postado em 24/03/2009 08:00
O escocês Marc Turner, diretor do Serviço Nacional de Transfusão de Sangue da Escócia, pretende criar sangue sintético a partir de células-tronco embrionárias. A façanha resolveria o problema da falta de estoque nos hemocentros e garantiria suprimentos sanguíneos livres de vírus, como o HIV (causador da Aids) e da hepatite. Em entrevista ao Correio, por telefone, Turner falou sobre a inovadora pesquisa.
Como o senhor pretende produzir sangue sintético a partir de células-tronco embrionárias? De que modo se daria essa "fabricação sanguínea"?
As células-tronco embrionárias têm uma habilidade muito grande de se diferenciar em vários tipos de células e tecidos do corpo. É óbvio que isso ocorre sob determinadas circunstâncias, em que podemos dirigir o processo de forma que possam obter tipos específicos de células, de modo controlado. Temos trabalhado nos últimos quatro anos para termos certeza de que teremos os glóbulos vermelhos.
Mas as células-tronco seriam fontes inesgotáveis de sangue?
O que sabemos é que as células-tronco têm, por princípio, a capacidade de se reproduzir indefinidamente. Podemos produzir um grande número de células-tronco hematopoiéticas e também de glóbulos vermelhos.
Para se obter sangue doador universal (O negativo), será preciso derivar as células-tronco embrionárias também de pacientes com sangue O negativo?
Não necessariamente apenas sangue O negativo. Nós ainda estamos nas primeiras fases do trabalho clínico. Mas seria mais lucrativo usar linhagens de células-tronco embrionárias com fator sanguíneo O negativo, pois permitiria, a longo prazo, que cerca de 90% a 95% dos pacientes possam ser tratados com esses tipos específicos de glóbulos vermelhos.
Quando será possível obter um suprimento capaz de ser usado para transfusões em seres humanos?
Temos trabalhado nesses aspectos pelos últimos quatro anos, em cooperação com colegas em várias partes do mundo. Agora estamos nos movendo para a aplicação clínica. Nós devemos gastar mais três anos na tradução desses projetos de pesquisa na tentativa de assegurar a qualidade e a segurança desses glóbulos vermelhos. Esperamos que em três anos seja possível determinarmos a recuperação e a sobrevivência dos glóbulos vermelhos em voluntários humanos. Nos casos de transfusões, esperamos começar os testes clínicos em 2013 ou 2014, antes que possamos iniciar as s terapias clínicas rotineiras. Acreditamos que em 10 anos poderemos obter a total prática clínica.
Quais as vantagens dessa técnica, sob seu ponto de vista?
Bem%u2026 Como sabemos, muitos países sofrem com a falta de estoque em seus bancos de sangue. Além da incompatibilidade entre doador e paciente, há problemas com a transmissão de infecções por meio da transfusão sanguínea em países com grande disseminação do HIV. Muitos países não têm infraestrutura para manter seus suprimentos de sangue com segurança e tecnologia. Eu creio que a longo prazo a cultura de glóbulos vermelhos pode resolver boa parte desses problemas e garantir o suprimento.
Muitos grupos éticos se opõem à pesquisa por usar embrião. O que o senhor diria a eles?
Eu creio que há claramente uma diversidade de opiniões sobre a ética em torno da derivação e do uso clínico de células-tronco embrionárias. Eu respeito essa opiniões como alternativas de julgamento. Os embriões usados serão gerados durante fertilização in vitro em aplicações clínicas e seriam destruídos, de qualquer modo.