postado em 30/09/2008 07:48
Em um momento de tensões e instabilidade na região, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarca hoje em Manaus para uma visita inteiramente tomada por encontros com os três vizinhos que formam o ;eixo bolivariano;. Lula vai almoçar com os colegas Hugo Chávez (Venezuela), Evo Morales (Bolívia) e Rafael Correa (Equador). Também terá encontros bilaterais com delegações dos três visitantes, começando com Chávez logo pela manhã. Projetos de integração energética e o ambicioso plano de uma ligação intermodal entre os oceanos Atlântico e Pacífico estarão na agenda, mas o anfitrião deve aproveitar a ocasião para tratar de questões políticas, como o mal-estar entre o governo equatoriano e a construtora brasileira Odebrecht, o impasse entre governo e oposição na Bolívia e a aproximação militar entre a Venezuela e a Rússia.Na reunião reservada que terá com Chávez, Lula transmitirá o recado de que o Brasil vê com reserva as manobras navais conjuntas que trarão ao litoral venezuelano do Caribe, em novembro, uma esquadra russa comandada pelo suprecruzador Pedro, o Grande. Sem questionar a normalidade dos exercícios, o presidente deverá ;aconselhar; o vizinho a não ;importar; para a região as tensões entre Rússia e Estados Unidos. Lula e Chávez assinarão um conjunto de acordos, inclusive um de cooperação entre a Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Habitação da Venezuela para construção de casas populares.
Com Evo Morales, a expectativa é de que o presidente reafirme o apoio do Brasil e da União de Nações Sul-Americanas ao governo central boliviano na disputa com os governadores que lideram a oposição regionalista. No início do mês, a crise resultou na suspensão parcial do bombeamento de gás natural da Bolívia para o Brasil, por causa de bloqueios e sabotagens promovidos por setores da oposição.
Embargo
Um assunto não deve escapar durante a conversa privada entre Lula e Rafael Correa. O desconforto provocado pelo embargo aos bens da construtora brasileira Odebrecht no Equador e a proibição de deixar o país imposta a quatro funcionários da empresa. ;Com certeza, conversaremos sobre esse tema, mas Lula conhece muito bem a nossa posição;, adiantou Correa durante seu programa de rádio, no sábado passado. Desde que assinou o decreto contra a Odebrecht, o presidente equatoriano cuida de evitar um contencioso com o governo brasileiro ; embora tenha ameaçado calote de um crédito de US$ 243 milhões liberado pelo BNDES para um projeto da empreiteira no Equador.
Lula se diz preocupado com o problema, principalmente com a situação dos funcionários refugiados na embaixada brasileira em Quito. Mas, ao contrário do que declarara Correa, o porta-voz do Planalto, Marcelo Baumbach, afirmou que o presidente ;não vai entrar no mérito da discussão, pois se trata de um tema a ser resolvido entre a empresa e o governo equatoriano;. Baumbach disse que as negociações ;têm avançado de maneira positiva;, e que o presidente aposta em ;uma solução satisfatória para ambas as partes;.
Lula convidou Correa para ir à capital amazonense discutir com os colegas Chávez e Morales o Plano de Conexão Multimodal entre o porto equatoriano de Manta, no Pacífico, e o de Manaus. O projeto de conexão interoceânica também passa pelo território peruano e boliviano. ;Já foram realizadas três reuniões da Comissão do Eixo Multimodal, e a previsão é de que as obras sejam iniciadas em agosto de 2009 e concluídas entre junho e agosto de 2011;, afirmou o porta-voz do Planalto. ;Todos estamos interessados no projeto;, garantiu Correa no programa de rádio. O plano prevê a construção de estradas, aeroportos, portos e vias fluviais.
Lula também quer conversar com Correa sobre a nova Constituição aprovada no domingo pelos equatorianos. ;O presidente tem acompanhado com interesse o processo de reinstitucionalização do Equador, e espera que esse processo tenha reflexos positivos nas relações entre os dois países;, revelou Baumbach. O texto da nova Carta Magna dá prioridade à integração sul-americana.
Agenda
10h15
Reunião privada entre Lula e Hugo Chávez
11h25
Cúpula Brasil-Venezuela
13h30
Almoço de Lula com Chávez, Evo Morales e Rafael Correa
15h30
Cúpula Brasil-Bolívia
16h30
Cúpula Brasil-Equador
Bolívia
US$2,4 bilhões foi o fluxo de comércio em 2007, com déficit de US$ 750 milhões para o Brasil
Equador
US$ 692 milhões foi o valor das trocas em 2007, com superávit brasileiro de US$ 631 milhões
Venezuela
O comércio bilateral no ano passado somou US$ 5 bilhões, com superávit de US$ 4,4 bilhões
Correa vence com 64%
Seis em cada 10 equatorianos (64%, com 90% dos votos apurados) aprovaram no referendo de domingo a nova Constituição proposta pelo presidente Rafael Correa, e o país passará por uma transformação no sistema político. Uma nova eleição presidencial está marcada para fevereiro de 2009, e o próximo chefe de Estado terá quatro anos no poder, com direito a uma reeleição sucessiva. Correa, que terá abreviado o mandato iniciado em 2007, poderá ser candidato no ano que vem e se reapresentar em 2013. Desde já, a nova Carta lhe dá a prerrogativa de dissolver o Legislativo, mas, embora com popularidade na casa dos 70%, ele promete mais diálogo com a oposição, que o acusa de ser ;ditador;.
;Vamos ver se a nova Constituição é abortista, centralista, hiperpresidencialista, se consagra uma ditadura. Vamos ver se tudo isso está certo, como denunciou a oposição, incluindo a Igreja Católica;, desabafou Correa depois da vitória. Os católicos afirmam que o texto deixa a porta aberta para o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo. A oposição política acusa o presidente de acumular poderes ditatoriais para implantar um regime socialista de estilo cubano.
;Nós estendemos a mão a eles. Reconheçam a derrota e avancemos juntos na nova direção que a grande maioria do povo equatoriano, assim como toda a América Latina, está apontando: uma sociedade mais justa e eqüitativa, sem tanta desigualdade e miséria;, declarou o presidente. A oposição reconheceu a derrota e deu a entender que aceita o convite. Correa disse à imprensa que ;não é o momento; de pensar em reeleição.
O presidente também descartou a idéia de nacionalizar as empresas petrolíferas, mas cobrou investimentos no país. ;Temos a intenção de garantir a liberdade empresarial na extração e distribuição dos hidrocarbonetos, mas não permitiremos que as empresas reduzam o nível de investimentos;, advertiu. ;Se as petroleiras deixarem de investir, terão de sair (do país).; Na semana passada, a Petrobrás desistiu de explorar dois campos de petróleo na Amazônia equatoriana. A empresa brasileira investiu US$ 200 milhões na área para a obtenção da licença.