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Estudo da OEI analisa avanços das mulheres na ciência na Ibero-América

Apesar de haver grande desigualdade com relação às áreas de pesquisa (elas ainda são minoria nas exatas), as pesquisadoras têm publicado cada vez mais artigos. No entanto, ainda é preciso lutar para ocupar espaços, como defende a cientista indígena Aline Pachamama

Neyrilene Costa*
postado em 13/03/2019 18:57
O estudo As desigualdades de gênero na produção científica ibero-americana, da Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI), revela avanços das cientistas na região formada por América Latina, Portugal e Espanha.

No Brasil, as mulheres estão à frente dos homens em dois aspectos: a produção e a publicação de artigos. O Brasil é o país com maior participação de mulheres em assinatura de artigos. Por aqui, 72% dos textos publicados incluem pelo menos uma autora. Em 2017, as cientistas brasileiras foram responsáveis por 53% dos estudos publicados no Brasil; e os homens, por 47%.

Em Argentina, Guatemala e Portugal, a participação feminina em artigos publicados é de 67%, de 66% e de 64%, respectivamente. Em El Salvador, Nicarágua e Chile, elas participam em menos de 48% das publicações.
Apesar de haver grande desigualdade com relação às áreas de pesquisa (elas ainda são minoria nas exatas), as pesquisadoras têm publicado cada vez mais artigos. No entanto, ainda é preciso lutar para ocupar espaços, como defende a cientista indígena Aline Pachamama
Nos países da Ibero-América, o total de mulheres que estudam licenciatura ainda é superior ao montante das que cursam doutorado. No Brasil e na Argentina, a diferença não é tão alta, com apenas 5% a mais de mulheres nas licenciaturas em comparação com os cursos de doutorado.

Na maior parte dos outros países ibero-americanos, as mulheres são mais da metade das alunas nas licenciaturas. No Brasil, nas licenciaturas, 57% dos estudantes são do gênero feminino; enquanto nas salas de aula dos doutorados, o índice feminino é de 53%.
Apesar de haver grande desigualdade com relação às áreas de pesquisa (elas ainda são minoria nas exatas), as pesquisadoras têm publicado cada vez mais artigos. No entanto, ainda é preciso lutar para ocupar espaços, como defende a cientista indígena Aline Pachamama
Diferenças marcantes aparecem nos nichos de atuação de cientistas homens e mulheres. Em física, química e engenharia, há predominância de cientistas homens, enquanto nas ciências sociais as mulheres se destacam.

"Devemos conquistar nosso espaço"


Apesar de haver grande desigualdade com relação às áreas de pesquisa (elas ainda são minoria nas exatas), as pesquisadoras têm publicado cada vez mais artigos. No entanto, ainda é preciso lutar para ocupar espaços, como defende a cientista indígena Aline Pachamama
Aline Pachamama, moradora do Rio de Janeiro, é historiadora, escritora e pesquisadora. Ela é indígena por parte de mãe e desenvolveu o desejo de contar a história do povo dela: a etnia Puri, do sul de Minas Gerais. "Eu desejava falar da história da minha família, da minha mãe. Quando fiz o magistério, ela ficou muito feliz, achando que era o grau máximo de estudo. Porém eu quis mais, quis contar a história dos povos originários e pesquisar", diz ela, que é idealizadora da Pachamama Editora, formada por mulheres indígenas.

Aline é graduada em história pelo Centro Universitário Moacyr Sreder Bastos (UniMSB), com pós-doutorado em história do Brasil, mestrado em história social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), e doutorado em história cultural pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Ela sempre procurou desenvolver trabalhos voltados a povos originários e mulheres, que é a linha de pesquisa dela. "Eu vejo a importância de contar essas histórias, pois o protagonismo feminino já é muito difícil e, se você pensar ainda no indígena, é mais complicado. Não se vê essas mulheres nas universidades", conta.
[SAIBAMAIS]

Durante a graduação, a pesquisadora enfrentou obstáculos. ;Meu pai faleceu logo quando eu estava na faculdade, eu tinha passado numa federal, mas não pude ir, então optei pela particular;, diz. Para pagar a faculdade, Aline dava aulas. ;Fui professora de alfabetização da educação básica e de adultos. Lecionava o dia todo e estudava à noite. Foi um período difícil;, relembra. Das quatro formações, ela conseguiu bolsa apenas para o mestrado.

A cientista não tem filhos e percebe que a grande dificuldade das pesquisadoras é a busca de espaço. "É muito difícil a mulher estar em um lugar de fala. A discriminação é sempre presente. São comuns perguntas como ;você é mulher e vai falar sobre política?;, ;É indígena e vai falar de música?;. São questionamentos desnecessários. Muitas vezes, a violência simbólica machuca mais do que a física", comenta. "Devemos conquistar nosso espaço e lutar pelo que queremos. Estamos na luta por uma igualdade que ainda não temos por completo e devemos seguir em frente", defende.

*Estagiária sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa

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