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Presidente colombiano se reúne com Lula para defender o acordo militar com EUA

postado em 06/08/2009 09:02
É do presidente colombiano, Álvaro Uribe, que chega hoje a Brasília, que o governo brasileiro espera receber detalhes mais substanciais sobre as bases militares que serão usadas pelos Estados Unidos em seu território. Até agora, as autoridades norte-americanas ouvidas, em especial o assessor de Segurança Nacional de Barack Obama, general James Jones, afirmaram que seu efetivo no país vizinho continuará o mesmo e que as instalações são e continuarão sendo, de fato, colombianas. O governo brasileiro, no entanto, não parece convencido. O chanceler Celso Amorim sugeriu ontem a Jones que, se o objetivo é mesmo apenas "conter o terrorismo" (a guerrilha colombiana), os dois governo deem garantias de que os aviões estacionados no país não terão outra missão. [SAIBAMAIS]A principal preocupação está no fato de que, a partir da base aérea de Palanquero (veja o mapa), as aeronaves americanas teriam autonomia para sobrevoar quase metade da América do Sul sem precisar de reabastecimento. As informações estão explícitas em um relatório da Força Aérea dos EUA sobre a estratégia global de atuação militar (veja ao lado). Diante do questionamento de Amorim, o general americano afirmou que a alta autonomia de voo das aeronaves que atuarão na Colômbia se explica pela geografia. "Como vocês sabem, vocês estão a uma longa distância dos EUA, e os aviões que voam para cá precisam ter longo alcance. Serão essencialmente aviões de carga, que carregam os nossos equipamentos e o nosso pessoal", disse Jones após o encontro. Segundo o general, outras aeronaves que serão usadas são os "tradicionais P-3 da Marinha", projetados para conduzir patrulhas marítimas. Jones fez questão de ressaltar que os EUA "respeitam a soberania de cada país" e que o governo Obama está tentando se relacionar de uma forma "mais aberta e transparente" com a região. "Acho que nessa questão (das bases) poderíamos ter feito um trabalho um pouco melhor, e transmitiremos isso a Washington. Mas se houve algum erro, não foi nada intencional", defendeu-se. O general garantiu que Washington enviará uma equipe militar "aos países interessados" para explicar melhor o acordo. "Não há mágica, não há segredos escondidos debaixo da mesa", garantiu. O analista John Lindsay-Poland, da ONG norte-americana Fellowship for Reconciliation, no entanto, destacou ao Correio que "documentos americanos, negociadores colombianos e um rascunho do acordo que vazou para a revista (colombiana) Cambio coincidem em afirmar que as missões militares dos EUA na Colômbia não se limitarão a operações antidrogas". Unasul Além de ouvir as explicações de Uribe, Lula tentará convencer o colega a participar da cúpula da Unasul, a ser realizada em Quito, na próxima segunda-feira. Desde terça-feira, o presidente colombiano passou pelo Peru, Bolívia, Chile, Paraguai e Argentina. A maioria dos chefes de Estado ressaltou a autonomia do país para realizar acordos bilaterais, mas apreciou a disposição do visitante em dar explicações. O mais receptivo foi o peruano Alan García, primeiro a receber Uribe: "Acredito que a história vá reconhecer, muito em breve, o quanto foi feito em favor não só da Colômbia, mas do modelo democrático do nosso continente, pelo presidente Uribe e por seu governo". O boliviano Evo Morales, porém, aproveitou para reafirmar que forças militares americanas "não são bem-vindas". "Permitir bases militares na América Latina é uma agressão não só aos governos como às democracias da região. Vamos defender a soberania da América Latina", afirmou. Oferta de ocasião O general James Jones entregou ao chanceler Celso Amorim uma carta da secretária de Estado Hillary Clinton, que garante "100% de transferência tecnológica" na oferta dos caças F-18 Super Hornet, da Boeing, concorrente no programa F-X2 