postado em 14/08/2009 08:39
Quem viu o furor despertado pela vitória de Barack Obama nas urnas custa a acreditar que, sete meses após sua posse, a população norte-americana começa a sair às ruas para protestar contra o "presidente da mudança". Agora, os slogans que mobilizaram multidões servem de combustível para as críticas dos mais insatisfeitos, que já somam 40% dos cidadãos. O nível de aprovação de Obama chegou, na última semana, a 50% - o nível mais baixo desde que assumiu. Entre os motivos da baixa popularidade estão a polêmica reforma do sistema de saúde (1), a lentidão nos resultados do combate à crise econômica e os gastos do governo, considerados excessivos por muitos.
"Obama tem tentado fazer muito e de uma forma muito rápida, no momento em que enfrentamos um déficit de trilhões de dólares. E, em meio a uma depressão econômica, os moderados e independentes temem que as propostas dele, especialmente a da reforma no sistema de saúde, levem o país a uma derrocada ainda maior", afirma o historiador Jonathan Bean, da Southern Illinois University. De fato, muitos americanos não gostaram de saber que a universalização dos serviços de saúde poderia custar até US$ 1 trilhão aos cofres públicos, em 10 anos. Muitos também acreditam que o projeto é assistencialista, vai estatizar o setor e tirar a "escolha" dos norte-americanos.
Apesar de considerar "normal" a queda na popularidade de Obama nesses primeiros meses, a professora de Relações Internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Cristina Pecequilo, afirma que o presidente não pode deixar "que essa tendência não se aprofunde daqui para frente". "Obama até teve uma lua de mel bem mais prolongada que a maioria de seus antecessores. Mas esse período é importante para ele perceber que é preciso agir diferentemente no campo da política doméstica, reafirmar as posições democratas", avalia Pecequilo. A especialista lembra que a reforma da saúde frustrada no governo Bill Clinton custou ao seu partido as eleições legislativas de 1994. "Obama não pode correr esse risco. Os republicanos já estão falando que, como os democratas estão perdendo o pé no debate (da saúde), isso vai custar cadeiras aos democratas, em 2010".
Para Pecequilo, é preciso que Obama tenha mais firmeza diante de suas políticas e assuma os maiores desafios, como a reforma de saúde - mesmo que isso o torne mais impopular. "A popularidade está caindo. Então, precisa avaliar se vale a pena se preservar tanto assim para uma de suas promessas de campanha ou partir para a ofensiva. Agora, ele está conseguindo desagradar aos dois lados - os republicanos, porque ele continua tocando a reforma; mas ao mesmo tempo, os democratas, porque ele não toma a linha de frente para defender", pontua. "Obama deu muito espaço para essa oposição republicana. Ele está confrontando essa oposição de uma maneira que não necessita e se submete à pressão do Dick Cheney, do George W. Bush. Mas ele não está mais em campanha, é o presidente".
Promessas
A insatisfação, no entanto, não tem sido motivada apenas pela proposta de reforma do sistema de saúde. O cientista político Brian Darling, da Fundação Heritage, enumera outras duas razões: "Obama está descobrindo que as muitas promessas feitas durante a campanha são difíceis de manter. Além disso, a economia ainda está em recessão, e o presidente tem que tomar conta disso também". Segundo Darling, a continuação da violência no Iraque após o início do plano de retirada das tropas americanas, a lentidão do fechamento de Guantánamo e o fracasso do projeto de governo bipartidário compõem um cenário de decepção. "Obama precisa impulsionar uma mudança popular. E isso deve começar pelas duas maiores demandas da população americana: um governo com menos despesas e a reativação da economia", aconselha.
1 - Desprotegidos
Cerca de 46 milhões de norte-americanos não possuem nenhum tipo de cobertura de médica. O governo mantém três programas públicos: o Medicare (para maiores de 65 anos), o Medicaid (para famílias de baixa renda) e o Programa Estatal de Assistência Médica para Crianças (Schip), mas o projeto de Obama é garantir um sistema de saúde público que assista toda a população, como ocorre no Reino Unido e no Brasil.
Unasul discutirá bases
Barack Obama estará de férias no fim de agosto e dificilmente aceitará o convite do colega Luiz Inácio Lula da Silva para participar da reunião de cúpula extraordinária que a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) marcou para o próximo dia 28 em Bariloche, na Argentina. O encontro foi convocado com a finalidade específica de debater o acordo que está sendo finalizado entre os Estados Unidos e a Colômbia, para que tropas americanas tenham "acesso operacional limitado" a sete bases militares em território colombiano.
Na ausência (quase certa) do presidente americano, as atenções se voltam para o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe. Na última segunda-feira, ele faltou à cúpula da Unasul, celebrada no Equador, justamente porque a cessão das bases aos EUA se tornou o tema central. Uribe, que na semana anterior percorreu sete países vizinhos - terminando pelo Brasil - para expor as razões de seu governo, confirmou ontem sua presença em Bariloche. O comunicado oficial da Casa de Nariño frisa que "a reunião não implica condição para o acordo entre Colômbia e Estados Unidos a fim de enfrentar com mais êxito o narcotráfico e o terrorismo".
A chancelaria colombiana indicou claramente que, depois dos resultados satisfatórios obtidos com a turnê de Uribe - seu objetivo era impedir que a cúpula de Quito se tornasse um foro para a condenação da Colômbia -, a ideia é passar à contra-ofensiva. As notícias sobre o acordo com Washington provocaram reação dura da Venezuela, do Equador e da Bolívia, e mesmo o governo brasileiro exigiu maiores explicações de Bogotá e Washington. Em Bariloche, Uribe pretende "abordar os três temas propostos pela Colômbia para Quito: a corrida armamentista na região, o tráfico ilegal de armas e o terrorismo".