postado em 18/09/2008 07:49
O irmão de Leopoldo Fernández, governador de Pando, está no Acre. Músico, formado em direito, Loren Fernández chegou ao Brasil depois que o irmão foi preso, temendo ser vítima da violência na Bolívia. Ele conversou com o Correio, por telefone, do pequeno município de Brasiléia. Filho de uma cearense, ele pretende pedir a nacionalidade brasileira. Loren considera que Pando, por ser o estado menos habitado do país, foi o alvo mais fácil para o governo atacar e tirar o governador.
Como começou o conflito em Pando?
Foi em Porvenir. Estava tudo calmo até que o governo (central) decretou o estado de sítio. Atiraram numa jornalista e mataram um soldado, no desespero. Foi só o pessoal da zona rural, organizado pelo ministro Quintana (da Presidência), e a população de Porvenir. Segundo La Paz, o governador de Pando tinha contratado mercenários do Brasil e do Peru, mas até agora eles não conseguiram provar, porque é tudo mentira.
Quem começou o conflito?
Manifestantes do Evo Morales. Eles usavam uma pulseira amarela e vermelha. As pessoas mortas na chacina estavam com uma pulseira amarela. Nós temos provas.
E o que significam essas pulseiras?
A gente não sabe ao certo. As pessoas acham que a vermelha era para os cabeças e a amarela para os "descartáveis". Eles mesmos estavam matando, para culpar o Leopoldo. Muita gente fugiu. Os familiares dos mortos estão dizendo quem foi que entregou as armas, e quanto pagaram. Temos todos esses depoimentos gravados.
E como prenderam seu irmão?
Os militares o prenderam. Meu irmão nunca atravessou para Brasiléia, nunca fugiu. Ele tem consciência de que nunca mandou ninguém reagir, nunca contratou mercenário, então ele não tinha por que fugir. As pessoas diziam: você tem que atravessar para Brasiléia. Ele nunca quis vir. E quando os soldados entraram no palácio ele não reagiu. Pegaram-no dizendo que o levavam para o aeroporto, para ter uma conversa lá. Um senador, um deputado, o padre da cidade acompanharam, mas não houve reunião. Lá estava o ministro Ramón Quintana, ministro da Presidência. Se estamos em estado de sítio, quem deveria estar lá era o ministro da Defesa. E todos os depoimentos falam dele, que foi ele quem organizou os confrontos e pagou. Ele quer apagar todas as provas. Ele continua a perseguição. Há mais de mil bolivianos perseguidos. Meu irmão está correndo risco em La Paz. A propaganda do governo foi muito forte, de que ele é um genocida, um assassino. Então, temos medo de que esse pessoal entre e o mate. Quero garantias do governo Evo Morales de que não vai acontecer nada com meu irmão.
Como foi a sua ida para o Brasil?
Há quase mil bolivianos aqui em Brasiléia. Arrombaram (em Pando) pelo menos uma dúzia de casas, jogando bombas nos portões. Está todo mundo com medo. A gente quer paz. A gente quer democracia. A gente quer uma comissão internacional que investigue as provas. Um tribunal imparcial. E gostaria que meu irmão fosse julgado em foro privilegiado, no Congresso, como governador eleito, e não como cidadão comum, como eles querem, em um tribunal onde podem manipular os juízes.
Foi difícil entrar no Brasil?
A fronteira não está fechada. Nós queremos agradecer ao prefeito de Brasiléia e a todas as famílias que estão oferecendo casas para abrigar os bolivianos. Não temos palavras para agradecer o que os brasileiros estão fazendo pela gente.
O senhor pretende pedir asilo político?
Ainda não pensamos. Porque a gente espera que tudo se normalize. Talvez, no fim das contas, eu tenha de pedir a nacionalidade brasileira. Se esse regime (de Morales) for implantado na Bolívia, que é um regime comunista, nós vamos ter que sair do país. Nós não estamos na política, mas somos irmãos de Leopoldo e vamos ser perseguidos.
Por que em Pando a violência foi mais intensa do que em outros departamentos?
Porque é o menor departamento dos cinco que estão contra o governo e que querem autonomia Então, para o governo, para o exército, é muito mais fácil. A população daqui são 20, 30 mil habitantes. Santa Cruz e Beni fica mais difícil para eles. Essas mortes ocorreram porque eles estavam armados, e eles pretendiam fazer a mesma coisa em Santa Cruz. Estão dando armas para o pessoal da área rural, em San Julián, para ver justamente se ocorre outro conflito como aqui em Cobija, para depois prender o governador de Santa Cruz. Agora, estão mandando um militar para governar Cobija.