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Seis atentados quase simultâneos em plena Zona Verde deixam 95 mortos e 563 feridos

postado em 20/08/2009 08:36
Aos 30 anos, Ammar H. Mohammad talvez tenha vivido ontem o segundo primeiro dia de sua vida. Funcionário de uma empresa privada que presta serviços para o Exército norte-americano, ele trabalha na Zona Verde, a região mais fortificada e teoricamente intransponível de Bagdá. O mesmo ocorreu com Jazaer Karim Zidane, lotada no Ministério da Defesa. Emad Fuad, 49 anos, empregado do Ministério do Petróleo, lamenta por um grande amigo. Três iraquianos cujos destinos de alguma forma se cruzaram na manhã mais sangrenta dos últimos tempos em Bagdá. Às 10h40 (4h40 em Brasília), uma pequena explosão não chamou a atenção de Ammar. Seria apenas mais uma entre as dezenas que ocorrem quase todos os meses na capital. "Qualquer pessoa se acostuma com isso, depois de alguns meses", admitiu, em entrevista ao Correio, por meio de um software de videoconferência. [SAIBAMAIS]O estampido, porém, era o presságio de que algo pior viria. Dez minutos depois, o escritório de Ammar sacudiu violentamente. "Uma das explosões atingiu o posto de controle número 2 dos portões da Zona Verde, a 600m daqui. Corremos para o telhado e não pude ver muito, somente um cogumelo de fumaça branca subindo ao céu. Mas um amigo cortou a mão com um vidro e viu um carro 'voar' de repente e 'pousar' em um local diferente", relatou. Dois caminhões-bomba estacionados diante dos prédios do Ministério das Finanças e do Ministério das Relações Exteriores foram pelos ares, provocando um incêndio que tomou conta de 35 carros. Ao todo, os caminhões-bomba, carros-bomba e morteiros mataram 95 pessoas e deixaram 563 feridos em diferentes pontos de Bagdá. Além da chancelaria e da sede do poder econômico, os principais alvos foram os ministérios da Saúde e da Habitação e o prédio do Parlamento. Jazaer sentiu a força da segunda explosão, na Zona Verde. A contadora do Ministério da Defesa relatou à reportagem que a janela simplesmente "explodiu" sobre ela e seus colegas. "Os estilhaços quase me atingiram e um colega foi ferido por cacos de vidro que voavam. Uma cunhada minha se machucou da mesma forma, mas ela mora no bairro de Al-Salhyah, perto do Ministério das Relações Exteriores", disse. O impacto diante do prédio de 10 andares abriu uma cratera de 3m de profundidade por 10m de diâmetro e matou imediatamente 59 pessoas. "Tudo de que me lembro era de guardas e policiais do ministério correndo para o local e de civis fugindo dali. Ruas e pontes de Bagdá estavam interditadas. Graças a Deus, achamos outro caminho e voltamos para casa, por volta das 14h", descreveu. Para Jazaer, os atentados em série levam a assinatura da rede Al-Qaeda. "Os terroristas querem sabotar o processo político em andamento, e as ações seriam uma resposta à retirada das forças americanas das cidades", sustenta. Dois morteiros aterrissaram na Zona Verde e um terceiro caiu do lado de fora, no bairro central de Karrada. Emad Fuad contou que seu amigo Ahmid está inconsolável. "Ele perdeu todos os quatro colegas do escritório no Ministério das Relações Exteriores", disse. "Esses atentados foram cometidos por animais. Eu sinto muito pelas vítimas civis", desabafou. Ammar aposta que a onda de violência seguirá intensa até as eleições, em outubro. Aliança O iraquiano Louay Bahry, ex-professor de ciência política na Universidade de Bagdá, aposta numa cooperação entre a Al-Qaeda e antigos membros do Partido Baath, do ex-ditador Saddam Hussein. "Esse ataque é uma tentativa de desestabilizar o governo do premiê Nuri Al-Maliki, bastante fraco, e ocorre em um período de descontentamento da população com os serviços básicos, com a falta de água e a péssima situação da