postado em 06/02/2009 07:00
Em entrevista exclusiva ao Correio, o cientista Richard Burt - chefe da Divisão de Imunoterapia para Doenças Autoimunes da Faculdade de Medicina da Northwestern University, em Evanston (Illinois) - contou como ele e sua equipe reverteram os sintomas da esclerose múltipla utilizando células-tronco do próprio paciente.
Como o senhor conseguiu reverter os sintomas da esclerose múltipla nos pacientes? Poderia explicar, em uma linguagem simples, como é este procedimento?
Nós isolamos as células-tronco do sangue do paciente. Demos ao paciente agentes que destroem o sistema imunológico (os anticorpos cytoxan e antitimócitos. Depois, infundimos as células-tronco na veia do próprio paciente. Essas células-tronco regeneraram um novo sistema imunológico e o paciente deixou o hospital 11 dias depois. A esclerose múltipla é uma doença em que suas próprias células-tronco atacam o cérebro. Nós fizemos um transplante de células-tronco imunes para zerar o sistema imunológico de forma que elas não ataquem mais o cérebro ; quando isso ocorre, o cérebro se regenera. Uma vez que o paciente progride para a esclerose múltipla secundariamente progressiva, o cérebro não consegue mais se recuperar.
Quantos pacientes foram acompanhados e qual foi o percentual de reversão dos sintomas?
Nossa equipe acompanhou 21 pacientes. Nenhum deles registrou piora. Ao todo, 17 pacientes (ou 80%) foram marcados pela reversão da disfunção neurológica ; uma melhora na função neurológica. A máxima melhoria na função neurológica ocorreu após dois anos de tratamento.
Zerar o sistema imunológico não é considerado extremamente perigoso para o paciente? Como é possível garantir a segurança dessa técnica e evitar riscos de infecções?
Não existem garantias. Há um risco real, mas pequeno. Nós estimanos que existe uma probabilidade de menos de 0,5% dos pacientes morreram. Mas a técnica foi bem toleradas em todos os nossos 21 pacientes.
Pode-se considerar esse tratamento uma revolução, um grande avanço na medicina?
Pela primeira vez, uma terapia reverteu a perda neurológica provocada pela esclerose múltipla. Todos os outros tratamentos atuais têm apenas diminuído a progressão do declínio neurológico. Este tratamento com células-tronco reverteu os sintomas neurológicos. Pela primeira vez, nós conseguimos reverter a tendência da esclerose múltipla. Mas eu gostaria de alertar que essa técnica não funcionará em alguns tipos de esclerose múltipla ; como a esclerose múltipla progressiva secundária ;, mas funciona bem na esclerose múltipla recorrente remissiva (a mais comum, ocorre em 60% dos casos). Precisamos provar esses resultados em um teste aleatório. Esse estudo já foi aprovado pela FDA (agência norte-americana responsável pela fiscalização de drogas e alimentos) e estamos escolhendo pacientes em Chicago. Também recebemos a aprovação do governo brasileiro e abrimos essa pesquisa na Universidade de São Paulo, em breve.