O home office ou trabalho remoto já era tendência antes de o novo coronavírus impactar todos os aspectos da vida em sociedade e forçar uma migração acelerada e urgente de milhões de trabalhadores para esse formato. Afinal, em muitos casos, é o único jeito de manter-se produtivo durante a crise, garantir o funcionamento de empresas de diversos setores e preservar a saúde dos colaboradores. A metamorfose a 1000km/h que o mundo do trabalho enfrenta no momento, no entanto, não será passageira.
“O teletrabalho veio para ficar”, garante Markus Helfen, professor de gestão de pessoas da Universidade Livre de Berlim. PhD em administração pela Universidade Aachen e mestre em economia pela Universidade de Trier, ele tem como principais temas de pesquisa teoria organizacional, gestão de RH, relações industriais, empresas multinacionais de serviços, controle corporativo e instituições financeiras. Helfen é adepto de longa data do teletrabalho, sem nunca ter batido ponto desde que terminou a graduação.
A partir de agora, o serviço remoto se torna realidade para uma gama muito maior de profissionais — o que, apesar de tudo, pode ser um efeito positivo da pandemia. Isso porque o professor defende que esse é modelo de trabalho do futuro. Em entrevista por Skype, uma das plataformas mais tradicionais e simples para videoconferências, ele comenta os efeitos da crise do coronavírus e deixa orientações para empregados e empregadores. Confira a entrevista:
A tendência do home office vai continuar após a crise do coronavírus? Ou será que esse movimento de escritório em casa, que tem sido adotado por muitos trabalhadores, só durará enquanto houver a pandemia? Quais são as suas expectativas a este respeito?
Imagine se a crise do coronavírus tivesse acontecido sob condições diferentes, quando simplesmente não havia uma infraestrutura de internet? Muitos mais trabalhos se tornariam impraticáveis. Hoje, trabalho móvel, a distância ou on-line é possível para certos grupos que, sem isso, ficariam ociosos. Só de permitir que mais gente seja produtiva, isso já é positivo. É preciso dizer que o home office é algo que começou há muito tempo e agora está se expandindo muito mais rapidamente por causa da crise do coronavírus. Não vejo nenhuma razão para que isso se reverta ou para que essa tendência não continue. O que está acontecendo agora é só a aceleração de algo que já estava acontecendo de qualquer maneira. Em termos concretos para os colegas do Brasil, o que posso dizer é: apesar de tudo, o vírus tem um efeito positivo, pois assim vocês poderão se familiarizar com o mundo do trabalho do futuro, que é móvel.
O home office era uma prática comum na Alemanha mesmo antes da pandemia de coronavírus?
Sim. O teletrabalho tem sido discutido na ciência na Alemanha pelo menos desde o fim dos anos 1980. Nos últimos anos, isto certamente tem aumentado, especialmente entre os integrantes das gerações mais jovens. Há uma afinidade muito forte com este conceito, especialmente entre autônomos que trabalham on-line. Eu mesmo trabalho num formato móvel desde que deixei a universidade. Não necessariamente em home office: atuo de forma móvel, de casa, da estrada, de outros locais, mas também trabalho no escritório ou nas instalações da Universidade Livre de Berlin quando dou minhas aulas. Eu nunca experimentei a rotina clássica de levantar de manhã, arrumar minha marmita, ir ao escritório e depois ficar lá até o fim da tarde. Normalmente, cientistas e autônomos adotavam esse formato móvel. Agora, o teletrabalho se torna realidade também no caso de outras atividades, para as quais, até recentemente antes da crise do coronavírus, o clássico expediente no escritório ainda era a norma. Em outras palavras, o teletrabalho é e era uma prática conhecida e cada vez mais utilizada na Alemanha, mas não era uma prática comum no sentido de que a maioria dos funcionários a adotava. O trabalho móvel também já era realidade para vários grupos que não atuam em escritório, mas precisam estar em escritórios ou determinadas instalações comerciais: pense no vendedor externo, no caminhoneiro e em vários outros trabalhadores.
Como andam suas pesquisas agora?
Bem, eu posso continuar meu trabalho normalmente. Apenas algumas pesquisas de campo ou entrevistas foram canceladas. Mas posso fazer isso por vídeo, numa teleconferência. Os tópicos sobre os quais mais pesquiso têm a ver com normas trabalhistas globais. E eu posso continuar a fazer isso agora mesmo na crise atual. Eu ainda tenho acesso aos arquivos, que são eletrônicos. Posso continuar a me comunicar com meus colegas do mundo todo. Mesmo assim, há uma novidade para mim, porque meus filhos não podem ir à escola. Então, não fique surpresa se eles simplesmente entrarem aqui durante essa entrevista e quiserem algo de mim (risos). Isso pode acontecer a qualquer momento durante o home office.
Que orientação o senhor pode dar aempregadores que agora precisam manter a produtividade de suas
equipes remotamente?
As empresas podem fazer muito para ajudar os funcionários nessa transição se adotarem uma estratégia inteligente, além de práticas concretas e recursos apropriados para permitir a execução do trabalho remoto.
Quais são as suas dicas para trabalhadores que precisaram migrar para o home office agora?
Para os funcionários que estão em casa, minha dica mais importante é: defina intervalos fixos de trabalho a fim de se disciplinar. O maior problema do home office não é que as pessoas colocam os pés para cima e não fazem mais nada. Em vez disso, o maior problema é que você perde a noção do tempo quando o expediente acaba. Portanto, você deve pensar em horários fixos. Defina intervalos para quando vai participar de ligações ou videoconferências, o momento do dia em que vai mexer com documentos, o período para responder e-mails… Indico que você defina uma estrutura e incorpore-a à sua rotina. A segunda dica é: relaxe sobre certas coisas quando estiver em casa, para que você não fique estressado ou façatanto alarde quando as crianças o interromperem ou perturbarem. Essas coisas podem acontecer muito quando você está em casa. É uma experiência de aprendizado em grupo.
Como lidar com os diferentes tipos de softwares de comunicação e trabalho remoto?
A situação atual de migração para o home office por causa do coronavírus é ad hoc (pontual, temporária), mas muitas pessoas precisam se acostumar a ela. Então elas têm que se abrir e verificar: quais ferramentas são práticas? Como posso integrá-las ao meu fluxo de trabalho? Como descubro programas que posso usar? Quando dizem “Bem, vamos implementar o home office”, acho uma situação especialmente difícil para quem está fazendo isso pela primeira vez. Há muitos medos e pressões envolvidos. Se você nunca fez isso antes, então não sabe o quão fácil, por exemplo, é usar o Skype. Depois que você descobre, aí pensa: “Oh, na verdade é bem simples, eu posso usar isso”. É importante também não nos deixarmos ficar aturdidos pela infinidade de softwares disponíveis. Existem todos os tipos de aplicativos para a realização de reuniões, elaboração de documentos e assim por diante. Você pode se apegar a um com o qual se dê bem, que já conhece ou usou esporadicamente antes (como exemplo, o próprio Skype). Não é preciso estar disponível em todos os tipos de canais de mídia social porque isso simplesmente toma muito tempo.
*A jornalista é bolsista do Internationale Journalisten-programme (IJP)
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