postado em 30/07/2009 07:15
As últimas semanas do embaixador dos Estados Unidos, Clifford Sobel, no posto em Brasília têm sido bastante concorridas. Às vésperas de deixar a representação no Brasil, país pelo qual se declara apaixonado, ele tenta dividir o tempo entre os encontros de despedida - um deles foi com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na última segunda-feira -, a mudança (sua sala já está lotada de caixas com seus pertences) e a ainda movimentada agenda de representante da diplomacia americana. Entre os compromissos que exigem sua total atenção na reta final, estão as visitas do presidente do Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos (Ex-Im Bank), Fred Hochberg, que virá negociar créditos a empresas americanas que desejam trabalhar com serviços de exploração das reservas de petróleo do Brasil, e do assessor de segurança nacional de Barack Obama, general James Jones.Em meio a esse turbilhão, Sobel recebeu o Correio para fazer um balanço das relações bilaterais nos últimos três anos, período em que esteve à frente da embaixada em Brasília. "Nós tiramos as barreiras entre os EUA e o Brasil. E temos mantido uma relação muito próxima, que pôde ser vista, por exemplo, no Fórum de CEOs Brasil-EUA, que teve a presença do presidente Obama e de outros líderes, há uma semana em Washington", afirmou.
Empresário do ramo de telefonia e internet, Sobel manteve o enfoque de sua atuação no comércio bilateral, que cresceu 35% entre 2006, quando ele assumiu o cargo, e 2008. Ofereceu grande apoio às companhias americanas instaladas no Brasil e esteve em contato direto com empresários brasileiros. No meio político, também fez amigos importantes, como o ministro da Defesa, Nelson Jobim, de quem nunca deixou passar despercebidas as qualidades do caça F/A-18 Super Hornet da Boeing oferecido na concorrência F-X2 da Força Aérea Brasileira.
Quanto aos planos futuros, o embaixador prefere a discrição. Depois que deixar o posto, em meados de agosto, pretende voltar aos Estados Unidos por um tempo, mas com um retorno garantido ao Brasil para "ficar próximo dos amigos" que fez aqui. Diante da especulação de que abrirá uma consultoria em São Paulo, ele despista: "Considero o Brasil um grande país para se investir, mas vamos ver o que futuro nos reserva".
Foram três anos representando os EUA no Brasil. Nesse período, como evoluíram as relações entre os dois países?
O foco dessa aproximação pode remontar a março de 2007, quando os presidentes Lula e George W. Bush se encontraram por duas vezes no mesmo mês ; uma em Camp David e outra em São Paulo. Ou então ao acordo de biocombustíveis, onde os dois países, como parceiros equivalentes, se uniram em torno de um documento com uma meta muito simples: fazer dos biocombustíveis uma nova fonte de energia por meio de uma cooperação real. E nós conseguimos colocar isso em prática.
Quais foram os avanços conseguidos pela sua gestão à frente da diplomacia americana no Brasil?
Nós tiramos as barreiras entre os EUA e o Brasil. Colocamos um adido de comércio em Recife, vamos abrir o primeiro escritório da USTDA (Agência Americana para o Comércio e o Desenvolvimento) no Brasil ; o quarto no mundo (depois de China, Índia e África do Sul) ;, por causa da importância do país. Temos mantido uma relação muito próxima, que pôde ser vista, por exemplo, no Fórum de CEOs Brasil-EUA, que teve a presença do presidente Obama e de outros líderes, há uma semana em Washington. Mas, basicamente, o que tem acontecido, é que o Brasil hoje faz parte do novo mundo ; é um país de gente que arrisca, de empreendedores. E essa própria cultura do país o leva a ser parceiro natural dos Estados Unidos. Acredito que vamos ver, cada vez mais, um crescimento nas relações entre os dois países.
Então a aproximação entre os dois países se explica por mudanças no próprio Brasil?
Esse é um momento diferente para o seu país. O Brasil, em vários aspectos, é um país diferente, em comparação com os últimos três anos ; sua confiança, seu otimismo, o fato de o crescimento agora estar aqui. Alguém disse, acertadamente, que é preciso ser um parceiro equivalente para ser um parceiro e, cada vez mais, o Brasil tem se sentido confortável com essa posição de ser um parceiro equivalente aos Estados Unidos. Tive a sorte de visitar os estados brasileiros e ver que os governadores, de várias maneiras, se esforçaram para eliminar barreiras às oportunidades de emprego no futuro entre os dois países. Então houve uma mudança. Nessa parceria entra, inclusive, o programa F-X2 (no qual a empresa americana Boeing é uma das concorrentes para a venda de 36 caças ao Brasil), que pode unir as duas nações em direção o futuro. Não é só o investimento de US$ 3 bilhões ou US$ 4 bilhões, mas a parceria que a Boeing vai criar com mais de 20 empresas brasileiras e a parceria estratégica com a Embraer. Podem ser criadas ainda parcerias com o Supertucano, ou com um avião-tanque, por exemplo. Certamente vamos ver muito mais desses programas de cooperação criando empregos e oportunidades aqui.
O senhor considera que o diálogo avançou na questão dos biocombustíveis?
