postado em 16/02/2009 07:40
PHNOM PENH - Trinta anos depois da queda do Khmer Vermelho, um tribunal cambojano, com participação internacional, começará a julgar na terça-feira um ex-líder do regime, o primeiro dirigente a ser levado ao banco dos réus pelas atrocidades cometidas nos anos 70 em nome de uma revolução comunista.
Os cambojanos poderão acompanhar o julgamento pela televisão, que transmitirá ao vivo a chegada ao tribunal do ex-chefe dos torturadores, Kaing Guek Eav, conhecido como "Duch".
Será a primeira audiência do processo, durante o qual serão examinados os procedimentos. Os debates de fundo começarão na segunda semana de março.
O regime ultracomunista do Khmer Vermelho, que governou entre 1975 e 1979, impôs o terror ao Camboja, obrigando os habitantes a abandonar as cidades para ir para o campo, extenuando a população com trabalhos forçados e eliminando sistematicamente todos os "traidores da revolução".
Cerca de dois milhões de cambojanos morreram nesse período sombrio da história do século XX.
"Duch", agora com 66 anos, dirigia então o campo S-21, conhecido também com o nome de Tuol Sleng, um centro de interrogatórios que funcionava num antigo colégio secundário de Phnom Penh, onde mais de 12.00 pessoas foram torturadas e assassinadas em função da repressão em massa organizada pela equipe no poder de Pol Pot.
O acusado, um antigo professor de matemática convertido ao cristianismo nos anos 90, será julgado por crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
Detido em 1999 pelas autoridades cambojanas, o "Duch" foi levado em 2007 a um tribunal especial em Phnom Penh patrocinado pela ONU. Ao término do julgamento, poderá ser condenado à prisão perpétua. O tribunal descartou a pena de morte.
A avaliação psicológica ordenada pelos juízes de instrução apontam "Duch" como "um homem meticuloso, consciente, atento aos detalhes e que se preocupa em ser bem considerado por seus superiores". Os especialistas concluíram que ele não sofre de nenhum patologia mental e possui uma grande inteligência.
"Sinto de verdade pelas matanças e o passado: eu queria ser um bom comunista e em meu trabalho não procurava nenhum prazer", teria declarado ele.
Outros quatro dirigentes do regime de Pol Pot, este último falecido em 1998, serão levados ao banco dos réus mais adiante. Eles têm entre 76 e 83 anos, e muitos cambojanos temem que morram antes que se faça justiça.
"A abertura oficial do primeiro julgamento será um dia sumamente importante para o Camboja", explicou Helen Jarvis, porta-voz do tribunal. "Será uma etapa essencial no caminho da justiça", acrescentou.
"Até que enfim vai começar o julgamento", exclamou a cambojana Sun Lon ao visitar Tuol Sleng, agora convertido em Museu do Genocídio. "Os cambojamos querem justiça, que esperamos há tempos", afirmou, expressando a opinião de seus conterrâneos.
O governo de Hun Sen, ele próprio um ex-khmer vermelho que se rebelou contra o movimento, quis controlar os preparativos judiciais por temer que este prejudique alguns membros do atual poder, segundo várias ONGs.
O tribunal foi criado em 2006 depois de uma década de negociações entre a ONUE e o governo cambojano de Hun Sen. O tribunal teve dificuldades financeiras, mas países como Japão, Alemanha e França fizeram doações. Os khmeres vermelhos foram expulsos do poder por uma invasão vietnamita.