Trabalho e Formacao

Cada vez mais empresas usam recuperação judicial para não quebrar

Em um cenário financeiro no qual muitos empresários afundam, pode ser uma boa alternativa para "arrumar a casa" e manter o número de vagas para empregados

Samara Schwingel*
postado em 31/03/2019 15:06
A crise econômica no Brasil atinge de forma surpreendente as micro e pequenas empresas. De acordo com a Serasa Experian, consultoria de análise de informações para decisões de crédito e apoio a negócios, em 2018, 1.408 empresários entraram com pedido de recuperação judicial no Brasil, 17% a mais do que em 2017. Os pequenos negócios lideram, com 871 requerimentos; as médias empresas totalizaram 327 pedidos; seguidas pelas grandes companhias, com 210 solicitações. Segundo Leonardo Conte, advogado especialista na área e responsável pelo Departamento de Recuperação Judicial do escritório Conte Azevedo & Souza, essa é uma alternativa muito importante para o empresariado.
Adelmo Nunes acredita que o Brasil ainda não tem maturidade para lidar com processos do tipo
;Quando o pedido é aceito, as dívidas são suspensas num período de 180 dias, nos quais a empresa deve apresentar um plano para se reestruturar;, explica. Apesar dessa possibilidade de recuperação, o índice de negócios que declaram falência ainda é maior que o dos que se salvam. Em 2018, 1.459 pedidos de falência foram efetuados em todo o país, representando um declínio de 14,6% em relação a 2017, quando o total foi de 1.708. Conforme a Serasa, o dado de 2018 é o menor desde que a Nova Lei de Falências (n; 11.101/2005) entrou em vigor. Adelmo Nunes, advogado especialista em recuperação judicial e contador, afirma que, no Brasil, falta maturidade do mercado para lidar com essa ferramenta.

;O principal problema é o afastamento dos envolvidos no processo dos fundamentos que inspiraram a lei. A norma é geral e busca o benefício de toda a sociedade. Muitos processos não prosperaram devido à visão de credores ou de administradores, que somente visualizaram seu interesse de curto prazo;, esclarece. Ainda segundo Adelmo, a deterioração da economia, em consequência do ambiente de negócios, tem levado as empresas a se submeterem à recuperação judicial. ;Se o processo for apenas uma manobra para ganhar tempo ou apenas a tentativa de obter vantagens na redução da dívida; então, a chance de não dar certo é muito grande;, afirma.


Direitos trabalhistas

Caso o gestor decida ir em frente com o requerimento na Justiça, todos os funcionários da instituição serão afetados porque ou eles serão demitidos ou ficarão sem receber benefícios por um tempo. Nesse momento, é importante saber como proceder. A lei prevê que o plano de recuperação judicial não exceda o prazo de um ano para pagar as dívidas trabalhistas. Em caso de falência, a empresa precisa quitar os valores de até cinco salários mínimos assim que houver crédito para isso.
Aparecida optou por não passar pelo processo de recuperação judicial por causa da burocracia
Caso nunca haja crédito, cabe à Justiça mediar os acordos entre devedor e credores. Sergio Emerenciano, advogado especialista em recuperação judicial e falência, acredita que os trabalhadores podem ajudar a empresa a melhorar se acreditarem no potencial dela, em vez de simplesmente se desligarem. ;Quando o negócio entra com esse recurso, os funcionários são fundamentais para que o processo seja bem-sucedido, pois é preciso ter gente trabalhando para a empresa não quebrar;, afirma.

;Se houver uma saída em massa dos empregados, provavelmente a corporação não conseguirá se reerguer; sem eles, a companhia não funciona;, continua. Segundo Sergio, nem sempre as empresas valorizam os trabalhadores. Além de não serem avisados sobre os cortes que serão feitos, alguns demoram anos para receberem os valores que a instituição lhes deve.

