postado em 03/06/2008 16:19
ROMA - O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, disse nesta terça-feira (03/06) que a produção de alimentos deve aumentar em 50% para atender às necessidades dos próximos 22 anos, durante a abertura em Roma de uma cúpula da FAO dedicada a discutir a escalada dos preços dos alimentos.
Descrevendo os princípios de um "marco global de ação" contra a crise, Ban abriu a reunião da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), que acontece até quinta-feira, pedindo "um maior grau de consenso internacional sobre os biocombustíveis".
Biocombustíveis
Algumas vozes acusam esse tipo de combustível de contribuir para o aumento dos preços dos alimentos, já que são produzidos a partir de vegetais comestíveis, como a soja e o milho.
Em sua intervenção, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil, o segundo maior produtor mundial de etanol depois dos Estados Unidos, rejeitou esses argumentos, considerando-os "uma mentira" fomentada por "lobbies poderosos".
Lula responsabilizou o encarecimento dos transportes, devido à alta do petróleo, pelo aumento dos preços, estimando que o problema "se deve sobretudo à distribuição".
Exportações
O secretário-geral da ONU também pediu o fim das "políticas econômicas que criam distorções no mercado", entre as quais os subsídios dos países ricos a seus agricultores e as restrições à exportação adotadas por alguns países para se prevenir de problemas de escassez.
"Alguns países limitaram suas exportações ou impuseram medidas de controle dos preços. Essas políticas, que prejudicam os países vizinhos não podem funcionar porque contribuem para fazer subir ainda mais os preços", que já alcançaram seus níveis mais altos em 30 anos. Ban fez um apelo para que a rodada comercial de Doha seja concluída, com o objetivo de pôr fim a essas distorções.
A falta de alimentos, que provocou distúrbios no Egito, no Haiti e em muitos países africanos, levou Brasil, Vietnã e Índia a impor limites à venda de seus alimentos ao exterior.
Demanda maior
Outros fatores citados para explicar que os alimentos tenham dobrado de preço em três anos, segundo o Banco Mundial (Bird), são o aumento da demanda na Ásia, que está mudando seus hábitos alimentares, e problemas com as colheitas.
Robert Zoellick, presidente do Bird - que contribuiu para o plano de ação lançado por Ban Ki-moon, junto com o Fundo Monetário Internacional e as principais agências da ONU -, disse que 2 bilhões de pessoas sofrem atualmente com a crise dos alimentos, que poderia empurrar para a pobreza mais 100 milhões de indivíduos nos países pobres. As agências da ONU pediram mais de US$ 1 bilhão para aliviar a situação.
"Mendigos"
O presidente do Senegal, Abdulaye Wade, afirmou que a FAO e outros organismos tratam os países em desenvolvimento como "mendigos". "Não questiono a cooperação multilateral, por exemplo com o Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional, que fazem seu trabalho. O problema são as instituições multilaterais que pretendem dar assistência alimentar. É um conceito superado, não podemos continuar sendo ajudados como mendigos", declarou.
"Não venham mais nos impor instituições, especialistas. A África de hoje não é mais a mesma de 20 anos atrás", continuou Wade, discursando para os 50 chefes de Estado e de governo que participam da cúpula em Roma.
A presença de Robert Mugabe, presidente do Zimbábue - classificada de "obscena" por um ministro britânico - roubou as atenções na reunião, assim como as críticas feitas ao Ocidente pelo presidente iraniano Mahmud Ahmadinejad.
Subsídios
O diretor-geral da Organização Mundial de Comércio (OMC), Pascal Lamy, estimou que é preciso "atacar o problema dos subsídios que, por sua vez, criam distorções no mercado dando vantagem injusta a alguns países".
"As negociações sobre a redução das subvenções agrícolas e dos direitos alfandegários como parte do ciclo de Doha podem fazer parte das respostas à crise" mundial de alimentos, disse Lamy na reunião. Defendendo uma "concorrência mais leal", ele afirmou também que é preciso aumentar "a capacidade de produção" dos países pobres.
No relatório anual sobre políticas agrícolas dos países membros, a OCDE avaliou em outubro passado em 214 bilhões de euros o montante total das subvenções dadas a seus agricultores por 36 países membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos.