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Tropas americanas se retiram de cidades iraquianas

Depois de mais de seis anos, tropas americanas se retiram das cidades e passam às forças de segurança locais a missão de manter a ordem pública. Data é marcada por atentado no norte do país

postado em 01/07/2009 08:29
A partir de hoje, o Exército e as forças policiais iraquianas serão os únicos responsáveis por conter a violência nas cidades do país: as tropas americanas, que mantiveram a ordem desde a invasão para depor Saddam Hussein, em 2003, se retiram das áreas urbanas. Seja na capital, Bagdá, onde a violência voltou a matar dezenas de cidadãos da maioria religiosa xiita, ou na complicada região norte, que registrou pelo menos 100 mortes em atentados nos últimos 10 dias, militares e policiais iraquianos sentirão uma amostra do fardo que assumirão plenamente dentro de 18 meses. Apesar das declarações oficiais de otimismo, os dois lados sabem o que o audacioso movimento de retirada pode representar. Nas ruas, a maioria dos iraquianos comemorou a conquista, marcada ontem com um novo feriado - o Dia da Soberania Nacional. [SAIBAMAIS]As tropas estrangeiras, no entanto, não deixarão o país da noite para o dia. Até agosto de 2010, os 131 mil militares ficarão na retaguarda, cuidando das fronteiras iraquianas e treinando as tropas locais. "Do ponto de vista militar, essa é a hora para sairmos das cidades. Ainda daremos treinamento e assessoria às forças iraquianas. E eles estão preparados para assumir", garantiu o general Ray Odierno, principal comandante americano no Iraque, em entrevista à rede CNN. As operações no interior do país e nos "cinturões" ao redor das principais cidades serão ainda conduzidas pelos seus efetivos. Para o general Mahmoud Muhsen, comandante que atua com a Primeira Divisão da Força Nacional Iraquiana, o Exército e a polícia nacionais não estão preparados para a "nova etapa". Muhsen acredita que, sem as tropas americanas, o país pode assistir a um retorno da violência sectária (entre xiitas e a minoria sunita) e étnica (dos sunitas árabes contra a minoria étnica curda), além de possíveis problemas nas fronteiras. "Estão retirando todo o equipamento que os americanos disponibilizaram. E com a agenda dos países vizinhos, essa é a receita para um desastre", alerta o comandante iraquiano. Larry Diamond, pesquisador da Hoover Institution, da Universidade de Stanford, admite que certamente as forças de segurança iraquianas "estão mais fortes e prontas do que há dois ou três anos", mas pondera que o seu desempenho daqui em diante "dependerá da intensidade e da quantidade de desafios" que venham a enfrentar. "Os próprios comandantes americanos, entre eles, têm demonstrado preocupação. Mas é muito difícil prever: o que sabemos é que os iraquianos ainda têm pouca ou nenhuma capacidade em termos de inteligência, suporte aéreo, suporte médico", analisa. Efetivo De acordo com o governo norte-americano, as forças de segurança iraquianas contam atualmente com cerca de 618 mil combatentes, 270 mil no Exército e 348 mil na polícia. Desse total, grande parte já está nas ruas das principais cidades desde a última segunda-feira. Em Bagdá, o efetivo foi reforçado em 120 mil soldados. Diamond, porém, acredita que a quantidade de militares na ativa deve ser otimizada diante da instabilidade persistente. "A situação pode muito bem piorar. Essa é a razão pela qual o governo iraquiano deve se concentrar urgentemente sobre os desafios de reconciliação política, incluindo acordos para compartilhar o poder (entre os diferentes grupos) a longo prazo", afirma. Em entrevista à CNN, o general Odierno reafirmou que, se as forças nacionais precisarem de ajuda nos próximos meses, a coalizão internacional está preparada para socorrê-las, em uma resposta coordenada e nos moldes do acordo estabelecido com o governo iraquiano. Para o especialista da Hoover Institution, essa "retaguarda" é uma boa solução de curto prazo. "Isso significaria que os EUA não vão agir por conta própria, mas apenas após consulta e aprovação do governo iraquiano", avalia. Carro-bomba mata 35 Da redação Na véspera de as tropas norte-americanas deixarem as cidades iraquianas, um carro-bomba explodiu na cidade de Kirkuk, 250km ao norte de Bagdá, matando 35 pessoas e ferindo cerca de 100. A explosão ocorreu perto de um mercado em uma área de maioria curda. Várias lojas e bancas de vendedores ambulantes ficaram destruídas. A região foi cercada pelas forças de segurança, enquanto equipes de resgate tratavam de encaminhar as vítimas do ataque aos hospitais. De acordo com o general de polícia Sarhat Qadir, as tensões étnicas em Kirkuk são frequentes - na cidade há comunidades compostas por curdos, árabes e turcomanos. Os curdos, apesar de integrarem uma minoria étnica, predominam no norte do país e governam na prática a região desde a invasão norte-americana, em 2003, e a queda de Saddam Hussein, que os perseguiu durante seus 25 anos de ditadura. A cidade, que é o centro da indústria petrolífera iraquiana, também é alvo de ataques de terroristas sunitas, principalmente da rede Al-Qaeda, e milícias xiitas. Nas últimas duas semanas, o Iraque passa por uma onda de violência que já causou a morte de mais de 250 pessoas. Os principais alvos dos ataques até agora foram áreas xiitas e curdas. Somente em Kirkuk, quase 90 pessoas foram mortas em atentados desde maio. No último dia 20, um caminhão-bomba explodiu em um mercado na zona onde vive a população turcomana, deixando pelo menos 73 mortos e 180 feridos. Foi o pior atentado no Iraque em mais de um ano. Em maio, outros dois ataques vitimaram 14 pessoas. Já na última segunda-feira, em Bagdá, quatro soldados norte-americanos foram mortos em ações de combate.

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