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Mesmo com escorregões, Paulo Guedes faz análise correta da economia

Na maior checagem feita até agora pelo Holofote, o ministro da Economia mais acertou do que errou em 12 frases verificadas. Foram nove respostas certas, sendo quatro com leves imprecisões e três falhas

Da Equipe Holofote
postado em 27/05/2019 15:50
Na maior checagem feita até agora pelo Holofote, o ministro da Economia mais acertou do que errou em 12 frases verificadas. Foram nove respostas certas, sendo quatro com leves imprecisões e três falhasO ministro da Economia, Paulo Guedes, abriu, na quarta-feira (22/5), o "Seminário Previdência: por que a reforma é crucial para o futuro do país?", promovido pelo Correio Braziliense e pelo Estados de Minas, com apoio da CNA, da CNI e do Sebrae. Por quase uma hora, Guedes defendeu a reforma da Previdência como essencial para o futuro do Brasil. Ao abordar dados desde a ditadura militar, o ministro explorou informações sobre inflação, planos econômicos, PIB, emprego e educação.

Confira a checagem do Holofote:


"A imprensa livre, quando se apaixonou pelo establishment, sofreu um ruptura pelas mídias sociais e alguém foi eleito, o nosso presidente, gastando menos de R$ 3 milhões"

NA MOSCA

De fato, a chapa do então candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro gastou R$ 2.456.215,03, de acordo com a Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No total, a candidatura recebeu R$ 4.390.140,36 para investir na campanha, ficando a sobra de R$ 1.560.472,98.

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"Quando os militares estiveram em um regime politicamente fechado, eles fizeram a infraestrutura nacional"

NA MOSCA

O período da ditadura militar no Brasil (1964-1985) também ficou marcado por avanços na infraestrutura, principalmente de 1967 e 1979. Nesse período, surgiram a Ponte Rio-Niterói, as hidrelétricas de Itaipu e Tucuruí, as usinas nucleares Angra 1, 2 e 3, a Ferrovia do Aço e a Transamazônica.

Apesar da inegável importância dessas e de outras obras, algumas empreitadas não tiveram êxito completo. A Transamazônica nunca foi concluída. A construção de Tucuruí envolveu-se em escândalos de corrupção. E as usinas de Angra fizeram com que o país vivesse o temor de acidentes nucleares.

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"Como os economistas à época (fim dos anos 1980) não estavam preparados e como a classe política estava inebriada por ter chegado logo ao poder, acabou se envolvendo em uma série de planos econômicos mal-sucedidos, e o combate à inflação acabou levando 10, 15, 20 anos. E deixou as digitais aí, R$ 4 trilhões, R$ 5 trilhões de dívida interna, gastos de R$ 400 bilhões de juros todo ano"

NA MOSCA

Para tentar contar a hiperinflação nas décadas de 1980 e 1990, o Brasil enfrentou seis planos econômicos mal-sucedidos: Cruzado, Cruzado Novo, Plano Bresser, Plano Verão, Plano Collor I e II.

Paulo Guedes também acertou ao mencionar os valores da dívida interna brasileira. Esse débito público federal é contraído pelo Tesouro Nacional para pagar as despesas que ficam acima da arrecadação com impostos e contribuições. Esteve em R$ 3,55 trilhões em 2017, passou para R$ 3,87 trilhões em 2018 e, em janeiro deste ano, estimou-se alta para R$ 4,3 trilhões.

Além disso, em abril de 2019, o Banco Central estipulou a dívida bruta do país ; que contabiliza os passivos dos governos federal ; em R$ 5,431 trilhões.

Outro dado correto apresentado pelo ministro é o do gasto com juros. Segundo dados do Banco Central, o setor público pagou, em 2017, R$ 400,8 bilhões em juros líquidos (6,1% do PIB), contra R$ 407 bilhões em 2016 (6,5% do PIB).

