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'Tristes trópicos' é considerado um dos maiores livros do século XX

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postado em 24/11/2008 12:43
PARIS - Em 1954, a editora francesa Plon encarregou um jovem especialista em populações esquimós e laponas, Jean Malaurie, da criação de uma coleção etnográfica intitulada "Terra Humana". Malaurie, então, pediu a Claude Lévi-Strauss que escrevesse um relato de suas viagens. Em quatro meses, o antropólogo francês terminou seu manuscrito, baseado na viagem que fez ao Brasil nos anos 30. Na mesma época, Lévi-Strauss havia abandonado um projeto de romance, do qual aproveitou o título, "Tristes Trópicos", para a nova publicação. "Eu tinha uma bolsa cheia, que tinha vontade de esvaziar", disse. E o que foi esvaziado sobre a obra não foi apenas seu conhecimento, mas também sua alma, e esta seria a diferença fundamental entre um relato erudito e uma obra de arte. O austero e discreto estudioso vivia claramente dividido entre o desejo de liberdade e o trabalho científico. Sua decisão, por fim, foi "autorizar-se" à liberdade e escrever uma obra audaciosa, quase "antinatural", uma vez que Levi-Strauss não hesitou em empregar o "eu" no texto quando defendia a idéia de que "o 'eu' é odioso". Depois de um paradoxal "odeio viagens e exploradores", 500 páginas extraordinárias foram escritas pelo antropólogo, que relata vivamente suas aventuras e expõe suas reflexões. Moralista, Lévi-Strauss analisa nesta "autobiografia intelectual" as relações entre o novo e o velho mundo, o lugar do homem na natureza, o sentido da civilização e do progresso. O sucesso foi imediato, as críticas, entusiasmadas. Às vésperas do anúncio de seu prestigiado prêmio, a academia Goncourt lamentou não poder escolher o livro por não ser um romance. Os cientistas, no entanto, se mostraram reticentes, ansiosos por ver o retorno de seu colega ao terreno científico. "Os etnólogos me acusam de ter feito o trabalho de um fã, e o público, um livro erudito. Tudo isso é indiferente para mim", afirmou o autor. "Tristes Trópicos", no entanto, não parou de ser traduzido e reeditado. Claude Lévi-Strauss o considerava um livro escrito "rápido demais e sem reflexão". "Insólitas, desconcertantes, desconexas, pulando as épocas, os anos, as estações, palpitantes, as fulgurações de 'Tristes Trópicos' são do tipo que traçam caminhos na noite. E isso ainda perdura", escreveu a ensaísta Catherine Clément, amiga pessoal do intelectual e especialista na obra de Lévi-Strauss.

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