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Entrevista com Osama Handam: Líder do Hamas adverte Israel contra invasão

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postado em 03/01/2009 07:00
Os ataques de Israel contra a Faixa de Gaza vão fazer com que não haja mais paz dentro de Israel, produzidão uma nova geração de militantes islâmicos, iniciarão uma intifada (levante palestino) na Cisjordânia e, a curto prazo, aumentarão a resistência palestina ; o que inclui atentados suicidas no país vizinho. Em entrevista exclusiva ao Correio, por telefone, de Beirute, o palestino Osama Hamdan, de 43 anos, veterano líder do grupo fundamentalista islâmico Hamas, fez esses alertas e avisou que seu povo pode esquecer a idéia da paz. Diretor do escritório do Hamas no Líbano e membro do Comitê Político da facção (Politburo), Hamdan também prometeu que seus homens estão pronto para resistir a uma invasão de tropas israelenses.

Como o senhor e o Hamas veem esses ataques de Israel contra a Faixa de Gaza?
Eu acredito que os ataques israelenses são uma declaração de que eles tentam quebrar a resistência palestina. Somos um alvo político. Eles sabem que as forças políticas de negociação entre Abu Mazen (Mahmud Abbas) e os israelenses chegaram a um ponto decisivo. Eles não podem alcançar um acordo para impedir o direito dos palestinos de soberania sobre Jerusalém e defendem que não haverá um Estado palestino, mas apenas um sistema de apartheid. Eles sabem que isso não ocorrerá, ao menos que eles minem a resistência palestina. Nós estamos usando várias bombas, mas temos a determinação de derrotar os israelenses e de lutar pelos nossos direitos. Esses ataques produzirão duas importantes consequências. A primeira: a resistência vai crescer mais e mais, recrutando muitos militantes. A resistência mostrará a habilidade de prosseguir, sem levar em consideração os pesados bombardeios em Gaza, alvejando cada posição civil. Isso vai gerar uma nova intifada na Cisjordânia. A segunda e importante consequência é que acreditamos que essa operação vai destruir o que restou do processo de paz. Todos sabem que o processo de Annapolis fracassou, não há chances de retomar o diálogo. Depois dessa guerra, todos os palestinos não deverão pensar mais em paz. Você não pode prometer ao povo soberania enquanto bombardeia suas casas.

O Hamas está preparando ações de martírio no território israelense?
Esses ataques vão aumentar o comprometimento do povo palestino com a resistência mais e mais, o que inclui as pessoas prontas para lutar pela sua causa, pelo seu povo. E isso de vários modos, não apenas através de ataques e operações de martírio. Os ataques israelenses podem encerrar qualquer crença de que será possível viver em paz dentro de Israel. Essa guerra vai criar uma nova geração, que acredita apenas no desmantelamento de Israel. Qualquer pessoa que acompanha o que vem ocorrendo na Palestina nos últimos 20 anos vai concluir isso. As crianças ou os bebês que viviam em 1987, durante a primeira intifada, são as pessoas que lutam contra Israel agora. Mais crianças lutarão contra Israel. Essas crianças que estão presenciando todos esses assassinatos agora farão tudo o que puderem para derrotar Israel. A resistência usará de todos os meios para combater a ocupação, incluindo operações de martírio.

Israel admite ter destruído um terço da capacidade militar do Hamas%u2026
Bem%u2026 No primeiro dia de ataque (sábado passado), eles disseram ter destruído 70% da capacidade da resistência. Uma semana depois, estão afirmando que arruinaram um terço da capacidade. O que posso dizer é que os danos são menores que o esperado e isso é muito bom para nós. Seremos capazes de comandar uma guerra a longo prazo contra eles, mais do que os analistas esperam.

Que conselhos o senhor daria ao governo israelense, que prepara uma invasão terrestre a Gaza?
Se eles decidirem por uma invasão terrestre, devem preparar sua comunidade para duas coisas. Mais foguetes serão lançados a partir de Gaza do que eles esperam e um novo comitê do Hamas será formado no exterior. Meu conselho é que eles ouçam isso: escutem as lições de seu ataque contra a resistência no Líbano em 2006. Ainda que a situação da resistência em Gaza não seja a mesma, eu acredito que eles têm de tomar essas lições. Eles não estarão protegidos durante uma invasão à Palestina por um simples motivo: os palestinos ainda resistem à ocupação. Eles derrotaram a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) em 1982, mas não puderam parar a resistência. Eles assinaram os Acordos de Oslo e o minaram, mas não quebraram a resistência na Palestina. Se eles querem estar com os palestinos, eles têm de reconhecer os direitos da Palestina e declarar um comprometimento com esses direitos, incluindo as terras ocupadas, Jerusalém e o retorno dos refugiados. Sem isso, eles vão se achar em uma situação muito ruim nos próximos anos. Eles (israelenses) darão uma desculpa a qualquer pessoa para combatê-los. Se eles criarem essa atmosfera, não poderão sobreviver.

No caso de ofensiva terrestre, o senhor prevê um banho de sangue?
As pessoas em Gaza, não apenas o Hamas, estão prontas para lutar contra as tropas israelenses. Quero lembrar a todas as pessoas, inclusive aos cidadãos e soldados israelenses: vocês tentaram, em fevereiro de 2008, entrar no campo de refugiados de Jabaliya. Durante seis dias, não conseguiram avançar um quilômetro. A situação agora para a resistência é melhor que no ano passado, as pessoas estão mais determinadas a lutar. Vocês têm de entender que as pessoas estão prontas para se sacrificar.

O Hamas descarta uma trégua com Israel?
Houve uma trégua, que durou de junho a dezembro. Israel não aplicou qualquer termo de responsabilidade. Eles desrespeitaram a trégua. Houve 128 violações da trégua, 53 ataques contra civis e mais de 53 palestinos foram mortos ; um terço era de crianças. Quando falamos sobre trégua, queremos o claro comprometimento de Israel para interromper os ataques a Gaza e ter garantia que Israel cumprirá com todos os termos de responsabilidade. Caso contrário, ninguém poderá acreditar mais em Israel.

Como o senhor analisa o relacionamento entre Hamas e Fatah na Faixa de Gaza?
Ninguém pode negar que houve uma divisão entre os palestinos. Mas acredito que, sob as atuais circunstâncias, temos de caminhar em relação ao diálogo com o Fatah para resolvermos todos os problemas. Não será fácil resolvê-los, mas nada é impossível. Podemos, juntos, ajudar nosso povo, defender nossos direitos e libertar nossa terra.

Ainda é possível obter uma paz definitiva no Oriente Médio?
Ainda que seja difícil para os israelenses, a comunidade internacional precisa pôr fim à ocupação. Vamos lutar e alcançar essa meta.

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