Formado em história e mestre em ciência política pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Bruno Santos de Araújo Fernandes, 37, é um dos professores da SEE-DF que se sentem desmotivados com a carreira. Ele reclama de receber um salário baixo, apesar de ter especialização. “Eu sou muito mal pago. Fiz mestrado e ganho R$ 300 a mais por isso”, lamenta. O valor corresponde à diferença de remuneração entre um educador com especialização e um com mestrado. “Se eu continuar recebendo o mesmo salário pelo resto da minha vida, pelo resto dela serei infeliz”, diz.
Segundo o Portal da Transparência, a remuneração bruta de Bruno é R$ 6.590,23. Os educadores da rede pública do DF têm salário-base inicial de R$ 3.858,87 para a carga de 40 horas semanais. Todos recebem auxílio-alimentação de R$ 394,50, auxílio-transporte de R$ 200 e gratificação pedagógica de R$ 1.157,66. Assim, um professor efetivo com carga horária de 40 horas semanais ganha mensalmente, no mínimo, R$ 5.611,03. Os dados são da SEE-DF. O piso nacional dos profissionais da rede pública da educação básica em início de carreira será reajustado em 12,84% para 2020, passando de R$ 2.557,74 para R$ 2.886,24.
De acordo com Bruno, falta valorizar o esforço. Ele observa que a diferença salarial, no fim da carreira, entre um professor que tem mestrado e outro que não tem é de cerca de R$ 700, enquanto, em um tribunal, essa distinção pode chegar a R$ 1.500. “Para quem é mais importante ter um mestrado? Um analista de tribunal ou um professor?”, indaga. “São essas questões que me fazem querer abandonar a profissão.” Ele está deprimido por causa das condições de trabalho e faz acompanhamento psicológico. Inclusive, passou um período afastado da sala de aula devido aos transtornos psíquicos.
“A depressão não é um caso isolado na Secretaria de Educação, ela acontece às pencas”, revela. O mestre reclama, ainda, da falta de recursos. Segundo o professor, é comum que docentes tenham de arcar com os custos de materiais utilizados. “Quando eu dava aulas na Educação de Jovens e Adultos (EJA), por exemplo, eu imprimia o material em casa. Comprei uma impressora boa para isso”, relata. “Muitas vezes, é preciso tirar dinheiro de um salário já ruim para fazer um bom trabalho. Se não, é meu nome que está em jogo, não o da Secretaria de Educação”, acrescenta Bruno, que, atualmente, está afastado para cuidar da mãe, que está com câncer.
Apesar de estar insatisfeito com a remuneração, ele garante que ama dar aulas. “Eu me dou muito bem com meus colegas e alunos”, diz. “É uma pena que, para eu ser realizado financeiramente, tenha de procurar outra carreira. Lamento que o magistério precise virar um bico e não possa ser minha ocupação principal.” O professor conta que está estudando para concurso do Senado. Outra opção, de acordo com ele, é procurar um emprego na rede particular para complementar a renda.
Incentivo da mãe
“O que eu mais gosto no fato de ser professor é trabalhar com crianças. Elas são um público que nos enche de esperança e renova nossas energias”, conta Victor Bernardes, 28. Graduado em educação física pela Universidade Católica de Brasília (UCB), ele trabalha na Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF) desde 2013 e concluiu mestrado na UnB no ano passado. A escolha da carreira foi inspirada pela mãe, professora aposentada que dava aula na educação especial na rede pública.
“Eu cresci dentro de escolas públicas a acompanhando, apesar de nunca ter estudado em uma”, relembra. “Sempre vi as dificuldades inerentes à profissão, mas, ao mesmo tempo, percebia como minha mãe era realizada com o trabalho dela. Isso com certeza me incentivou.” Victor conta que pensou em desistir da carreira depois da eleição do presidente Jair Bolsonaro. “Imaginei que a situação fosse ficar muito difícil, principalmente por causa de alguns anúncios dele que têm os professores como alvo. E, de fato, está complicado”, lamenta.
“Algumas dificuldades que a gente tem enfrentado são o obscurantismo e o moralismo, que influenciam diretamente a prática pedagógica dos professores. Isso acaba nos inibindo de tocar em temas sensíveis e importantes na sala de aula.” No entanto, ele relata que o amor pela profissão o fez continuar. “Aos poucos, a gente vai se encontrando com os colegas e acaba renovando as energias. Desistir não passa mais pela minha cabeça.” Victor cita uma frase de Paulo Freire — patrono da educação brasileira, chamado de “energúmeno” por Bolsonaro — que ele tem como inspiração: “Sou professor a favor da esperança, o que me anima apesar de tudo”.
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