Trabalho e Formacao

Acessibilidade na prática

No mês em que se comemora o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, pesquisas mostram que esse grupo ainda enfrenta dificuldades para se inserir no mercado de trabalho. Falta inclusão tanto na parte de estrutura física quanto na integração com a equipe e chances de ascensão profissional

postado em 15/12/2019 04:07
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O servidor público Ricardo Rubenich, 24 anos, ficou cego aos 8 anos, depois de um câncer. Quando concluiu o ensino médio, ele decidiu prestar concurso público para se inserir no mercado de trabalho. ;Eu sabia que esse seria o melhor caminho, porque, na esfera particular, normalmente as empresas não querem contratar pessoas com deficiência;, relata. Na época, ele morava em Santa Maria (RS) e começou a trabalhar como servidor em um banco. No entanto, Ricardo conta que, mesmo depois de conseguir a vaga, enfrentou dificuldades.

;Quando chegou o momento de me nomearem, eu tive de esperar oito meses para o banco comprar um leitor de telas que pudesse ser usado nos programas internos;, lembra o servidor, que é formado em direito pelo Centro Universitário UniCEUB. ;Eu também percebia que havia resistência em me passar trabalho, não confiavam muito que eu pudesse desempenhar funções lá dentro;, conta. Em 2014, ele passou em outro concurso e se mudou para Brasília. No novo emprego, no Tribunal Superior do Trabalho (TST), encontrou um ambiente mais acessível. ;Aqui eu consigo utilizar os programas tranquilamente. O acolhimento também foi muito bom, meus colegas sempre me ajudam quando preciso;, elogia. ;Agora eu tenho um cão-guia, que também é superbem acolhido.;

As dificuldades enfrentadas por Ricardo ao longo da trajetória profissional estão entre as que pessoas com deficiência encaram no Brasil. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem aproximadamente 12 milhões de pessoas com deficiência no país, mas somente 3,5% trabalham no mercado formal. Além disso, segundo pesquisa da Catho, em parceria com a i.Social (consultoria especializada na inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho), a Associação Brasileira de Recursos Humanos Brasil e de São Paulo (ABRH Brasil e ABRH São Paulo), esses profissionais, muitas vezes, desistem ou trocam de emprego devido à falta de um plano de carreira.

Preconceito inda é uma carreira
Os obstáculos que dificultam a inserção de pessoas com deficiência no mundo do trabalho começam bem antes da contratação. Na avaliação de Anna Cherubina, consultora de empresas e professora de gestão de pessoas dos MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV), a discriminação ainda é uma barreira. ;Qualquer tipo de inclusão na nossa sociedade tem resquícios muito vivos de preconceito que precisam ser trabalhados;, diz. ;Muitas vezes, pessoas com deficiência têm sua capacidade menosprezada;, completa.


Para se ter uma ideia, uma pesquisa da consultoria Santo Caos com a Catho mostra que 40% dos profissionais de recursos humanos dizem ouvir com frequência de chefes de outras áreas que eles não estão abertos à contratação de pessoas com deficiência. Líder de Projetos de Inclusão na consultoria Social IN, Mara Lígia Kiefer explica que o senso comum em relação às pessoas com deficiência ainda é muito forte e dificulta a inclusão. ;É comum acreditar que elas não se escolarizaram, que não são qualificadas nem produtivas;, diz. ;Nós precisamos consolidar, por meio da informação, a percepção de que os profissionais com deficiência têm qualificação e, na maioria das vezes, desenvolveram autonomia em apoio à própria deficiência ou limitação funcional.;

Faltam erspectivas e crescimento
Depois de conquistarem oportunidades de emprego, os profissionais com deficiência costumam enfrentar outras barreiras no local de trabalho. Uma delas diz respeito à falta de perspectiva de crescimento profissional, como explica Mara Lígia Kiefer. ;Se uma pessoa é contratada para cumprir cota por causa da deficiência, em geral, ela acha que vai ficar naquele posto de trabalho para o resto da vida;, afirma. ;Isso acaba gerando a condição de não retenção desses trabalhadores. Muitas vezes, eles deixam uma empresa porque acreditam que podem buscar melhores oportunidades de desenvolvimento profissional em outra organização, mesmo que a diferença salarial seja pequena.;


De acordo com o levantamento da Catho em parceria com a i.Social, a ABRH Brasil e a ABRH-SP, os três fatores apontados por profissionais com deficiência como os principais na hora de pensar em desistir de um trabalho são a ;falta de perspectiva de carreira;, seguida por ;sentir-se apenas parte da cota; e ;receber propostas de trabalho com melhores funções;. Vale ressaltar que, normalmente, as vagas ofertadas são em cargos mais baixos, o que também gera desmotivação.


;Justamente por causa do senso comum de que a pessoa com deficiência não tem escolaridade nem qualificação profissional, abre-se a mesma vaga ofertada para uma pessoa que está começando agora a vida profissional;, explica Kiefer. A pesquisa da Santo Caos em parceria com a Catho revela que menos de 10% dos profissionais com deficiência ocupam cargos de liderança. Dentre as funções que esses trabalhadores costumam ocupar, destacam-se: assistente (56,8%), analista (16,7%), técnico (11,9%), coordenador (5%), gerente (4%), aprendiz (3%), estagiário (2%), diretor (0,4%) e vice-presidente e/ou presidente (0,2%).

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