Mundo

Promotoria britânica não vai acusar policiais do caso Jean Charles

Após revisar provas, organismo inocenta oficiais da Scotland Yard que mataram brasileiro no metrô londrino. Família reage com revolta

postado em 14/02/2009 07:50
Sete tiros na cabeça e um no ombro selaram o destino de Jean Charles de Menezes, um eletricista mineiro de 27 anos que havia trocado Gonzaga (MG) por Londres para juntar dinheiro e ajudar os pais. Na tentativa de obterem a punição dos policiais da Scotland Yard que confundiram o rapaz com um terrorista, familiares transformaram o sofrimento em união e partiram para a luta. Mas a batalha judicial terminou ontem, quando membros do Serviço de Promotoria da Coroa britânica (CPS, pela sigla em inglês), revisaram ; pela segunda vez ; as pistas da execução e decidiram não processar nenhum dos oficiais envolvidos no crime. ;Eu concluí que há evidências insuficientes de que qualquer crime foi cometido por oficiais em relação à trágica morte do senhor Menezes;, afirmou Stephen O;Doherty, da Divisão de Crimes Especiais da CPS. Segundo o jornal The Daily Telegraph, O;Doherty considerou a inexistência de indícios que o levassem a acusar os agentes inclusive por homicídio involuntário. A determinação da promotoria encerra a possibilidade de colocar atrás das grades os policiais que mataram o brasileiro, em 22 de julho de 2005. A família de Jean Charles reagiu com uma mistura de revolta e frustração. Por telefone, de Londres, Alex Pereira contou ao Correio que o inquérito sobre a morte do primo foi alvo de ;manipulação;. ;Todos viram que o juiz impediu os jurados de tomarem a decisão que eles queriam e deixou o veredicto em aberto;, desabafa. Para o motoboy, a Justiça britânica costuma bloquear a punição, dependendo do réu envolvido. ;Aqui não é diferente do Brasil: culpados são punidos apenas se forem pobres e se não tiverem nenhuma proteção. Quem tem as costas quentes não fica preso aqui, não;, ironiza. Premeditado Alex lembra que os policiais da Scotland Yard se deslocaram até Stockwell com o claro propósito de matar alguém. ;Os oficiais estavam ali para executar uma pessoa e, por isso, teriam de ser punidos pela morte de um ser humano;, comenta. Em dezembro passado, o júri da corte britânica reconheceu falhas grotescas na operação antiterrorista. O veredicto aberto, que rejeitou o termo ;homicídio legal;, e a renúncia de Ian Blair ; comissário-chefe da Scotland Yard ; foram visto pela família Menezes como oportunidades uma punição. O ânimo deu lugar à falta de esperança. ;A gente não consegue ir a lugar algum, não. O inquérito foi a parte mais importante do caso. Buscamos a verdade lá no fundo, mas ela foi ignorada;, afirma. Vivian Figueiredo, também prima de Jean Charles, admite que a decisão da promotoria deixou a família descontrolada. ;A CPS não se reuniu conosco ou com nossos advogados, fomos excluídos do processo;, denuncia. ;Não entendemos como o assassinato deliberado de um inocente e a tentativa da Scotland Yard de encobri-lo não resultaram em acusação.; Em nota oficial, a campanha Justiça por Jean Charles de Menezes garantiu que recorrerá ao Parlamento para cobrar mudanças na lei envolvendo crimes praticados pela polícia. » Ouça entrevistas: Alex Pereira e Maria Otone, primo e mãe de Jean Charles de Menezes
Entrevista - Maria Otone de Menezes ;O meu coração está arrasado; Pelo telefone, a voz de Maria Otone de Menezes, de 63 anos, transmitia a dor de quem teve um tesouro roubado. A mãe de Jean Charles de Menezes reconhece: ;Tristeza não mata, se não eu já tinha morrido;. De Gonzaga (MG), ela disse ao Correio que a família não tem forças para lutar por justiça. Com as últimas palavras ; ;O meu coração está arrasado; ;, veio o choro baixinho. Como vê a decisão da promotoria de inocentar os policiais que mataram seu filho? É muito difícil. Eu nunca imaginei que essa barbaridade poderia acontecer. Para o Reino Unido, que diz ser o primeiro país do mundo, não imaginava que eles seriam tão injustos. Nós lutamos durante mais de 40 dias na corte de Londres e pensávamos que eles pagariam pelo que devem pagar. Eles pagarão no outro mundo. De início, eu fiquei muito transtornada. O que fazer quando as coisas não ajudam do lado da gente? Entreguei nas mãos de Deus. Tristeza não mata, se não eu já tinha morrido%u2026 Como foi esse período em Londres? Pensava que eles seriam pelo menos julgados. Eu pedi justiça, queria justiça. Até hoje eu peço justiça, mas a da Terra não me ajudou. Então, eu peço a de Deus. Eu tenho de ser forte. Não posso morrer agora. O governo brasileiro ajudou sua família a buscar justiça? Se nosso governo quisesse dar essa força, já teria me procurado. Não vi nada de governo. Desde quando apagaram a vida daquele menino, ele me fez falta e vai me fazer falta enquanto eu estiver viva. Eu nunca vou me esquecer dessa tragédia que eles fizeram comigo. Sua família vai lutar para punir os policiais? A luta da justiça terrena já acabou. Minha família não tem mais força para mexer com eles, não. O que eu posso fazer? Eu fraca no meio dos fortes? Meu coração está triste, arrasado.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação