O Bolsista recebiam pagamentos com atraso. Isso, de acordo com ele, porque a empresa tem um investidor, que repassava os valores fora da data combinada. Os problemas se intensificaram, segundo ele, quando uma das funcionárias resolveu sair da empresa e teria feito ;um escândalo;, ao reclamar da falta de salário. Na ocasião, outra colaboradora apoiou a primeira e também parou de trabalhar no local. Isso teria levado o investidor a desistir do projeto. ;Meu erro foi ter contratado essas duas funcionárias que agiram sem profissionalismo. Eu confiei nelas. Eu fiz a pior coisa que poderia ter feito na minha vida;, alega. ;Meu advogado me ligou e disse que estava pensando em processar (a funcionária que fez ;um escândalo;) porque ela sabia que ia receber esse dinheiro depois. Eu estou mal para caramba, nem consigo falar sobre isso. E é alguém que eu confiava de verdade. Ela faz um trabalho muito legal de tirar pessoas da rua;, completa.
;Se eu tivesse contratado outros profissionais, talvez tivesse acontecido a mesma coisa, mas não seria complicado como está sendo agora. Eu não posso processar alguém de que eu gosto, e eu gosto muito das duas;, afirma. O empresário negou ter mudado de número ou dificultado que ex-empregados entrem em contato com ele. ;Em nenhum momento, bloqueei nenhuma das pessoas. Uma delas conversou comigo ontem. E eu vou pagar todo mundo no dia 23. Ela ficou nervosa, acho que ela tem toda a razão, mas eu nunca deixei de tentar falar com ela;, rebate. Elizeu confessa entender o lado dos ex-colaboradores. ;Não estou falando mal deles, eles são bons. Não é um erro reclamar. Não recebeu tem que reclamar. Eu tenho que pagá-los. Mas nunca pensei em mexer no dinheiro que vinha das inscrições para isso.;

*Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa

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