postado em 18/03/2009 07:44
SANKT POLTEN - O austríaco Josef Fritzl, acusado de sequestrar e violentar a filha Elisabeth durante 24 anos e da morte de um dos filhos do incesto, se declarou nesta quarta-feira (18/03) culpado de todas as acusações apresentadas contra ele, em uma surpreendente mudança de estratégia no terceiro dia de julgamento.
"Declaro-me culpado pelos crimes dos quais fui acusado", afirmou Fritzl, 73 anos, no início da sessão no tribunal de Sankt Polten, 60 km ao oeste de Viena. "Eu peço perdão", acrescentou com voz baixa, com uma expressão de quem estava em choque, quase às lagrimas.
Ao ser questionado pela presidente do tribunal, Andrea Humer, sobre o motivo que o levou a mudar de postura, respondeu apenas: "O depoimento gravado de minha filha".
Fritzl, chamado pela imprensa de ;monstro de Amstetten;, havia admitido na segunda-feira as acusações de incesto, estupro e sequestro, mas negado as de escravidão e assassinato. Esta última pode resultar em uma condenação a prisão perpétua, enquanto as demais são passíveis no máximo a 20 anos de prisão, já que a lei austríaca não contempla o acúmulo de penas.
No entanto, uma psiquiatra recomendou ao tribunal que Fritzl seja internado em uma instituição psiquiátrica, como pede a promotoria.
"Persiste o perigo de que cometa novamente atos graves se não receber tratamento", afirmou a psiquiatra Adelheid Kastner. "É necessário tratá-lo até que seja possível afirmar que não representa mais um perigo. Por consequência, se apresentam as condições para interná-lo em uma instituição psiquiátrica", completou.
A promotora Christiane Burkheiser pediu na ata de acusação apresentada na segunda-feira que Fritzl fosse internado durante um período de tempo indeterminado em um centro especializado.
Em um relatório elaborado antes do julgamento, de 130 páginas, e que teve alguns trechos vazados para a imprensa, Kastner concluiu que Fritzl foi responsável por seus atos durante os 24 anos de sequestro de Elisabeth. A moça foi abusada sexualmente de maneira sistemática pelo pai no porão da casa da família em Amstetten (130 km ao leste de Viena) e teve sete filhos com ele.
Porém, também destacou que o homem sofre de graves problemas de personalidade e desvios sexuais.
Josef Fritzl negava até agora a responsabilidade pela morte de um dos recém-nascidos em 1996 no porão da casa onde mantinha Elisabeth encarcerada.
Os 95 jornalistas credenciados foram autorizados a voltar à sala de audiências após dois dias de sessões a portas fechadas.
O jornal austríaco Kurier informa na edição desta quarta-feira que Elisabeth assistiu na terça-feira a parte do julgamento contra o pai. A vítima, que hoje tem 42 anos, não participou nos debates e teria assistido o próprio depoimento gravado em vídeo na sala de audiências.
Segundo o jornal, Elisabeth queria "tirar impressões" e observar a reação do pai para incluir as mesmas em um livro que planeja escrever sobre seu drama.
O advogado de Fritzl, Rudolf Mayer, não confirmou nem negou que ela estava na corte, mas aumentou as especulações de que Elisabeth teve um impacto na decisão do cliente de mudar a alegação. "Se algumas vítimas estiveram presentem ontem, isto com certeza teve um forte efeito dominó".
Elisabeth Fritzl e os filhos se refugiram em uma clínica durante o julgamento para evitar a imprensa. As autoridades pretendem dar a chance de um novo começo às vítimas e com novas identidades.
A promotoria acusa Fritzl pelo assassinato por negligência de um dos filhos pouco depois do nascimento no porão. Ele teria queimado o corpo do bebê em uma caldeira.
O ;monstro de Amstetten; admitiu que estava presente no nascimento e que o bebê tinha problemas respiratórios. "Não sei porque eu não ajudei. Eu deveria ter reparado que o bebê não estava bem. Eu só esperava que ele sobrevivesse", declarou no tribunal.
A psquiatra Kastner afirmou na corte que Fritzl tem a impressão de que "nasceu para estuprar" e reforçou que ele deve ser tratado.
"Na superfície, tudo funciona aparentemente bem. Mas no fundo, as necessidades não preenchidas que ele sente estão a ponto de explodir", afirmou. "Ele sabe - ele diz para si mesmo - que tem um lado maligno".
"Você tem que imaginar uma avalanche. Primeiro é bem pequena, mas a fantasia então cresce. E sempre com o conhecimento: eu não deveria fazer isso. Mas seria tão bom, seria tão bacana", explicou a psiquiatra
Fritzl contou a Kastner que entre os sete filhos legítimos escolheu Elisabeth como vítima por considerar que "ela era a mais parecida com ele". "Ela era rebelde como eu, forte como eu", disse. Ele declarou ainda que "quanto mais forte o oponente, maior a vitória".
Durante o julgamento, os jurados ouviram como Fritzl usou a filha como um "brinquedo" durante o cativeiro em uma cela sem água quente, aquecimento, ventilação ou luz natural.
O advogado de Fritzl insistiu que o cliente queria apenas uma segunda família e que tinha preocupação genuína com a filha e as crianças.
Especialistas técnicos também descreveram o local em que Fritzl manteve as vítimas presas.
O criminoso chegou a afirmar que um sistema de tempo garantia que as três portas com controle eletrônico se abririam automaticamente para liberar os prisioneiros se algo acontecesse com ele. Mas os especialistas não encontraram o dispositivo ao examinar as portas.
Três crianças foram criadas com Fritzl e a esposa Rosemarie, que acreditou que elas foram abandonadas na porta de casa pela filha ;rebelde fugitiva;, e três moravam ao lado de Elisabeth e nunca haviam presenciado a luz do sol até a libertação, em abril do ano passado.
A mudança de estratégia do acusado encurtou os debates e a audiência desta quarta-feira terminou ao fim de apenas uma hora e meia.
Os três juízes se retiraram para preparar a lista de perguntas que apresentarão na manhã de quinta-feira ao júri. O veredicto é esperado, a princípio, para a tarde de quinta-feira.