postado em 30/05/2008 10:40
YANGUN - A junta militar que governa Mianmar estimulou nesta sexta-feira (30/05) os desabrigados pelo ciclone Nargis a comer rãs, ao invés de aceitar as barras de chocolate enviadas pela comunidade internacional que os militares consideram mesquinha em termos de ajuda financeira, quatro semanas depois da tragédia.
O jornal oficial New Light of Myanmar estranha o fato de apenas 150 milhões de dólares terem sido prometidos pelos países doadores, enquanto o governo calcula em 11 bilhões de dólares a quantia necessária para enfrentar as necessidades de reconstrução. O diário critica as nações que condicionaram qualquer ajuda financeira ao livre acesso das organizações humanitárias internacionais ao delta de Irrawaddy, a região mais afetada pelo Nargis.
"A população de Mianmar é capaz de se recuperar da catástrofe mesmo sem a ajuda internacional", afirma o jornal, antes de acrescentar que os habitantes das zonas costeiras devastadas podem facilmente procurar pescado e que, no caso do início das monções, há grandes rãs comestíveis e em abundância. "Os habitantes podem sobreviver contando com eles mesmos, inclusive se não receberem as barras de chocolate da comunidade internacional", destaca o jornal estatal, para o qual autorizar voluntários estrangeiros a viajar livremente ao delta seria conceder aos doadores "permissão para entrar em todas as casas quando quiserem".
O editorial colérico foi publicado no momento em que os generais birmaneses tentam reforçar seu domínio no país: na terça-feira prolongaram por mais um ano a prisão domiciliar, em vigor desde 2003, da líder opositora Aung San Suu Kyi e nesta terça-feira confirmaram a promulgação de uma nova Constituição. m comunicado assinado pelo homem forte da junta, Than Shwe, publicado na primeira página do jornal, afirma que o texto foi aprovado por 92,48% dos eleitores em um referendo nos dias 10 e 24 de maio.
Inicialmente, a previsão era de que a Constituição entraria em vigor depois das eleições de 2010. A junta não explicou os motivos da mudança súbita. "Para mim, não é mais que uma proclamação de vitória", disse Aung Naing Oo, analista birmanês refugiado na Tailândia.
O ciclone Nargis, que devastou o sul de Mianmar nos dias 2 e 3 de maio, deixou oficialmente 133.600 mortos e desaparecidos, além de 2,4 milhões de desabrigados. A ONU considera que, quatro semanas depois da passagem do Nargis, quase um milhão de sobreviventes precisam de ajuda urgente no delta de Irrawaddy, região que até esta semana estava fechada à ajuda estrangeira.
Apesar das novas críticas da imprensa oficial birmanesa, as agências de ajuda humanitária das Nações Unidas informaram que estão recebendo com mais rapidez os vistos e permissões de acesso ao delta. Porém, o acesso continua sendo mais difícil para as organizações privadas.