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Entrevista - Bernardo Dal Seno: Criador fala sobre cadeira de rodas movida pela mente

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postado em 26/02/2009 07:48
Em entrevista ao Correio, o italiano Bernardo Dal Seno (foto), pesquisador do Departamento de Inteligência Artificial e Robótica do Politécnico de Milão, explicou como ele e sua equipe conceberam a primeira cadeira de rodas movida pela força do pensamento. De que modo os senhores tiveram a ideia de construir uma cadeira de rodas movimenta a pensamento? Como ela interpreta os estímulos cerebrais? ;Em nosso laboratório, nós temos trabalhado com robótica, análise de sinais e tecnologias de auxílio a pessoas incapacitadas por muitos anos. A cadeira de rodas conduzida pelos sinais cerebrais é a síntese de todo este trabalho. A parte que analisa os sinais do cérebro, a interface cérebro-computador (BCI, pela sigla em inglês), usa um potencial particular, chamado de P300. Trata-se de um sinal que ocorre quando um indivíduo detecta um alvo de estímulo ocasional em um conjunto de estímulos padrões. Tipicamente, a gravação de um sinal P300 apresenta pico positivo de cerca de 300ms depois do estímulo ocasional. Em uma BCI baseada em P300, o sistema apresenta ao usuário algumas escolhas, uma por vez; quando detecta um potencial P300, a escolha associada é selecionada. O usuário é normalmente pedido para contar o número de vezes que a escolha de interesse é apresentada, para que se mantenha concentrado na tarefa. Como o P300 é uma resposta inata, não requer treinamento por parte do usuário, mas a máquina precista de exemplos de gravações de eletroencefalograma de um indivíduo para aprender a reconhecer o potencial específico gerado pelo indivíduo. Como o paciente consegue dar comandos à cadeira, de forma a ser conduzido a um determinado lugar? O usuário dá apenas comandos de alto nível à cadeira de rodas. A cadeira é autônoma, isto é, pode navegar em ambientes parcialmente conhecidos. Apenas o destino desejado é que precisa ser informado. Dadas as limitações dos BCIs (ainda são lentas), uma cadeira de rodas requer um bom grau de autonomia, para ser operada por meio de uma BCI. A tela do computador interage com o usuário. Os possíveis destinos da cadeira são iluminados em uma sequência aleatória e o usuário tem de focar sua atenção para a opção desejada; a BCI reconhece um sinal P300 quando a opção de destino desejada é iluminada e, desse modo, seleciona o correto destino. Os destinos estão programados no software, e eles ser um ambiente em particular na casa ou uma posição específica (por exemplo, uma mesa sob a janela na sala de estar). Como se dá a captação do sinais cerebrais e sua interpretação pelo computador? Os sinais são obtidos de eletrodos colocados no couro cabeludo do usuário por meio de um sistema de eletroencefalograma padrão, que é conectado a um computador. Recursos otimizados por meio de um algoritmo genético são extraídos do sinal, e um classificador treinado nesses recursos detecta a presença de um P300. Um algoritmo genético encontra uma solução para um problema imitando o modo como a evolução natural funciona. Ele considera soluções potenciais para o problema, o avalia e combina partes de boas soluções para encontrar melhores candidatos para a solução. Nós desenvolvemos um algoritmo genético que encontra as características do sinal e o classificador ajuste o reconhecimento do P300 para um indivíduo em particular. O classificador é treinado em dados reais e aprende a descartar ruídos. Para termos uma estimativa mais robusta da intenção do usuário, a interface repete a estimulação (o destaque do destino na tela) algumas vezes, antes de tomar a decisão. Os estímulos são dados a uma taxa de quatro por segundo. Em cerca de 15 segundos a BCI corre em uma sequencia de 10 rodadas de estímulos e seleciona um destino. O senhor poderia explicar o funcionamento da cadeira de rodas? A cadeira de rodas é um aparelho elétrico no qual montamos sensores e computadores. Um sistema de localização faz uso de uma câmera de vídeo e de alguns marcadores colocados no teto do ambiente, e fornece uma estimativa robusta e acurada da posição atual. Um módulo de planejamento traça o caminho para o destino em um mapa onde todos os elementos estáticos (paredes, mesas e móveis) são indicados. A cadeira de rodas reconhece os obstáculos no ambiente por meio de sensores, então não há o risco de ele atropelar cadeiras e pessoas que não estejam no mapa. Como você pode imaginar, esse é o ponto mais crucial na navegação autônoma de um veículo, e ainda há alguns casos em que precisamos melhorar o sistema para ter um produto 100% seguro. A cadeira de rodas é completamente autônoma, e depende da BCI apenas para a seleção do destino. Se algo der errado com a classificação dos sinais do eletroencefalograma, o pior que pode ocorrer é a cadeira se mover rumo a um local indesejado (mas o usuário pode corrigir o erro fazendo um nova seleção). Que tipos de informação podem ser inseridas no software usado pela cadeira de rodas? A cadeira de rodas precisa de informação sobre a posição de todos os elementos estáticos, quais os possíveis destinos de interesse e a posição de marcadores no teto. Esse último pedaço de informação é extraído automaticamente de fotos do ambiente. O mapa também pode ser construído utilizando-se técnicas de auto-localização e mapeamento, algo que tem funcionado. Quando essa cadeira de rodas chegará aos mercados de todo o mundo? Nós pensamos que 10 anos pode ser uma boa estimativa para uma cadeira de rodas guiada por BCI. Mas estamos confiantes que seremos capazes de ter algo mais brevemente, um aparelho que não exija uma BCI. Para esses usuários, a cadeira de rodas não precisa ser completamente autônoma, mas pode ajudar o usuário com um joystick.

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