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"Isso tudo atrapalha essa transição, o que deveria ter sido uma transição suave, foi uma transição turbulenta, com dois surtos de hiperinflação, com moratória externa, com impeachments. Tudo isso por consequência de um modelo econômico que estava condenado, que é o modelo intervencionista e dirigista"

NA MOSCA

Artigo publicado em site especializado no mercado financeiro detalha a história da inflação no Brasil. Segundo a publicação, o país sofreu com a hiperinflação por 20 anos, "entre as décadas de 1980 e 1990, quando a inflação galopante chegou a superar os 80% ao mês, ou seja, o mesmo produto chegava a quase dobrar de preço de um mês para o outro."

A análise menciona dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), que divide o período de hiperinflação em dois: "entre 1980 e 1989, a inflação média no país foi de 233,5% ao ano. Na década seguinte, entre os anos de 1990 e 1999, a variação anual subiu para 499,2%."

O artigo completo pode ser conferido aqui.

Além disso, após a ditadura militar, o Brasil, de fato, decretou a moratória ; suspensão do pagamento dos juros da dívida externa ; em 1987 https://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/brasil-declara-moratoria-9948414 . E dois presidentes sofreram impeachment: Fernando Collor, em 1992; e Dilma Rousseff, em 2016.

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"Então, você vê o paradoxo de um governo que gasta muito. Chegou a 45% do PIB, imaginem isso, metade do PIB brasileiro transitando por contas governamentais. Então, ele (governo) gasta muito e gasta mal"

NA MOSCA

Levando-se em conta o Orçamento da despesa do governo federal, atualizado em R$ 3,19 trilhões, e o Produto Interno Bruto (PIB) nominal reprogramado do segundo bimestre, de R$ 7,2 trilhões, chega-se aos 45% ; ou, mais precisamente, 44,44% ; dos gastos mencionados por Paulo Guedes.

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"Infelicitaram o final do governo do regime militar. Saíram pela porta dos fundos do Palácio do Planalto. O Figueiredo não quis nem passar, fazer a transferência da faixa presidencial, envergonhado com a inflação subindo"

QUASE LÁ

De fato, Paulo Guedes acertou ao dizer que o general João Baptista de Oliveira Figueiredo recusou-se a entregar a faixa presidencial a José Sarney. O então presidente não participou das cerimônias de sucessão e deixou o Palácio do Planalto pela porta dos fundos.

A posse de Sarney ocorreu na manhã de 15 de março de 1985, sexta-feira, no Congresso Nacional. Tancredo Neves, eleito indiretamente, havia sido internado às pressas em um hospital 12 horas antes da cerimônia.

Os detalhes estão em reportagem publicada no site do Senado, que revela, ainda, a imprecisão cometida pelo ministro ao comentar outro motivo, além da crise econômica, pelo qual Figueiredo não prestigiou a sucessão:

"Eles (Figueiredo e Sarney) eram inimigos desde que Sarney deixara a Presidência do partido governista, o PDS, e se juntara à oposição, levando consigo correligionários insatisfeitos com o governo militar. Figueiredo saiu do Planalto pela porta dos fundos assim que a sessão no Congresso Nacional terminou"

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"(Eleições de 89) As candidaturas de centro foram rejeitadas e surgiram dois extremos. Veio o Collor de um lado, e Lula do outro. Nenhum dos dois tinha 2% na intenção de voto quando começaram as pesquisas"

PISOU NA BOLA

De acordo com o Datafolha, o horário eleitoral, em 1989, teve início em 15 de setembro. A primeira pesquisa registrada pelo instituto é de 23 e 24 de abril daquele ano: Fernando Collor (então no PRN) registrava 14% de intenções de voto, enquanto Lula (PT) vinha atrás, com 12%.

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"50 milhões de brasileiros estão sem a Carteira de Trabalho"

PISOU NA BOLA

De acordo com o IBGE, da força de trabalho total do Brasil, de 105,2 milhões de pessoas, 35,9 milhões têm Carteira de Trabalho assinada. Ou seja, são 69,3 milhões de brasileiros sem a carteira. Dessa forma, o ministro errou ao arredondar o número para baixo. Os dados são de março, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua.

