Jornal Correio Braziliense

Trabalho e Formacao

Cada vez mais empresas usam recuperação judicial para não quebrar

Em um cenário financeiro no qual muitos empresários afundam, pode ser uma boa alternativa para "arrumar a casa" e manter o número de vagas para empregados

A crise econômica no Brasil atinge de forma surpreendente as micro e pequenas empresas. De acordo com a Serasa Experian, consultoria de análise de informações para decisões de crédito e apoio a negócios, em 2018, 1.408 empresários entraram com pedido de recuperação judicial no Brasil, 17% a mais do que em 2017. Os pequenos negócios lideram, com 871 requerimentos; as médias empresas totalizaram 327 pedidos; seguidas pelas grandes companhias, com 210 solicitações. Segundo Leonardo Conte, advogado especialista na área e responsável pelo Departamento de Recuperação Judicial do escritório Conte Azevedo & Souza, essa é uma alternativa muito importante para o empresariado.
;Quando o pedido é aceito, as dívidas são suspensas num período de 180 dias, nos quais a empresa deve apresentar um plano para se reestruturar;, explica. Apesar dessa possibilidade de recuperação, o índice de negócios que declaram falência ainda é maior que o dos que se salvam. Em 2018, 1.459 pedidos de falência foram efetuados em todo o país, representando um declínio de 14,6% em relação a 2017, quando o total foi de 1.708. Conforme a Serasa, o dado de 2018 é o menor desde que a Nova Lei de Falências (n; 11.101/2005) entrou em vigor. Adelmo Nunes, advogado especialista em recuperação judicial e contador, afirma que, no Brasil, falta maturidade do mercado para lidar com essa ferramenta.

;O principal problema é o afastamento dos envolvidos no processo dos fundamentos que inspiraram a lei. A norma é geral e busca o benefício de toda a sociedade. Muitos processos não prosperaram devido à visão de credores ou de administradores, que somente visualizaram seu interesse de curto prazo;, esclarece. Ainda segundo Adelmo, a deterioração da economia, em consequência do ambiente de negócios, tem levado as empresas a se submeterem à recuperação judicial. ;Se o processo for apenas uma manobra para ganhar tempo ou apenas a tentativa de obter vantagens na redução da dívida; então, a chance de não dar certo é muito grande;, afirma.


Direitos trabalhistas

Caso o gestor decida ir em frente com o requerimento na Justiça, todos os funcionários da instituição serão afetados porque ou eles serão demitidos ou ficarão sem receber benefícios por um tempo. Nesse momento, é importante saber como proceder. A lei prevê que o plano de recuperação judicial não exceda o prazo de um ano para pagar as dívidas trabalhistas. Em caso de falência, a empresa precisa quitar os valores de até cinco salários mínimos assim que houver crédito para isso.
Caso nunca haja crédito, cabe à Justiça mediar os acordos entre devedor e credores. Sergio Emerenciano, advogado especialista em recuperação judicial e falência, acredita que os trabalhadores podem ajudar a empresa a melhorar se acreditarem no potencial dela, em vez de simplesmente se desligarem. ;Quando o negócio entra com esse recurso, os funcionários são fundamentais para que o processo seja bem-sucedido, pois é preciso ter gente trabalhando para a empresa não quebrar;, afirma.

;Se houver uma saída em massa dos empregados, provavelmente a corporação não conseguirá se reerguer; sem eles, a companhia não funciona;, continua. Segundo Sergio, nem sempre as empresas valorizam os trabalhadores. Além de não serem avisados sobre os cortes que serão feitos, alguns demoram anos para receberem os valores que a instituição lhes deve.

Aprendizado

Aparecida Oliveira, 55 anos, foi dona de uma escola de idiomas e passou por uma crise em 2008, mas preferiu não entrar com pedido de recuperação judicial. ;Para pequenos empreendedores, não vale entrar nesse processo, pois dá muito trabalho. É muita burocracia; então, eu preferi ir pelo caminho extrajudicial;, conta. Ela fechou o negócio e conseguiu fazer acordo com os empregados a fim de pagar as dívidas trabalhistas em determinado prazo. Apesar dessa escolha, Aparecida avalia que a lei é muito benéfica, especialmente para grandes empresários.

;O meu caso foi em outra época. A legislação era recente, nem todo mundo sabia como usar;, completa. Ela acredita que planejamento é essencial para o sucesso de um novo negócio após uma falência. ;O que ficou de aprendizado é algo que a maioria dos empresários não faz: ter um caixa reserva para momentos de crise, pois a nossa economia é muito flutuante;, diz. Sobre os colaboradores atingidos, ela afirma que é importante que eles consultem advogados. ;Os credores têm que acompanhar o processo para que não se sintam lesados;, esclarece ela, que, atualmente, é funcionária de uma corretora de seguros.

Entenda o termo
É a reorganização econômica e administrativa de uma empresa, a partir dos dois anos de criação, que deseja evitar a falência. O processo é mediado pela Justiça.

Quebrei
É um recurso que pode entrar em vigor quando a empresa tem uma dívida de pelo menos 40 salários mínimos. O próprio dono da empresa pode fazer o requerimento ou até um credor que queira receber o que a instituição lhe deve.

O que diz a lei?
A Lei n; 11.101/2005 permite que uma empresa endividada e incapaz de gerar lucro suficiente para se sustentar sozinha e exercer seus deveres (como pagar impostos, funcionários e fornecedores) possa recorrer a uma suspensão das dívidas. Dessa forma, ela ganha a chance de se recuperar financeiramente a fim de continuar no mercado. Assim que o pedido é aprovado pela Justiça, o dono da organização explica os motivos que a levaram a recorrer a essa manobra e apresenta os dados que comprovem a informação.