da Força Aérea Brasileira. Acompanhado pelo subsecretário de Defesa Ashton Carter e pela subsecretária de Estado Ellen Tauscher, Jones encontrou-se ainda com o ministro de Defesa, Nelson Jobim, e com o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito. "A transferência de tecnologia (que oferecemos) é algo que nunca fizemos antes", garantiu Tauscher à imprensa. Chávez vê perigo de guerra O acordo militar em negociação entre a Colômbia e os Estados Unidos levou o presidente venezuelano, Hugo Chávez, a equiparar Barack Obama a George W. Bush - com cujo governo a Venezuela suspendeu as relações diplomáticas. "A política de agressões na América Latina é a mesma", fulminou. "Essas bases podem ser o início de uma guerra na América do Sul". Chávez convocou a imprensa para apresentar sua versão sobre as armas antitanque suecas apreendidas pelo exército colombiano em um acampamento da guerrilha, e que tinham adquiridas legalmente pelo governo de Caracas há cerca de 20 anos. Exibindo exemplares das bazucas, ele sustentou que as armas teriam sido roubadas de uma base em 1995 - três anos antes de ele ter sido eleito presidente. Colocado sob suspeita de suprir as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Chávez chamou de volta seu embaixador em Bogotá e congelou relações. O governante venezuelano exibiu uma ata oficial sobre o incidente, ocorrido na base naval de Cararabo, no estado fronteiriço de Apure. Segundo o relato, os guerrilheiros colombianos levaram 18 fuzis, munição e cinco lança-foguetes AT-4 (as armas suecas apreendida). Chávez aproveitou a ocasião para, mais uma vez, desqualificar a acusação do colega Álvaro Uribe sobre as relações de Caracas com as Farc. "Não passa de uma manobra suja para desviar as atenções" do acordo militar com os EUA. Como tem insistido ao longo de seus mais de 10 anos no governo, o presidente venezuelano insistiu em que "não há solução militar" para o conflito armado na Colômbia, que se arrasta há 45 anos. "É preciso buscar uma saída política, negociada, e é isso que estamos buscando", afirmou. Chávez não escondeu sua decepção com Barack Obama, com quem trocou cumprimentos e um presente - o livro As veias abertas da América Latina, que relata a exploração da região pela Europa e pelos EUA - durante a Cúpula das Américas, em Trinidad e Tobago, em abril passado. "O Obama de Trinidad está desaparecendo na fumaça", arrematou. Entenda o caso Mobilidade estratégica Um documento que trata da estratégia de mobilidade global da Força Aérea dos Estados Unidos evidencia a intenção do governo norte-americano de usar a base militar colombiana de Palanquero como o primeiro ponto de apoio das Forças Armadas na região. Segundo o relatório, "o Comando Sul (Southcom) tem se interessado em estabelecer um local na América do Sul que poderia ser usado tanto para operações contra o narcotráfico como um ponto de onde as operações de mobilidade possam ser executadas". A ideia é que a base sirva para o reabastecimento de aeronaves que transportam equipamentos e militares, rumo ao continente africano. A utilização da base garantiria aos Estados Unidos uma enorme área de atuação na América do Sul, que cobriria oito dos 13 países da região - inclusive a Amazônia brasileira. "Desse local, quase metade do continente poderia ser percorrido por um C-17 sem reabastecimento. Se fosse possível reabastecer no destino, um C-17 poderia cobrir todo o continente, com a exceção da região do Cabo Horn, no Chile e Argentina", detalha o documento. O texto não deixa claro se a base usada seria a já existente em Palanquero ou se Washington pode construir uma nova base para ser seu "apoio". O analista John Lindsay-Poland, da ONG americana Fellowship for Reconciliation lembra que o orçamento do Pentágono enviado em maio ao Congresso dos EUA inclui US$ 46 milhões para o "desenvolvimento de uma nova base em Palanquero".

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