postado em 03/10/2008 07:50
Para o britânico Clive Walker, professor do Centro para Estudos da Justiça Criminal da Universidade de Leeds, a renúncia do comissário-chefe da Polícia Metropolitana, Ian Blair, representa uma humilhação para a Scotland Yard. Em entrevista ao site correiobraziliense.com.br, ele explicou que a execução de Jean Charles de Menezes minou a credibilidade da opinião pública em relação à força policial. Além disso, a recusa de Blair de assumir a responsabilidade da instituição pelo trágico erro provocou desgaste com o prefeito de Londres, Boris Johnson, e tornou sua situação insustentável.
Que impacto a execução de Jean Charles de Menezes teve na renúncia de Ian Blair?
A causa imediata dada por Blair para sua renúncia foi seu pobre relacionamento com o recém-eleito prefeito de Londres, Boris Johnson. O novo prefeito deixou claro que ele pensa que os padrões de policiamento em Londres não são bons o suficiente. De fato, foi o Ministério do Interior que apontou Blair e não o prefeito. Por isso, a relação com Johnson é importante, mas não vital. Além disso, o prefeito nada disse nessa semana que tenha sido uma crítica contundente a Blair. Nada de novo ocorreu, a não ser a renúncia.
Isso leva a opinião pública britânica a pensar que houve outros fatores envolvidos na decisão de Ian Blair. Alguns desses fatores incluem: a) uma disputa com um de seus vices que o acusou de racismo; b) um inquérito sobre negócios financeiros impróprios que surgiram quando Blair escolheu um amigo como conselheiro pago.
O caso Jean Charles é considerado outro fator. Essa execução danificou a reputação de Blair por duas vezes. Na primeira vez, ele foi fortemente criticado pela Comissão Independente de Queixas contra a Polícia (IPCC) por ter procurado dizer meias-verdades após o crime para acobertar erros. E ele foi criticado por não estar suficientemente no controle e informado por seus oficiais sobre o tiroteio. Na segunda ocasião, ele foi considerado culpado por violações à segurança e à saúde públicas cometidas durante a operação antiterrorismo. Muitas pessoas achavam que teria sido honroso para ele renunciar naquele momento. Agora, ele enfrenta o inquérito público usando os mesmos artifícios novamente. Por isso, enfrenta outra humilhação pública em um curto espaço de tempo.
Concluindo, o assassinato não foi o único fator. Mas talvez seja o principal fator que danificou sua reputação para sempre. A opinião pública britânica tem a maior simpatia pela família de Jean Charles de Menezes, mas há alguma compreensão de que os oficiais que atiraram nele pensaram que ele fosse um homem-bomba, o que foi uma falha de gerenciamento. O último gerente era Ian Blair.
A renúncia reprensenta uma grande humilhação para a Scotland Yard?
Sim, porque Ian Blair disse que nada fez errado em nenhuma das causas acima e que permaneceria no cargo até o fim. Como o prefeito não pode demiti-lo, isso implica que Blair realmente se sente sob pressão crescente da opinião pública e que ele tem perdido o controle da situação. A renúncia será vista por muitos como uma admissão, apesar de suas negativas, como um indício de que o gerenciamento da polícia de Londres perdeu a confiança da população e que uma nova face é necessária.
O que podemos esperar do inquérito sobre a morte do brasileiro?
Dois inquéritos foram iniciados. Os inquéritos do IPCC foram muito exaustivos. Eu não creio que descobriremos fatos novos, pois o IPCC já teve total acesso aos arquivos secretos. Talvez um pouco mais desses documentos seja revelado. Mas há um limite para a crítica pelo modo com que a polícia construiu suas políticas sobre atentados suicidas. Eu creio que os oficiais que executaram Jean Charles de Menezes não serão condenados. Há um precedente, que foi a morte de três suspeitos do Exército Republicano Irlandês (IRA) em Gilbraltar, 20 anos atrás. A Corte Européia dos Direitos Humanas não tenha condenado os soldados que assassinaram os suspeitos, mas apenas criticou o modo como a operação foi montada. Por favor, diga aos seus leitores que a maior parte dos britânicos lamenta o assassinato e pensa que nossa polícia deveria ter se organizado de uma forma melhor. Ao mesmo tempo, deve-se enfatizar que esse tipo de ocorrência se seguiu ao atentado de 7 de julho e que o assassinato mesmo de suspeitos de terrorismo é muito raro. Desde 11 de setembro de 2001, apenas Menezes foi morto, ainda que mais de mil prisões por atividade terrorista foram feitas.