Depois, elabora um plano de recuperação que deve ser divulgado a todos os credores envolvidos. Caso os afetados não aprovem o plano, o juiz declara a falência da empresa. Se for aprovado, a empresa entra em recuperação judicial e deve seguir as etapas previstas no plano. Durante o processo, as atividades da instituição seguem normalmente, porém, ela deve apresentar, ao juiz e aos credores, todos os meses um balanço sobre os avanços obtidos. Caso não siga o acordado, será decretada a falência.

Fontes: Adelmo Nunes e Sergio Emerenciano


O que diz a lei?


A Lei n; 11.101/2005 garante que uma empresa endividada e incapaz de gerar lucro suficiente para se sustentar sozinha e exercer seus deveres (como pagar impostos, funcionários e fornecedores) pode recorrer a uma suspensão das dívidas. Dessa forma, ela ganha a chance de se recuperar financeiramente a fim de continuar no mercado. Assim que o pedido é aprovado pela Justiça, o dono da organização explica os motivos que a levaram a recorrer a essa manobra e apresenta os dados que comprovem a informação.

Depois, elabora um plano de recuperação que deve ser divulgado a todos os credores envolvidos. Caso os afetados não aprovem o plano, o juiz declara a falência da empresa. Se for aprovado, a empresa entra em recuperação judicial e deve seguir as etapas previstas no plano. Durante o processo, as atividades da instituição seguem normalmente, porém, ela deve apresentar todos os meses um balanço sobre os avanços obtidos ao juiz e aos credores. Caso não siga o acordado, será decretada falência.

Memória

Gigantes do mundo dos negócios que passaram por recuperação judicial no Brasil


Oi

Em junho de 2016, a Oi passou a protagonizar um dos maiores pedidos de recuperação judicial do país. Dívidas de R$ 64 bilhões precisam ser negociadas. A empresa é uma das grandes operadoras de telefonia móvel do país, com cerca de 70 milhões de clientes. O processo ainda não acabou. Em 2019, a companhia continua tentando solucionar os problemas e sanar as dívidas.

Saraiva

Desde o início de 2018, a rede de livrarias Saraiva busca negociar dívidas com os fornecedores. Sem sucesso, em 23 de novembro de 2018, a empresa ajuizou um pedido de recuperação judicial. Na época, lojas foram fechadas e mais de 500 funcionários foram demitidos.


Cultura

Em 24 de outubro de 2018, a rede de livrarias Cultura entrou com um pedido de recuperação judicial. Na época, a companhia fechou lojas, reduziu o quadro de funcionários e refez os planejamentos de curto e médio prazos. Ao fechar unidades da Fnac, rede de produtos eletrônicos do mesmo grupo, vários funcionários demitidos protestaram em pontos de venda da marca, alegando que não haviam recebido o pagamento dos direitos trabalhistas.


Avianca

A quarta maior companhia aérea do Brasil entrou com pedido de recuperação judicial em 10 de dezembro de 2018. A empresa sofreu com o confisco de aeronaves, causando transtornos para os clientes. Em nota pública, a empresa informou que entrou com a solicitação de recuperação devido à resistência de arrendadores de suas aeronaves a um acordo amigável.

Sou cliente

E eu com isso?
As consequências de uma empresa passar por recuperação judicial não chegam apenas para credores e funcionários, mas também aos consumidores. É importante frisar que o negócio nesse estágio não é considerado falido. Trata-se de um período em que a companhia procura organizar as finanças para continuar operando. Bruno Boris, professor de direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em direito do consumidor, observa que os clientes podem deixar receber alguns serviços.

;Ao tentar se organizar, a empresa pode cancelar ou reduzir algumas atividades, porém a organização não pode parar de atender o comprador;, ressalta. Como o processo de recuperação judicial é público, ele deve ser divulgado em documentos oficiais da Justiça. O que não quer dizer que o consumidor seja sempre avisado disso pela empresa. Caso a companhia esteja devendo o usuário, cabe aos dois chegar a um acordo. Não sendo possível, o cliente é orientado a levar o caso à Justiça.

Otimismo do empreendedor brasileiro


Levantamento do Empresômetro, empresa de inteligência de mercado, apresenta números relativos à abertura de negócios em 2018. O estado de São Paulo segue em primeiro lugar no ranking, com mais de 77 mil novas empresas; seguido por Minas Gerais e Rio de Janeiro. No Distrito Federal, a modalidade de empreendimento mais lançada foi de promoção em vendas.

Unidade da Federação - Quantidade de novas empresas


São Paulo - 77.257
Minas Gerais - 29.120
Rio de Janeiro - 24.663
Paraná - 18.102
Rio Grande do Sul - 14.520
Bahia - 13.033
Santa Catarina - 12.259
Goiás - 9.564
Pernambuco - 7.200
Ceará - 7.011
Espírito Santo - 5.825
Pará - 4.989
Distrito Federal - 5.061
Mato Grosso - 5.034
Mato Grosso do Sul - 3.482
Paraíba - 3.080
Rio Grande do Norte - 2.872
Maranhão - 2.820
Alagoas - 2.321
Amazonas - 2.229
Piauí - 1.924
Tocantins - 1.736
Sergipe - 1.701
Rondônia - 1.658
Acre - 560
Amapá - 438
Roraima - 347
Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa