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Padres abusaram de 2 mil menores

Relatório sobre assédio e violência sexual contra menores em instituições católicas choca o país e ;envergonha profundamente; os líderes da Igreja. Culpados foram transferidos sem sofrer punição

postado em 21/05/2009 08:16
Mais de 2 mil crianças sofreram abuso sexual constante em orfanatos, abrigos, escolas e reformatórios irlandeses dirigidos pela Igreja Católica, revelou uma investigação publicada hoje em Dublin. Segundo o relatório, elaborado por uma comissão independente que ouviu depoimentos de mais de mil pessoas, durante 10 anos, os episódios ocorreram entre 1930 e 1990 e incluíram também violência física e intimidações. De acordo com a Comissão de Inquérito sobre Abuso Infantil, os líderes da Igreja sabiam de tudo que ocorria nas instituições, que abrigaram aproximadamente 35 mil crianças. O informe ressalta que ;as autoridades religiosas sabiam que os abusos sexuais eram um problema persistente em organizações religiosas masculinas;. O premiê irlandês, Bertie Ahern, foi o idealizador da comissão, criada após uma série de televisão divulgar as denúncias. A jornalista Mary Raftery, uma das responsáveis pelos programas, contou à emissora britânica BBC que as agressões, cometidas por sacerdotes e freiras, eram ;profundamente chocantes;. Ela contou que as crianças eram levadas ao que se convencionou chamar de ;casas de terror;, de onde só saíam aos 16 anos. ;Elas saíam de lá completamente perturbadas, e muitas deixaram o país em seguida;, explica. Depois de apresentados os resultados da pesquisa, o premiê pediu desculpas, em nome do Estado, a todos que sofreram abuso na infância. Desde 2000, o governo pagou um bilhão de euros em indenizações a 12,5 mil vítimas, que agora têm entre 50 e 70 anos. Em depoimentos, quem sofreu as violências na época contou que as crianças apanhavam com tiras de couro por conversar durante as refeições ou por escrever com a mão esquerda. O documento alega que ;as escolas eram administradas de forma severa, impondo uma disciplina opressiva, e não razoável;. Além disso, as crianças eram mantidas em um clima de medo, por causa das ;punições excessivas e arbitrárias que permeavam a maioria das instituições;. Dentre as 21 formas propostas para que o governo possa se redimir pelos danos causados estão as de construir um memorial, fornecer acompanhamento psicológico aos que precisarem e melhorar os serviços de proteção à criança. Vergonha O cardeal irlandês Sean Brady confessou estar ;profundamente envergonhado; com a publicação do relatório. ;Lamento e estou profundamente envergonhado de que crianças tenham sofrido dessa forma tão terrível nessas instituições;, disse. Para o mais alto dirigente da Igreja Católica do país, o documento revela ;os grandes danos causados a meninos mais vulneráveis de nossa sociedade;. Ele considerou o relatório um ;catálogo vergonhoso de crueldade, abandono, abusos físicos, sexuais e emocionais;. A Igreja tentou diversas vezes impedir a publicação do estudo, que fala somente de instituições que já foram fechadas. O juiz Sean Ryan, presidente da comissão, contou que, quando era feita uma denúncia de abuso, os acusados eram transferidos para outros lugares. No próximo mês será divulgado outro relatório, sobre supostos abusos cometidos por padres entre 1975 e 2004 em paróquias próximas a Dublin, capital da Irlanda. Processos milionários O ex-cardeal de Boston Bernard Law, o mais alto dignitário da Igreja Católica nos Estados Unidos, renunciou ao cargo em 2002 por estar envolvido em um escândalo de abuso sexual de crianças. Ele teria acobertado padres acusados de pedofilia, mandando-os para outras dioceses ou paróquias sem que os fiéis destas fossem informados a respeito do problema. Na época em que o cardeal renunciou, havia mais de 450 processos de abuso sexual contra sacerdotes sob sua autoridade, e os pedidos de indenização por parte das vítimas somavam mais de US$100 milhões. Em algumas denúncias, constava que determinados padres abusaram sexualmente de coroinhas, além de outros que ofereciam cocaína em troca de ;serviços sexuais; e, ainda, alguns que violentavam noviças. Ao todo, 58 sacerdotes assinaram uma carta solicitando o afastamento do cardeal de Boston. Outro caso emblemático de escândalos ligando padres da Igreja Católica a crimes de pedofilia foi o do ex-sacerdote John Geoghan, também da arquidiocese de Boston. Geoghan foi preso em 2002 por molestar um garoto. Já havia outras denúncias contra o sacerdote, mas ele era trocado de diocese cada vez que ameaçava surgir um escândalo. Após a prisão, outras denúncias surgiram e a Igreja Católica, então, ofereceu-se a pagar uma indenização de US$ 65 milhões para os jovens que processaram o padre. No ano seguinte, Geoghan foi encontrado morto na prisão. Apenas no ano passado, a Igreja desembolsou mais de US$ 430 milhões para indenizar vítimas de casos de pedofilia envolvendo clérigos.

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