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Único neurônio consegue ativar membro paralisado

Cientistas da Universidade de Washington criam conexão artificial direta entre células e músculos e devolvem movimentos a macacos

postado em 16/10/2008 07:39
É como um vislumbre de esperança para milhares de brasileiros presos para sempre a uma cadeira de rodas ou a uma cama. Cientistas da Universidade de Washington, em Seattle (Estados Unidos), descobriram que a ativação de um único neurônio pode ser suficiente para recuperar a atividade muscular nos braços de pacientes paralisados por lesões na medula espinhal. Eles construíram um ;neurochip; conhecido como interface cérebro-máquina ; do tamanho de um celular, o aparelho interpreta os sinais do cérebro e os converte em sinais elétricos que estimulam a contração muscular. A técnica foi considerada um sucesso em dois macacos testados pela equipe do norte-americano Chet Moritz. Os pesquisadores implantaram eletrodos no córtex motor (parte do cérebro responsável pela motricidade voluntária) dos primatas. Cada eletrodo captou sinais do neurônio e os enviou, por meio de um cabo, a um computador. Os sinais neurais controlaram um cursor em uma tela. Os animais foram então treinados para movê-lo usando apenas a atividade cerebral. Os cientistas usaram anestesia local para bloquear os movimentos de músculos do punho dos primatas e reconduziram os sinais colhidos pelos eletrodos de modo que produzissem estímulos elétricos nos músculos do punho. ;Essa conexão artificial foi criada com a conversão da atividade dos neurônios, gravada com pequenos eletrodos no cérebro, por meio de um computador que aciona os estímulos enviados aos músculos;, explicou ao Correio o fisiologista e biofísico Eberhard Fetz, co-autor do estudo publicado ontem na revista científica Nature. De acordo com ele, uma descoberta importante foi que qualquer neurônio no córtex motor pode ser acionado, não apenas aqueles relacionados ao movimento das mãos. ;Até mesmo as células não associadas poderiam ser voluntariamente controladas, após um rápido treinamento de biofeedback. Basta conectar esses neurônios ao estimulador do músculo para gerar forças capazes de induzir um cursor de computador ao seu alvo;, acrescentou Fetz. Otimismo O especialista alemão esbanja otimismo frente ao potencial de sua pesquisa. ;A possibilidade de que o controle muscular derive de células em diferentes áreas do cérebro, além do córtex motor, sugere uma rica fonte de sinais elétricos, o que compensaria a perda de neurônios ocorrida durante um derrame, por exemplo;, afirmou Fetz. Questionado pela reportagem se o início de uma ;era biônica; aproximaria a medicina da cura da paralisia, o cientista da Universidade de Washington foi efusivo: ;Sim, estamos mais próximos disso;. Fetz também fez questão de citar o trabalho do neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, a quem se referiu como ;brilhante;. ;Nicolelis desenvolveu técnicas para gravar grandes populações de neurônios corticais e converter a atividade decodificada de forma a controlar braços robóticos e cursores de computadores;, lembrou. No novo método, os sinais das células se associam diretamente ao estímulo muscular. O resto da ;tarefa; fica por conta do próprio cérebro, que aprende a aperfeiçoar o controle do músculo. Foi o próprio Fetz quem demonstrou pela primeira vez, na década de 1970, como comandar uma ação usando a atividade neural. Ainda que o avanço seja significativo, Moritz admitiu à Nature que um tratamento clínico ainda deve demorar anos. Isso porque os implantes de eletrodos não são adequados para uso em humanos. Além disso, um desafio será produzir uma cadeia de atividades musculares que leve os cadeirantes a realizar movimentos coordenados. ;O próximo passo será investigar como essa estratégia deve ser aprimorada para incluirmos um número maior de neurônios e para controlarmos padrões mais complexos de estímulo muscular;, disse Fetz. Não importa o prazo para que isso ocorra, deficientes físicos sabem que já podem sonhar com menos limitações.

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