Aprendizado

Aparecida Oliveira, 55 anos, foi dona de uma escola de idiomas e passou por uma crise em 2008, mas preferiu não entrar com pedido de recuperação judicial. ;Para pequenos empreendedores, não vale entrar nesse processo, pois dá muito trabalho. É muita burocracia; então, eu preferi ir pelo caminho extrajudicial;, conta. Ela fechou o negócio e conseguiu fazer acordo com os empregados a fim de pagar as dívidas trabalhistas em determinado prazo. Apesar dessa escolha, Aparecida avalia que a lei é muito benéfica, especialmente para grandes empresários.

;O meu caso foi em outra época. A legislação era recente, nem todo mundo sabia como usar;, completa. Ela acredita que planejamento é essencial para o sucesso de um novo negócio após uma falência. ;O que ficou de aprendizado é algo que a maioria dos empresários não faz: ter um caixa reserva para momentos de crise, pois a nossa economia é muito flutuante;, diz. Sobre os colaboradores atingidos, ela afirma que é importante que eles consultem advogados. ;Os credores têm que acompanhar o processo para que não se sintam lesados;, esclarece ela, que, atualmente, é funcionária de uma corretora de seguros.

Entenda o termo
É a reorganização econômica e administrativa de uma empresa, a partir dos dois anos de criação, que deseja evitar a falência. O processo é mediado pela Justiça.

Quebrei
É um recurso que pode entrar em vigor quando a empresa tem uma dívida de pelo menos 40 salários mínimos. O próprio dono da empresa pode fazer o requerimento ou até um credor que queira receber o que a instituição lhe deve.

O que diz a lei?
A Lei n; 11.101/2005 permite que uma empresa endividada e incapaz de gerar lucro suficiente para se sustentar sozinha e exercer seus deveres (como pagar impostos, funcionários e fornecedores) possa recorrer a uma suspensão das dívidas. Dessa forma, ela ganha a chance de se recuperar financeiramente a fim de continuar no mercado. Assim que o pedido é aprovado pela Justiça, o dono da organização explica os motivos que a levaram a recorrer a essa manobra e apresenta os dados que comprovem a informação.

Depois, elabora um plano de recuperação que deve ser divulgado a todos os credores envolvidos. Caso os afetados não aprovem o plano, o juiz declara a falência da empresa. Se for aprovado, a empresa entra em recuperação judicial e deve seguir as etapas previstas no plano. Durante o processo, as atividades da instituição seguem normalmente, porém, ela deve apresentar, ao juiz e aos credores, todos os meses um balanço sobre os avanços obtidos. Caso não siga o acordado, será decretada a falência.

Fontes: Adelmo Nunes e Sergio Emerenciano


O que diz a lei?


Leonardo Conte afirma que a medida é importante para a sobrevivência de empresários
A Lei n; 11.101/2005 garante que uma empresa endividada e incapaz de gerar lucro suficiente para se sustentar sozinha e exercer seus deveres (como pagar impostos, funcionários e fornecedores) pode recorrer a uma suspensão das dívidas. Dessa forma, ela ganha a chance de se recuperar financeiramente a fim de continuar no mercado. Assim que o pedido é aprovado pela Justiça, o dono da organização explica os motivos que a levaram a recorrer a essa manobra e apresenta os dados que comprovem a informação.

Sergio Emerenciano, advogado especialista em recuperação judicial e falência
Depois, elabora um plano de recuperação que deve ser divulgado a todos os credores envolvidos. Caso os afetados não aprovem o plano, o juiz declara a falência da empresa. Se for aprovado, a empresa entra em recuperação judicial e deve seguir as etapas previstas no plano. Durante o processo, as atividades da instituição seguem normalmente, porém, ela deve apresentar todos os meses um balanço sobre os avanços obtidos ao juiz e aos credores. Caso não siga o acordado, será decretada falência.