agricultura", explica. O analista admite que o Iraque não se apresenta mais como um país árabe aos olhos dos vizinhos, mas como nação xiita. "O governo está tentando relaxar a atmosfera de insegurança e voltou a abrir o comércio da Rua Rashid, a mais importante de Bagdá. Al-Maliki quer passar uma ideia de volta à normalidade, mas esse atentado mostra que ainda há muito trabalho a ser feito". PRISÕES NA ARÁBIA SAUDITA O Ministério do Interior da Arábia Saudita anunciou ontem a detenção de 44 supostos militantes islamitas ligados à rede Al-Qaeda, que tentavam recrutar jovens e financiar suas atividades por meio de entidades de caridade. A Arábia Saudita tem conduzido uma agressiva repressão aos militantes da rede terrorista desde maio de 2003, quando começaram os primeiros atentados no país onde nasceu o líder do grupo, Osama bin Laden. Ataques em série # Às 10h40 (4h40 em Brasília), um caminhão-bomba explode diante do Ministério das Finanças, no norte de Bagdá # Dez minutos depois, outra poderosa explosão atinge o Ministério das Relações Exteriores, próximo à Zona Verde # Uma baragem de morteiros cai sobre o bairro central de Karada # Explosões atingem um mercado no bairro de Bayaa (oeste). Um caminhão-bomba é desativado perto do hospital de Salhiya # Duas bombas de morteiros aterrissam no complexo das Nações Unidas, na Zona Verde. Uma terceira explode do lado de fora EUA mantêm tática O governo norte-americano reagiu prontamente à série de ataques em Bagdá e reafirmou a determinação de seguir com a estratégia de consolidar o processo político no Iraque e transferir o controle da segurança para as tropas locais. Em nota conjunta, o embaixador Chris Hill e o comandante das forças dos EUA no país, general Ray Odierno, classificaram os atentados como "horrendos" e "desprovidos de qualquer propósito". "Os terroristas não impedirão os iraquianos de continuar com seus esforços para construir uma sociedade pacífica, nem abalarão nossa resolução de ajudá-los", diz o texto. Em Washington, Ian Kelly, porta-voz do Departamento de Estado, condenou duramente uma ação violenta "contra uma delegação diplomática e contra aqueles que trabalham para estabelecer relações pacíficas, por meio do diálogo e da diplomacia". Acrescentou que a série de explosões representa "uma tentativa de sabotar" a construção de uma democracia estável. Kelly reafirmou a meta fixada pelo presidente Barack Obama e firmada em acordo com o governo iraquiano, de concluir até o fim de 2011 a retirada das tropas americanas do país. Desde o início de junho, as tropas iraquianas respondem sozinhas pela segurança nas cidades. "Temos um acordo com eles e estamos cumprindo. Os iraquianos decidirão que tipo de ajuda querem", advertiu. Já o porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, alertou que as explosões mostram "que os extremistas sempre irão tão longe quanto possível para causar destruição". A União Europeia (UE) também condenou os atentados, classificados como "atos brutais" em nota da presidência do bloco, exercida neste semestre pela Suécia. O texto expressa solidariedade apoio aos iraquianos diante da onda de violência que domina o país. O Conselho de Segurança das Nações Unidas se manifestou em tom veemente contra os ataques. "Os membros do conselho condenam nos termos mais fortes a série de atentados cometida em Bagdá", afirmou o embaixador britânico, John Sawers, que preside o organismo neste mês. Ironicamente, ontem a ONU celebrou o primeiro Dia Mundial Humanitário. A data foi escolhida para homenagear os 22 membros da organização - entre eles o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, na época representante especial do secretário-geral - mortos em um atentado terrorista na Zona Verde de Bagdá, em 2003.

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