Destrinchando esses números: no setor privado, são 11,1 milhões de trabalhadores sem Carteira de Trabalho. Além disso, são mais 23,8 milhões de pessoas que trabalham por conta própria. O resto da força de trabalho sem carteira inclui os desempregados e os desalentados.

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"80% dos brasileiros aposentados ganham só até dois salários mínimos"

QUASE LÁ

De acordo com o Boletim Estatístico da Previdência Social (Beps), divulgado em janeiro de 2019, 302.987 pessoas receberam aposentadoria (página 4). Destes, 267.624 ganham até dois salários mínimos do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), totalizando 88,3% dos aposentados. O ministro chegou perto.

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"A aposentadoria média do brasileiro é R$ 1,4 mil no INSS, no regime geral, e a aposentadoria média do funcionário do Legislativo é 20 vezes maior, é R$ 28 mil"

QUASE LÁ

Análise feita pelo jornalista João Borges, publicada em blog hospedado no G1, mostra que os dados do ministro Paulo Guedes pecam em imprecisões. Segundo cálculos feitos com base em números do Ministério da Economia e da Secretaria de Previdência, a aposentadoria média do Legislativo federal é 23 vezes maior do que a do INSS:

"Enquanto um servidor do Legislativo federal se aposenta com um valor médio de R$ 26.823,48, um trabalhador urbano da iniciativa privada (que se aposenta pelo critério de idade - 65 anos para homens e 60 anos para mulheres) recebe R$ 1.129,31. Ou seja, o funcionário público ganha 23,7 vezes mais quando para de trabalhar. Reflexo dos salários do funcionalismo - muito maiores que a média nacional"

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"Ah, (dizem que) no sistema chileno todo mundo suicida. É mentira. Suicida-se mais no Brasil do que lá e aqui é sistema de repartição. Sistema de repartição causa mais suicídio do que o sistema de capitalização. Suicida-se mais aqui do que lá. E muito mais em Cuba"

CALMA AÍ

O ministro Paulo Guedes acerta quando diz que há mais suicídios em Cuba, mas erra ao afirmar que o Brasil também está à frente do Chile por suicídio de idosos com mais de 70 anos. Segundo levantamento da Organização Mundial da Saúde, destacada pela Agência Lupa, essa taxa é de 15,4 para cada 100 mil, em 2016, entre chilenos. Em Cuba, essa média salta para 39,7, enquanto a do Brasil fica em 14,31 para o mesmo montante.

Levada a apuração adiante, o leitor também saberia que é arriscado estabelecer uma relação causal entre sistemas de aposentadoria e suicídio. No Chile, há casos noticiados de idosos com dificuldades financeiras que se mataram. Mas as causas dos suicídios podem ser diversas.

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"Nós gastamos R$ 750 bilhões com a Previdência e gastamos R$ 70 bilhões com educação"

QUASE LÁ

Paulo Guedes vem repetindo essa frase ; às vezes, usa R$ 700 bilhões ; desde abril. De fato, o gasto da Previdência é de R$ 750 milhões, "a maior despesa da União, à frente dos gastos com juros, em torno de R$ 350 bilhões".

O gasto com educação, no entanto, parece ter sido arredondado por Paulo Guedes. Reportagem do UOL, de 2 de maio de 2019, analisa a queda do investimento em educação no Brasil nos últimos quatro anos. Nela, há as despesas com os níveis de ensino. Em 2018, o país gastou R$ 33,4 bilhões com o ensino superior; R$ 29,3 bilhões com educação básica; e R$ 11,9 bilhões com ensino profissional. No total, chega-se ao valor de R$ 74,6 bilhões.


Checagem de Ana Carolina Fonseca, Guilherme Goulart e Igor Silveira, com colaboração de Rosana Hessel e Vicente Nunes

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