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"Não existe escassez de água, e sim má distribuição", diz organizadora do FAMA

Evento se contrapõe ao Fórum Mundial da Água e luta contra a mercantilização dos recursos hídricos

Pedro Grigori - Especial para o Correio
postado em 19/03/2018 19:55
Representantes do Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama) se posicionaram contrários ao discurso de escassez hídrica, levantado em debates e seminários do Fórum Mundial da Água (FMA). Nesta segunda-feira (19/3), ocorreu no Centro de Convenções Ulysses Guimarães o lançamento de um relatório da Unesco sobre desenvolvimento dos recursos hídricos, que foi alvo de críticas.

[SAIBAMAIS];O relatório traz um discurso neoliberal sobre escassez, para gerar uma preocupação de que alguém precisa cuidar do negócio para que tenhamos água, e somos contra isso;, afirmou Soniamara Maranho, coordenadora nacional do FAMA. A especialista, que também atua como diretora do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), acredita que o discurso da escassez não é real. ;Hoje, nós (Brasil) temos 3% da água doce do planeta, e não usamos nem meio por cento disso. Não há escassez, e sim má distribuição. Por mais que a gente precise reorganizar a distribuição da água no Brasil e no mundo, ela não tem que vir por meio de um processo de privatização;, acrescenta.

Como exemplo da grande quantidade de água disponível no território brasileiro, a especialista destacou o Aquífero Alter do Chão, uma reserva subterrânea localizada abaixo dos estados do Amazonas, Pará e Amapá. O volume do reservatório é de 86 mil km; de água doce, o que seria suficiente para abastecer toda a população mundial cerca de 100 vezes. ;Mais de 70% da água usada no Brasil vai para irrigação e agropecuária. Apenas 10% é para consumo humano, o que precisamos é reorganizar o saneamento básico, mas de uma forma popular, onde a população brasileira venha usufruir deste recurso;, comentou.
Membros de 13 movimentos sociais falaram sobre as consequências da privatização da água

O discurso ocorreu durante uma mesa de debate na tarde desta segunda-feira (19/3) no Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade, onde as atividades do Fama ocorrem até a próxima quinta-feira (22/3). Participaram, além de Soniamara, representantes dos movimentos indígenas e quilombola, movimentos pela luta dos direitos das mulheres rurais e membros de equipes de debate sobre a água no México, Uruguai, Espanha e Índia.

Três perguntas para oniamara Maranho, coordenadora nacional do Fórum Alternativo Mundial da Água


Quais seriam as consequências da privatização das águas?
A sede e a morte das populações mais pobres. As tarifas de água passarão a ser abusivas, como as de energia elétrica. Se hoje você chega a pagar R$ 6 reais em uma garrafa de 600ml, imagina se ela vinhesse de um processo privatizado? A Europa, que ao longo do tempo sofreu um processo de privatização, agora faz o caminho contrário, de remunicipalização da água, porque a iniciativa privada não investiu, a sucateou. E agora o estado e municípios estão precisando retomar a organização da água em seus países.

Como se relaciona o discurso da escassez hídrica com a privatização?
É um discurso neoliberal, para dizer que vamos ter que organizar a água do mundo, engarrafar e vender. E isso é um grande negócio para quem quer lucrar. É como a não capacidade da Petrobras em fazer o processamento e industrialização do nosso petróleo brasileiro, do nosso pré sal e do nosso minério. Aí começa uma lógica de trazer o discurso para o controle de transnacionais.

O Fórum Mundial da Água tem como como tema ;Compartilhando Água;. Qual é a visão do FAMA sobre isso?
Nós poderíamos dizer que é ;coordenando a água para vender ao povo do mundo;. Esse é o recado que é dado aos trabalhadores. A água nasce onde estão os povos indígenas, quilombolas e camponeses. É ali que nasce a água, e nós somos a água. Imagina bancos e bolsas de valores coordenando a água do mundo? Seria um processo de organização mercadológica para ter um lucro transformando a água em mercadoria. Vamos ter que transformar em muita organização e luta do povo, em defesa da soberania popular, da democracia e do direito da água.

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