Memória

Gigantes do mundo dos negócios que passaram por recuperação judicial no Brasil


Em um cenário financeiro no qual muitos empresários afundam, pode ser uma boa alternativa para

Oi

Em junho de 2016, a Oi passou a protagonizar um dos maiores pedidos de recuperação judicial do país. Dívidas de R$ 64 bilhões precisam ser negociadas. A empresa é uma das grandes operadoras de telefonia móvel do país, com cerca de 70 milhões de clientes. O processo ainda não acabou. Em 2019, a companhia continua tentando solucionar os problemas e sanar as dívidas.

Em um cenário financeiro no qual muitos empresários afundam, pode ser uma boa alternativa para

Saraiva

Desde o início de 2018, a rede de livrarias Saraiva busca negociar dívidas com os fornecedores. Sem sucesso, em 23 de novembro de 2018, a empresa ajuizou um pedido de recuperação judicial. Na época, lojas foram fechadas e mais de 500 funcionários foram demitidos.


Em um cenário financeiro no qual muitos empresários afundam, pode ser uma boa alternativa para

Cultura

Em 24 de outubro de 2018, a rede de livrarias Cultura entrou com um pedido de recuperação judicial. Na época, a companhia fechou lojas, reduziu o quadro de funcionários e refez os planejamentos de curto e médio prazos. Ao fechar unidades da Fnac, rede de produtos eletrônicos do mesmo grupo, vários funcionários demitidos protestaram em pontos de venda da marca, alegando que não haviam recebido o pagamento dos direitos trabalhistas.


Em um cenário financeiro no qual muitos empresários afundam, pode ser uma boa alternativa para

Avianca

A quarta maior companhia aérea do Brasil entrou com pedido de recuperação judicial em 10 de dezembro de 2018. A empresa sofreu com o confisco de aeronaves, causando transtornos para os clientes. Em nota pública, a empresa informou que entrou com a solicitação de recuperação devido à resistência de arrendadores de suas aeronaves a um acordo amigável.

Sou cliente

E eu com isso?
As consequências de uma empresa passar por recuperação judicial não chegam apenas para credores e funcionários, mas também aos consumidores. É importante frisar que o negócio nesse estágio não é considerado falido. Trata-se de um período em que a companhia procura organizar as finanças para continuar operando. Bruno Boris, professor de direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em direito do consumidor, observa que os clientes podem deixar receber alguns serviços.

;Ao tentar se organizar, a empresa pode cancelar ou reduzir algumas atividades, porém a organização não pode parar de atender o comprador;, ressalta. Como o processo de recuperação judicial é público, ele deve ser divulgado em documentos oficiais da Justiça. O que não quer dizer que o consumidor seja sempre avisado disso pela empresa. Caso a companhia esteja devendo o usuário, cabe aos dois chegar a um acordo. Não sendo possível, o cliente é orientado a levar o caso à Justiça.

Otimismo do empreendedor brasileiro


Levantamento do Empresômetro, empresa de inteligência de mercado, apresenta números relativos à abertura de negócios em 2018. O estado de São Paulo segue em primeiro lugar no ranking, com mais de 77 mil novas empresas; seguido por Minas Gerais e Rio de Janeiro. No Distrito Federal, a modalidade de empreendimento mais lançada foi de promoção em vendas.

Unidade da Federação - Quantidade de novas empresas


São Paulo - 77.257
Minas Gerais - 29.120
Rio de Janeiro - 24.663
Paraná - 18.102
Rio Grande do Sul - 14.520
Bahia - 13.033
Santa Catarina - 12.259
Goiás - 9.564
Pernambuco - 7.200
Ceará - 7.011
Espírito Santo - 5.825
Pará - 4.989
Distrito Federal - 5.061
Mato Grosso - 5.034
Mato Grosso do Sul - 3.482
Paraíba - 3.080
Rio Grande do Norte - 2.872
Maranhão - 2.820
Alagoas - 2.321
Amazonas - 2.229
Piauí - 1.924
Tocantins - 1.736
Sergipe - 1.701
Rondônia - 1.658
Acre - 560
Amapá - 438
Roraima - 347
Estagiária sob a supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação