postado em 26/08/2008 13:38
MOSCOU - A Rússia reconheceu nesta terça-feira (26/08) a independência das duas repúblicas separatistas da Geórgia, em um novo desafio às potências ocidentais que denunciaram nisso uma decisão "perigosa" para a segurança na Europa e no Cáucaso.
"Assinei os decretos sobre o reconhecimento pela Rússia da independência da Ossétia do Sul e da Abkházia. A Rússia conclama os outros Estados a seguirem seu exemplo", anunciou o presidente russo, Dmitri Medvedev, em uma declaração solene na televisão.
Moscou tomou esta decisão seis meses depois da independência do Kosovo, reconhecida imediatamente pelos ocidentais, e menos de 20 dias depois da tentativa frustrada dos georgianos de retomarem o controle da Ossétia do Sul.
"Tbilisi fez sua escolha na madrugada de 8 de agosto (ao lançar uma ofensiva militar contra a Ossétia do Sul). O presidente gerorgiano Mikhail Saakashvili escolheu o genocídio para alcançar seus objetivos políticos", afirmou. "Assim, ele arruinou todas as esperanças de coexistência pacífica entre ossetas, abkházios e georgianos dentro de um mesmo Estado", prosseguiu o presidente russo.
Medvedev encarregou o ministério russo das Relações Exteriores de negociar a instauração de relações diplomáticas com a Ossétia do Sul e a Abkházia, dois pequenos territórios de cerca de 70 mil e 250 mil habitantes, respectivamente. Para piorar este contexto de tensões, as forças armadas americanas e russas podem se encontrar na Geórgia pela primeira vez desde o início do conflito. Um destróier americano deve chegar quarta-feiraano porto georgiano de Poti.
As forças russas de manuntenção de paz seguiam nesta terça-feira posicionadas na entrada de Poti, um porto fundamental para a economia georgiana. Os russos expressaram sua preocupação com o "nível de atividade extremo" das forças navais da Otan no Mar Negro.
Um total de 18 navios dos países da Otan são esperados na região, afirmou Anatoli Nogovitsyn, chefe adjunto de Estado-Maior do Exército da Rússia, destacando que dez deles já se encontram no local.
No terreno, as duas repúblicas se disseram dispostas a receber bases militares russas. Moscou, que já concentra vários milhares de homens nestas províncias, contará desta forma com um zona de influência contígua à Geórgia e à Otan, se a ex-república soviética passar a integrar a Aliança Atlântica.
O Parlamento russo havia pedido segunda-feira ao Kremlin que reconhecesse as duas províncias separatistas. Em Tbilisi, o governo georgiano reagiu imediatamente afirmando que este reconhecimento não tem "nenhum valor legal" e que terá "sérias conseqüências políticas" para a Rússia.
O presidente Saakashvili acusou Moscou de querer "modificar pela força as fronteiras da Europa". Ele também pediu aos líderes ocidentais que acelerem o processo de integração de seu país à Otan. Em Sukhumi e Tskhinvali, capitais da Abkházia e da Ossétia do Sul, os habitantes comemoraram com um buzinaço e disparos para o ar com armas automáticas o anúncio de seu reconhecimento por Moscou.
No Ocidente, as reações ao discurso do presidente Medvedev também foram imediatas. Os Estados Unidos e a chanceler alemã, Angela Merkel, qualificaram o reconhecimento de "inaceitável" e "contrário ao direito internacional".
Esta decisão "vai agravar uma situação já tensa na região", advertiu o ministro britânico das Relações Exteriores David Miliband, que viajará quarta-feira à Ucrânia "para formar a coalizão mais ampla possível contra a agressão russa na Geórgia.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, expressou seu temor de que o reconhecimento por Moscou da Abkházia e da Ossétia do Sul tenha conseqüências na segurança e na estabilidade do Cáucaso. "A questão do reconhecimento dos Estados cabe aos Estados soberanos", sentenciou a porta-voz do secretário-geral da ONU, Michèle Montas.
A Rússia está trilhando um caminho perigoso, não somente para a segurança e a estabilidade na Europa, mas também para os princípios do direito internacional", afirmou a chancelaria lituana. O ex-número um soviético Mikhail Gorbatchev advertiu para "uma nova cisão" e um novo "cataclismo" mundial.
Medvedev, por sua vez, declarou que não tem "medo de nada", nem mesmo de uma nova "guerra fria" contra o Ocidente que afirmou, no entanto, não desejar. O chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, minimizou o risco de um isolamento da Rússia.
Em mais um sinal do aumento das tensões, a Rússia anunciou nesta terça-feira a suspensão de sua cooperação com a Otan em uma série de âmbitos, e uma visita a Moscou do secretário-geral da Aliança que estava prevista para outubro foi adiada.
A Rússia manteve no entanto sua cooperação com a Otan no que se refere ao transporte no território russo de alimentos e equipamentos com destino ao Afeganistão.