Trabalho e Formacao

Deslizes perigosos

Com farta oferta de mão de obra à disposição, recrutadores se tornaram mais exigentes. Assim, gafes que antes poderiam ser relevadas acabam se tornando critério de eliminação. Confira quais são para evitá-las

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 26/05/2019 04:10
Candidatos em busca de emprego na Agência do Trabalhador do Setor Comercial Sul

Com cerca de 13,4 milhões de desempregados no país, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a disputa por vagas de trabalho se torna cada vez mais acirrada. ;Há muitos candidatos por vaga, por isso as seleções se tornaram mais rigorosas;, analisa Bianca Machado, gerente do site de empregos Catho. Detalhes que antes poderiam passar despercebidos ou ser aceitos por recrutadores, hoje podem fazer a diferença entre conseguir ou não uma oportunidade. Assim, prestar atenção para evitar erros bobos é primordial para ter sucesso na busca por emprego. Afinal, os empregadores contam com farta oferta de mão de obra à disposição; então, a fim de escolher os melhores, aumentam o crivo das seleções.

E não basta ser capacitado para o cargo para ter sucesso: é preciso demonstrar isso ao empregador. E há gafes que põem tudo por água abaixo. ;O aumento da taxa de desemprego tem tudo a ver com o cenário econômico do país. No entanto, a falta de aptidão para encarar uma seleção com certeza colabora para essa alta;, afirma a gestora de carreiras Madalena Feliciano, CEO da Outliers Careers. Isso porque há pessoas que, mesmo sendo boas trabalhadoras, não costumam demonstrar isso ao concorrer por uma vaga. Confira aqui dicas para evitar que isso aconteça com você ao aprender como escapar de descuidos imperdoáveis.

A primeira peneira: o currículo

O primeiro momento em que o candidato pode cometer um erro capaz de tirá-lo de uma seleção é na elaboração e no envio do currículo. Gerente do site de empregos Catho, Bianca Machado alerta para a importância de levar a preparação do CV a sério. ;O currículo é um roteiro para o recrutador saber o que avaliar, por isso precisa ser bem elaborado e formatado. Na hora de selecionar para as próximas etapas, conta muito;, diz.

Pós-graduada em gestão estratégica de vendas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Bianca afirma que vários elementos frequentemente encontrados nos documentos são julgados como erros pelos avaliadores. ;Vemos muitos com foto (que só deve ser inserida se a vaga pedir), informações e características pessoais;, esclarece.

É o caso de citar atributos como proatividade e organização. ;Essas particularidades são avaliadas na entrevista pessoal;, alerta. Caso queira transmitir suas habilidades comportamentais por meio do documento, o caminho está em relatar resultados alcançados ou experiências que deixem claras suas competências, em vez de dizer que você é isso ou aquilo. Professor de fundamentos de recursos humanos na Universidade Católica de Brasília (UCB), Átila Câmara considera que não é exatamente errado inserir informações pessoais e comportamentos, mas é algo que pode tirar o foco do que importa.

;As atitudes e a aparência são checadas em outras etapas. Durante a avaliação do currículo, o que interessa é: formação acadêmica, cursos extracurriculares e técnicas dominadas;, esclarece. ;Assim, o documento se torna claro e cativante e o candidato tem mais chances de ser selecionado para uma entrevista;, diz. Por isso, o docente ressalta a importância da objetividade. ;Foco e assertividade são as principais características de um bom currículo. Destaque técnicas, experiências e diferenciais, como cursos extracurriculares e habilidades;, indica. Um arquivo dessa maneira é o sonho de consumo dos recrutadores.

No entanto, de acordo com Madalena Feliciano, gestora de carreiras da IPC (Instituto Profissional de Coaching), a maioria dos currículos recebidos deixa a desejar. ;Há muitos erros. Incorreções de português e mentiras sobre formação e experiência são muito recorrentes;, esclarece ela, que avalia cerca de 15 currículos por dia. Ela orienta quem está em busca de emprego a encarar esse documento como a porta de entrada para concorrer a uma vaga. ;É preciso focar e aperfeiçoar essa parte para chegar à entrevista.;

Problema na língua
Os erros de português estão entre os principais fatores de eliminação. A professora da disciplina Tereza Cavalcanti percebe que essa é uma dificuldade muito comum. E não é de se estranhar: afinal, a maior parte dos brasileiros vai mal em avaliações oficiais da disciplina na educação básica. ;Há pessoas que aprendem as regras gramaticais corretas, mas não colocam em prática, criando uma distância entre a língua falada e a escrita;, comenta ela, que ministra aulas no Gran Cursos Online. Segundo a professora, a tecnologia acabou ampliando o problema. ;Com o universo da internet e dos corretores ortográficos, muitas palavras abreviadas e escritas de forma errada são corrigidas, tirando a atenção das pessoas para o erro;, diz.

;Assim, a correção é ;terceirizada; e ninguém aprende com os equívocos;, completa. Formada em letras pela Universidade de Brasília (UnB), Tereza acredita que, apesar de a linguagem informal estar em alta, é necessário que as pessoas atentem à modalidade formal no documento, que funciona como cartão de visita. ;A língua culta traz prestígio social e profissional. Em situações formais de provas orais ou redação de currículo, a norma-padrão é importante;, afirma. ;É como se fosse um dress code. Assim como você se veste de forma diferente para algumas ocasiões, você adéqua o uso do idioma para certos momentos;, completa.

