Quem diria que, em meio ao cerrado do Distrito Federal, são cultivados pés de café dos mais valiosos, cujos grãos são reconhecidos no Brasil e lá fora? Nem mesmo o produtor das plantas, Carlos Alberto Leite Coutinho, 73 anos, poderia esperar por isso. ;Com toda a franqueza, não fazia parte dos meus planos;, afirma. O economista começou o cultivo em propriedade no Lago Oeste, em 2003, após se aposentar. ;Sou de uma geração que se aposentou muito cedo. Eu tinha muita preocupação de ficar sem o que fazer, pois via meus colegas que se aposentavam e tinham problemas de toda natureza;, afirma. ;Então, comecei a plantar café como terapia ocupacional;, explica. Agora, ele se prepara para viajar com a família a Nova York em outubro, onde descobrirá se será o primeiro, o segundo ou o terceiro colocado do 28; Prêmio Ernesto Illy, nacional, além de representar o país no 4; Prêmio Ernesto Illy Internacional.
Ele é o primeiro representante do Centro-Oeste a figurar entre os três primeiros da seleção nacional. ;Costumam dizer que, no Brasil, esse é um prêmio de paulistas e mineiros. Na edição do ano passado, teve 37 mineiros, dois paulistas e eu do DF entre os finalistas;, observa. ;Eu não podia imaginar esse potencial.; O motivo da conquista? Até ele não sabe direito. No entanto, seu Coutinho atribui o sucesso às características do DF, à gestão e à equipe de confiança: um total de cinco trabalhadores rurais que está com ele há mais de 20 anos, fora as mulheres, responsáveis pela cozinha. ;Eu pesquiso, leio muito, mas não adianta a teoria sem prática, que é feita pelos empregados;, aponta. ;Se o café colhido não é mexido, passa um ou dois dias sem mexer, perde a qualidade. E eu não vou ficar fiscalizando se eles (os funcionários) fizeram isso, não tenho nem tempo. Mas aqui eles abraçam a causa e fazem direito. É uma relação de confiança;, descreve.
Ele também reconhece a importância de contar com um bom agrônomo. ;Além disso, estamos numa das melhores regiões para a produção. Todos os cafés top do mundo são produzidos acima de 1 mil metros de altitude. Nós estamos acima de 1 mil metros;, diz. ;Temos uma grande vantagem com relação a localidades famosas, como a Colômbia e o sul de Minas: lá chove o ano inteiro. Aqui, chegou maio, não chove mais;, percebe. ;E o café, quando está pronto para ser colhido, se pega chuva, fermenta, e a qualidade desaparece.; Por tudo isso, seu Coutinho acredita que o potencial dos produtores do Centro-Oeste precisa ser mais valorizado e difundido. Hoje, os números são expressivos. No Lago Oeste, ele, que mora na Asa Norte, tem uma propriedade de 300 hectares, dos quais 60 são cultiváveis. Em Brazlândia, são mais 40 hectares. No total, entre as duas propriedades, há 300 mil pés. As vendas chegam a render R$ 600 mil por ano.
Carreira
Funcionário do Banco do Brasil desde 1964, ele veio para Brasília em 1983 para continuar trabalhando na instituição. Aqui, acabou passando por outros órgãos. Foi um dos fundadores da Secretaria do Tesouro, em 1986, e, quando se aposentou, estava no Ministério da Fazenda. Depois de se aposentar, atuou ainda na Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e na União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica). Ele e a esposa, Laíse Coutinho, 72, comemoraram bodas de ouro recentemente. Os dois foram colegas de escola no ensino médio e têm ainda outras características em comum: ela também é economista e servidora aposentada do Banco do Brasil. Juntos, têm três filhos, servidores públicos, e sete netos. Natural da cidade de Patos, na Paraíba, e o sétimo filho de um produtor rural e comerciante de gado, seu Coutinho tinha afinidade com o campo e adquiriu uma propriedade no Lago Oeste em 1988.
Durante seis anos, experimentou trabalhar com gado leiteiro. No entanto, o negócio só trouxe prejuízos. ;Foi um desastre. E gerava até briga em casa: minha mulher dizia que todo dinheiro que eu ganhava eu gastava com as vacas;, reflete. No fim, ele acabou vendendo o rebanho para abate. Foi então que seu Coutinho começou a pensar em outra atividade e, por sugestão de um empregado, resolveu investir no café. Como não entendia do assunto, procurou um amigo da área para pedir indicação de onde adquirir os pés. ;Eu queria plantar umas 300 mudas, e ele pediu o endereço da fazenda;, relata. O paraibano foi surpreendido, então, com um caminhão contendo cerca de 3 mil mudas de café arábica de alta qualidade.
;Foi assim que eu me tornei produtor de café;, conta. Com o passar dos anos, aumentou tanto a quantidade quanto o nível da produção. Seu Coutinho começou a fornecer sacas para a empresa italiana Illy em 2010. ;Disseram que o meu café era um dos melhores que eles já tinham provado;, recorda. Em 2013 e em 2014, ele ganhou os prêmios de melhor café do Centro-Oeste do Prêmio Regional Illy de Qualidade Sustentável do Café Expresso.
No ano passado, veio uma conquista maior: tornou-se o primeiro produtor de café do Centro-Oeste a ser um dos 40 finalistas do 28; Prêmio Ernesto Illy, uma premiação nacional. O trabalho dele também foi reconhecido pela Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA). Com isso, muitos apreciadores e distribuidores de café procuram seu Coutinho para conseguir o pó. No entanto, diferentemente de algumas outras unidades da Federação, no DF, o produtor rural é impossibilitado de torrar e moer o produto para vender. A fim de suprir essa demanda, a esposa e os filhos dele estão montando uma empresa de distribuição, que se chamará Café Minelis. Por enquanto, estão na fase de formalização e não há previsão de lançamento.