postado em 28/03/2009 08:27
O mais duro discurso do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, soou como uma mudança de rumo da política externa norte-americana. Também representou um aviso direto à rede terrorista Al-Qaeda, uma crítica contundente ao governo do presidente afegão, Hamid Karzai, e uma cobrança de ajuda ao regime paquistanês. Ao anunciar o envio de mais 4 mil soldados norte-americanos ao Afeganistão ; as tropas teriam a missão de treinar o Exército e a polícia ;, Obama foi incisivo. ;Nós temos uma meta clara e concentrada: transtornar, desmantelar e derrotar a Al-Qaeda no Paquistão e no Afeganistão, e prevenir seu retorno a esses países no futuro.; Os EUA têm 38 mil soldados no país, outros 17 mil já embarcariam à região neste ano.Cumprir esse objetivo poderá ser mais difícil do que se imagina. Horas depois do pronunciamento de Obama, o chefe de Estado-Maior do Exército norte-americano, Michael Mullen, reconheceu uma aliança espúria entre os militantes islâmicos e Islamabad. ;Alguns membros dos serviços de inteligência paquistaneses apoiam os talibãs e a Al-Qaeda refugiados na fronteira com o Afeganistão e isso é uma das coisas que têm de mudar;, afirmou. Foi a primeira vez que os EUA apontaram o dedo para um aliado e o acusaram de fomentar o terrorismo.
Obama se referiu à situação nos dois países como ;caos crescente;. Lembrou que a insurgência controla diversas partes do Afeganistão e do Paquistão, pediu à Organização do Tratado do Atlântico Norte que também reforcem suas tropas e fez um alerta às nações aliadas. ;Múltiplos dados de inteligência têm advertido que a Al-Qaeda está ativamente planejando ataques no território dos EUA a partir de seu refúgio seguro no Paquistão (;) A segurança da população mundial está em xeque;, declarou. O presidente também mandou um recado claro à liderança de Cabul: ;Não podemos ficar cegos diante da corrupção que leva os afegãos a perderem a fé em seus governantes;. Ao Paquistão, Obama lembrou que a Al-Qaeda ;matou milhares de cidadãos, assassinou a ex-primeira-ministra Benazir Bhutto e bombardeou mesquitas;.
A estratégia revelada por Obama recebeu elogios por parte de analistas, apesar de aumentar os gastos americanos com a manutenção das tropas no Afeganistão de US$ 2 bilhões para US$ 3,2 bilhões por mês. ;A decisão da Casa Branca é uma manobra excepcional;, disse ao Correio, por telefone, de Cingapura, o cingalês Rohan Kunaratna, autor de Por dentro da Al-Qaeda: a rede global de terror. O escritor que entrevistou seguidores de Bin Laden assegurou que os soldados afegãos podem operar de modo mais eficiente que os estrangeiros, por terem domínio da região.
Tarefa difícil
A captura do líder da Al-Qaeda seria uma tarefa mais complicada. Segundo Gunaratna, Osama bin Laden está no lado paquistanês da fronteira. ;É importante que os EUA tenham a ajuda das tropas do Paquistão para matá-lo. O centro de gravidade da rede terrorista é sua liderança. Por isso, a reação de Obama teria resultado limitado, já que o Afeganistão é apenas parte dos esforços para deter a organização extremista;, explicou. Por sua vez, o paquistanês Rifaat Hussain, professor da Universidade Quaid-i-Azam (em Islamabad), defende que partidos religiosos de seu país rotulem a Al-Qaeda de anti-islâmica. Ele admitiu que talibãs, apoiados pela Direção de Inteligência Interserviços (ISI) ; serviço secreto do Paquistão ; têm ligações indiretas com Bin Laden. Em relação à atuação das tropas adicionais no Afeganistão, Hussain crê que os soldados terão de obter a simpatia de elementos moderados do Talibã, da etnia pashtun.
Pela internet, dois afegãos admitiram ao Correio que veem o risco de mais violência. Morador de Cabul, o engenheiro Ahmad Fawad, de 28 anos, considerou que o reforço militar será bom para o Exército e a polícia local. ;Vivi um funeral de cinco anos imposto pela milícia. Os talibãs produzem violência porque recebem ajuda do Paquistão, matam médicos, engenheiros e funcionários do governo;, desabafou. Gerente de uma empresa de telefonia em Mazar-i-Sharif, ao norte, Sayed Walid Mir, de 39, afirmou não esperar ajuda do Paquistão para capturar Bin Laden. ;Toda a ajuda recebida dos EUA desde 2001 foi gasta em armamentos para confrontar a Índia;, explicou. ;Os EUA deviam ter feito esse projeto sete anos atrás e, agora, estão no caminho certo.;