Não há dúvidas de que os biocombustíveis foram um importante ponto de partida para a aproximação. Mas a questão principal é criar um mercado (para os biocombustíveis), e nenhum país pode fazer isso sozinho. O Brasil e os EUA já estão nisso com países tanto na América Central como na América do Sul e na África. Quando o ministro de Energia, Edison Lobão, esteve em Washington, na semana passada, ele falou ainda sobre parcerias em todas as fontes renováveis ; solar, eólica ;, e nós buscamos saber como podemos apoiar mais o desenvolvimento de oportunidades em relação às reservas de petróleo do pré-sal. Nesta semana, inclusive, o presidente do Ex-Im Bank (Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos) virá ao Brasil para falar sobre bilhões de dólares em créditos que estarão disponíveis a empresas americanas que poderão apoiar serviços de exploração das reservas de petróleo do Brasil.
O senhor se reuniu no início da semana com o presidente Lula. O que ouviu do presidente às vésperas de deixar o seu posto?
Considerei o encontro um reconhecimento não do meu trabalho como embaixador, mas da proximidade cada vez maior entre os dois países. Nós conversamos sobre a relação próxima entre os dois presidentes ; Lula falou um pouco sobre o presidente Bush, mas focou principalmente no presidente Obama, e na esperança que ele tem de que Obama consiga criar essas novas pontes que tem tentado construir. Esse, de fato, é um momento histórico. Estamos em um ponto de construir relações ainda mais próximas, e eu acredito que isso será conduzido pelos próprios presidentes Lula e Obama.
Como o senhor avalia os seis primeiros meses do governo Obama?
Esses seis meses foram afirmativos e eu tive a sorte de ver essa transição ocorrer. Só nesses seis meses, tivemos a Cúpula das Américas, onde as democracias se reuniram e chegaram a um consenso não sobre como o Norte e o Sul devem lidar com as questões, mas como as Américas vão lidar com os assuntos que nos confrontam. Tivemos ainda a Cúpula da OEA, na qual as democracias chegaram a um consenso para reverter a suspensão a Cuba e oferecer um caminho para que o país se reintegre à OEA, baseado na democracia e nos direitos humanos. Quem pensaria nisso há um ano ou mesmo há seis meses? Não conseguimos chegar a esse consenso em 50 anos.
Dentro do país, no entanto, Obama tem enfrentado uma queda na popularidade, que já é menor do que a de Bush nos seus seis primeiros meses. A que se deve essa redução?
A popularidade de um presidente muda a cada mês, a cada semana. Hoje, existem vários debates políticos importantes no país, sobre temas como a reforma no sistema de saúde, e, durante esse tipo de discussão, sempre vai haver diferenças de opinião. Mas se você for ver as últimas estatísticas do Pew Research Center, que mostra como Obama ; e os EUA, obviamente ; tem sido visto em todo o mundo, é gritante como a opinião das pessoas mudou. Obama é uma cara nova, e tem dado um exemplo inspirador de como é possível atingir os mais altos níveis de liderança em um país. Ele possui uma grande história, que foi acompanhada pelo Brasil e por todo o mundo.
O que podemos esperar da relação entre os dois países durante a gestão de Obama?
Nenhum país pode enfrentar sozinho os problemas que confrontam os EUA, e Obama está procurando países como o Brasil para contribuir. Quando enumeramos os principais temas que nos preocupam, como clima, alimentos, energia, crise econômica, vemos que o Brasil tem que fazer parte da solução. O país tem tomado a liderança ; e deve continuar ; para lidar com esses temas. O Brasil hoje tem uma visão para o mundo, com as viagens de Lula, novas embaixadas. O país tem mudado suas instituições, aberto cada vez seu mercado, procurado ajudar suas empresas multinacionais. Tudo isso vai contribuir para que a economia brasileira continue a crescer.
Como Washington vê a proximidade da relação do Brasil com o Irã?
O Conselho de Segurança tem constantemente se pronunciado sobre o Irã e estamos todos preocupados com o programa nuclear desenvolvido por eles. Nós não queremos recompensar um país que não segue as resoluções do Conselho de Segurança. Mas cada país tem a sua maneira de pensar e de agir, e o Brasil também tem a sua. Acredito que estamos todos preocupados com as demonstrações nas ruas do Irã por conta das eleições, e queremos que a liberdade de expressão seja garantida aos iranianos.
E a visita do presidente Ahmadinejad ao Brasil?
O presidente Obama mesmo disse que o Brasil pode ser um exemplo para países como o Irã. Então esperamos que o Brasil desempenhe um papel muito positivo a fim de trazer o Irã para o cumprimento das resoluções do Conselho de Segurança.
Quais são os seus planos para o futuro?
Ainda não consegui parar para me organizar por estar envolvido em novos projetos, como o fórum de CEOs Brasil-EUA e a visita do ministro de Energia a Washington. Nesta semana, teremos a visita do presidente do nosso Eximbank. Na próxima semana, virá o assessor de segurança nacional (general James Jones), e que será, provavelmente, uma visita histórica. Então estou completamente atarefado. Mas quando esses compromissos passarem, sei que minha esposa e eu, que adoramos o Brasil, as pessoas do Brasil, vamos tentar ficar próximos dos amigos que fizemos aqui.
O senhor, como um empresário, pretende ficar no Brasil, investir aqui?
Eu prometi a Barbara que estaríamos presentes no nascimento de nosso segundo neto, então vamos para casa (nos Estados Unidos). Mas pretendemos voltar depois, passar um tempo no Brasil e, então, o tempo decidirá. Considero o Brasil um grande país para se investir, mas vamos ver o futuro nos reserva.