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Governo paraguaio retira do Congresso a proposta de adesão da Venezuela ao Mercosul

postado em 19/08/2009 08:27
O presidente Fernando Lugo saiu-se bem da delicada tarefa de driblar o risco de ver o Paraguai tornar-se o primeiro país do Mercosul a rejeitar a entrada da Venezuela. Com uma manobra regimental, ele passou a "batata-quente" para o Congresso brasileiro - o texto já foi ratificado na Argentina e no Uruguai. Na semana passada, Lugo pediu a retirada do protocolo de adesão, que seria votado pelo Senado paraguaio, pois avaliou que a maioria opositora rejeitaria a proposta e criaria um constrangimento diplomático para as relações bilaterais. "O governo aguardará condições mais favoráveis para remeter novamente o pedido de adesão da Venezuela ao Mercosul", explicou o ministro de Relações Exteriores, Héctor Lacognata. O chanceler paraguaio disse ainda que serão intensificados os contatos com os senadores, com empresários que fazem negócios com a Venezuela, para convencê-los da importância do ingresso. O assessor legislativo do presidente, Emilio Camacho, ressaltou que a manobra seguiu o regulamento do Congresso: um documento rejeitado não poderia ser apresentado outra vez no mesmo período legislativo. Lacognata encontrou-se ontem com a embaixadora venezuelana em Assunção, Nora Uribe, para explicar a decisão do Executivo, e obteve resposta bastante compreensiva do governo de Hugo Chávez. "O tempo de cada um é o seu tempo, nós não podemos acelerar", resignou-se a diplomata venezuelana. "Não estamos apressando ninguém para tomar uma decisão, inclusive os congressistas. É uma decisão soberana do Paraguai, assim como o tema das rádios é uma decisão soberana da Venezuela", respondeu a diplomata, referindo-se também à decisão de Chávez de fechar rádios opositoras que não teriam apresentado os documentos exigidos pela Lei de Telecomunicações. A oposição paraguaia afirma que o governo venezuelano desrespeitou a liberdade de expressão e a chamada "cláusula democrática", assinada pelos membros plenos do Mercosul e Estados associados na cidade argentina de Ushuaia. "O governo de Chávez não tem atualmente um comportamento democrático ao fechar meios de imprensa", criticou o presidente do Congresso paraguaio, Miguel Carrizosa. Por outro lado, o ex-chanceler Alejandro Hamed, que atualmente aspira ao cargo de embaixador em Caracas, defende que seria possível chegar a uma circunstância favorável por meio de uma negociação avançada com o Parlamento. "Mais cedo ou mais tarde isso terá de ser aprovado", opinou. Brasil No Brasil, o pedido de adesão foi aprovado pela Câmara dos Deputados e está sendo avaliado há meses pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) do Senado. O presidente da comissão, Eduardo Azeredo (PSDB-MG), disse ao Correio, por telefone, que os senadores continuam aguardando o relatório final de Tarso Jereissati (PSDB-CE) para se decidirem sobre a aprovação da entrada da Venezuela no Mercosul. Azeredo avalia que o que ocorreu no Paraguai enfatiza a complexidade da adesão do novo membro, e indicou como "fatores complicadores" a questão da cláusula democrática e a nacionalização de empresas estrangeiras na Venezuela. O senador lembrou ainda que a ausência do embaixador venezuelano na última audiência pública promovida pelo Senado para esclarecer os temas polêmicos do acordo também foi malvista pela comissão. Se a CRE rejeitar a proposta, será o fim da entrada da Venezuela no Mercosul e Lugo ficará liberado de enviar o assunto outra vez ao Senado. Caso a comissão aceite o novo integrante do bloco, a proposta deverá ser analisada pelo plenário do Senado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode, se quiser, imitar Lugo e retirar a proposta do Senado, para que seja analisada em outro momento. Cronologia Acompanhe os principais lances da aproximação da Venezuela ao Mercosul: » Outubro/2005 Depois de romper com a Comunidade Andina de Nações, o governo de Hugo Chávez solicita a adesão da Venezuela ao bloco formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. » Dezembro/2005 O Mercosul aprova o acordo-quadro sobre a adesão de Caracas e o processo se inicia formalmente. » Julho/2006 É assinado pelos quatro membros do bloco o protocolo de adesão, que entrará em vigor assim que ratificado pelos congressos dos cinco países (inclusive o venezuelano). Argentina e Uruguai são os primeiros a concluir o processo. » Fevereiro/2007 O texto do protocolo é enviado pelo governo Lula ao Congresso Nacional. » Junho/2007 Em resposta a uma moção contra a decisão de Chávez de não renovar a concessão de uma emissora de TV, Chávez chama o Senado brasileiro de "papagaio do império" (os EUA). » Dezembro/2008 A adesão da Venezuela é aprovada pelo plenário da Câmara e enviada ao Senado, onde continua em análise na Comissão de Relações Exteriores. Honduras rompe com a Argentina O governo de fato de Honduras, comandado por Roberto Micheletti, rompeu ontem relações diplomáticas com a Argentina. A decisão foi anunciada pela chancelaria hondurenha, que invocou o princípio da estrita reciprocidade: há seis dias, a embaixadora de Honduras em Buenos Aires, Carmen Eleonora Ortez William, foi expulsa do território argentino por ter apoiado a deposição (1) do presidente Manuel Zelaya. A partir de agora, a relação diplomática entre os dois países será intermediada pela Embaixada de Israel na Argentina, de acordo com comunicado divulgado pela chancelaria hondurenha. Israel é um dos poucos países que mantém relações com o governo de fato de Micheletti. A despeito da decisão anunciada pelo governo de fato hondurenho, não há previsão para a saída dos diplomatas argentinos. "O pessoal diplomático argentino está em Tegucigalpa e não tem prazo para nada", disse o chanceler argentino, Jorge Taiana, durante visita à Cidade do México. Abusos Ontem, a Anistia Internacional manifestou preocupação com possíveis abusos cometidos pelas forças de segurança em Honduras desde a deposição de Zelaya, em 28 de junho passado, e pediu à comunidade internacional que busque solução para evitar uma "crise de direitos humanos" no país. "A Anistia Internacional pede energicamente à comunidade internacional que intensifique os esforços em busca de uma solução para a crise política a fim de evitar uma escalada na crise de direitos humanos em Honduras", assinala a organização, com sede em Londres. Esse temor é o principal ponto do relatório Honduras: ameaça de crise de direitos humanos com o aumento da repressão, ilustrado com testemunhos e fotografias de 75 pessoas que foram detidas em 30 de julho, após terem participado de uma manifestação em Tegucigalpa. "As detenções em massa arbitrárias e os maus-tratos a manifestantes são uma séria e crescente preocupação em Honduras atualmente", declarou Esther Major, investigadora da Anistia Internacional especializada em América Central. Uma missão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), com sede em Washington, desembarcou recentemente na capital hondurenha para verificar a situação das liberdades civis após a deposição de Zelaya. 1 - Impasse político Manuel Zelaya foi detido por militares na manhã de 28 de junho, na residência oficial, por ordem do Legislativo e do Judiciário. Naquele domingo, ele pretendia levar à frente uma consulta popular sobre a introdução, no texto constitucional, do direito à reeleição. Para garantir a realização do referendo, que rebatizou como uma "pesquisa de opinião", Zelaya ordenou às forças de segurança que invadissem uma base da força aérea onde estava guardado o material de votação, cedido pela Venezuela.

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