Para melhorar meu CV
Daiane Rodrigues, 23 anos, procura trabalho desde janeiro deste ano. O último cargo que ocupou foi o de operadora de caixa numa rede de supermercados. Antes, foi atendente de telemarketing e recepcionista. Com ensino médio completo, a jovem tem encontrado dificuldade para se recolocar. ;Estou mandando currículo para várias vagas que aparecem ou que amigos me mandam, mas até agora nenhuma empresa me chamou nem para entrevista;, conta. A isca que pode fisgar o interesse dos recrutadores é o currículo. Então, talvez o erro dela esteja no documento. Ela admite que não se empenha muito na construção do currículo.

;Acho que o meu é razoável pela minha experiência e cursos que fiz, mas sei que tem outros melhores;, diz. ;Por exemplo, existem pessoas com mais vivência na área que eu, e acho que isso é o que mais pesa;, afirma. ;Coloco no documento meus trabalhos passados, oficinas e palestras das quais participei e uma foto 3x4. Nos e-mails, eu costumo escrever algumas coisas como ;tenho facilidade em aprender, gosto de trabalhar em grupo, etc.;, descreve. No entanto, ela não insere nada que seja específico da empresa para a qual está se candidatando; ou seja, não personaliza o CV para cada vaga: apenas envia um modelo padrão. Isso dificulta que o perfil dela se destaque em meio a outros. ;Eu mando o mesmo para todas as oportunidades que aparecem. Acho que posso começar a prestar mais atenção nisso;, relata.

Perfil eliminado
A Catho entrevistou 409 recrutadores para saber quais são os motivos que os levam a descartar um currículo.
Confira os principais:

34%
Erros de português

24,6%
Falta de experiência

10,1%
Ausência de bjetivo profissional

9,4%
Candidato mora longe da empresa

9,1%
Apresentação visual

8,9%
Ter mais de uma página

3,9%
Outros

A hora do ;vamos ver;: a entrevista

Para além do currículo, a gestora de carreira Madalena Feliciano percebe que a maior parte dos concorrentes têm dificuldade na hora de encarar um processo seletivo presencialmente. ;O documento mostra informações técnicas, e a entrevista serve para o contratante avaliar o lado pessoal do candidato. Por isso, é preciso tomar cuidado e, assim, mostrar o seu melhor;, aconselha. A falta de preparo para a entrevista está entre um dos principais deslizes, segundo ela. Isso inclui tanto conseguir falar das próprias características, sem afobação ou desespero, mas também sem soberba, quanto conhecer a empresa pretendida.

Formada em administração pelo Instituto Mineiro de Educação Superior (Imes), Madalena acredita que a apresentação pessoal é um componente muito observado pelos contratantes e, infelizmente, muitos candidatos erram nesse quesito. ;Começando pela aparência, é importante se adequar à cultura da empresa. Por exemplo, se a vaga é para um trabalho mais informal, não faz sentido ir usando terno. Mas se a oportunidade é em um lugar que exige formalidade, não vale ir de calça jeans e camiseta;, comenta. ;A pontualidade também é algo que os recrutadores valorizam bastante, além da segurança e firmeza do candidato;, completa.

Um erro um pouco mais complicado de evitar tem a ver com o nervosismo: controlar o lado emocional é fundamental para não parecer inseguro, gaguejar, tremer ou suar frio durante a conversa. É possível adotar atitudes que podem ajudá-lo a ficar um pouco mais tranquilo: ensaiar uma apresentação pessoal em frente ao espelho ou de alguém de confiança é um exemplo. ;Durante a conversa, a pessoa tem que ter muita tranquilidade, segurança e demonstrar interesse no trabalho;, observa o graduado em administração pela UnB Átila Câmara.

Segundo ele, é importante também deixar transparecer vontade de aprender. ;Quase sempre, as empresas buscam experiência, mas se a pessoa manifestar, na entrevista, que tem força de vontade e disposição para desenvolver habilidades dentro da organização, ela pode ter uma chance;, esclarece. É recomendado aproveitar esse momento para mostrar as habilidades técnicas e comportamentais que têm. Segundo Átila, os contratantes apostam em pessoas que combinem atributos. ;A relação de habilidades, conhecimentos e atitudes chama bastante a atenção dos recrutadores;, declara.

Assim como no currículo, erros de português também podem eliminar candidatos em uma entrevista ou dinâmica de grupo. A professora Tereza Cavalcanti enxerga que o domínio da forma culta do português é um diferencial para quem busca emprego. ;A boa oralidade com uso correto da língua e a boa escrita revelam concentração, atenção e raciocínio por parte do candidato, pois ele tem capacidade de trabalhar, se comunicar e sem cometer erros;, explica. Além disso, ela considera que isso traz credibilidade para o profissional. ;É como um cartão de visita. Imagine encontrar um profissional que não domina a própria língua. Que tipo de impressão ele passa?;, questiona.

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