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Micheletti acena com fim do estado de sítio e Zelaya se diz disposto a responder na Justiça

postado em 02/10/2009 08:28
A crise política em Honduras continua, mas os principais atores da disputa pelo poder do país parecem dar mostras de cansaço, de desgaste e de certa abertura ao diálogo. "No momento em que a população, a Corte Suprema, o Ministério Público e o Congresso disserem que não devo continuar, imediatamente retiro as fotografias que tenho aí e vou para casa", disse ontem o presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti (1): "Puseram-me como presidente e me responsabilizam por tudo", disse. Na quarta-feira, Micheletti afirmou que o estado de sítio não duraria 45 dias e prometeu reunir seus funcionários hoje para falar sobre o tema. "Possivelmente chamaremos o Conselho de Ministros e entre todos decidiremos qual é a situação que vai haver", anunciou. Já o presidente deposto, Manuel Zelaya, declarou ontem que Micheletti não é seu inimigo, mas um "adversário" que "não soube lidar com toda essa situação". Zelaya também se disse disposto a responder na Justiça às acusações feitas contra ele se for restituído à Presidência. "A solução dessa crise passa pela minha restauração, pelo respeito à democracia. Estou disposto a ir aos tribunais e a responder às acusações contra mim, não tenho nenhum problema com isso. Por isso voltei, porque sou inocente", disse o presidente deposto, em entrevista por telefone ao jornal uruguaio El Observador, de Montevidéu. "O diálogo provavelmente vai começar quando os ministros de Relações Exteriores estiverem aqui", afirmou John Biehl, representante especial do secretário-geral da Organização de Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza. A missão da OEA mencionada por Biehl deve chegar a Honduras em 7 de outubro. Para prepará-la, os funcionários da OEA, expulsos no último domingo por Micheletti, são aguardados hoje no país. Ontem, centenas de hondurenhos se manifestaram contra o governo interino em frente à embaixada dos EUA, cujo edifício fica próximo ao da embaixada do Brasil, em Tegucigalpa, onde se abrigam Zelaya e seus seguidores. "Mel (apelido de Zelaya), aguente, que o povo se levanta", gritavam os eleitores do presidente deposto. Enquanto isso, centenas de policiais, equipados com escudos e bombas de gás lacrimogêneo, mantinham cercada a embaixada americana. Mesmo assim, para o líder operário Juan Barahona, o número de manifestantes diminuiu em relação há dias. "O fechamento da Rádio Globo e do Canal 36 nos cortou a comunicação. As pessoas não sabem mais onde devem ir para participar das manifestações", disse Barahona à AFP. Violações Em Genebra, representantes dos governos da América Latina e do Caribe conseguiram ontem que o Conselho de Direitos Humanos na ONU solicitassem um relatório sobre a situação em Honduras, seguindo uma resolução adotada por consenso. O conselho pediu à Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navanethem Pillay, que apresente um informe sobre as violações em Honduras desde o golpe de Estado. O texto condena "energicamente as violações dos direitos humanos como consequência do golpe de Estado de 28 de junho de 2009, e em particular após a volta do presidente José Manuel Zelaya Rosales, em 21 de setembro de 2009". O documento foi redigido pelos oito países latino-americanos - Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Cuba, México, Nicarágua e Paraguai - que integram o conselho formado por 47 Estados escolhidos pela Assembleia Geral da ONU. A redação do texto também contou com o apoio de países observadores da região, como Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Venezuela. A resolução também teve a aprovação do Canadá, Lituânia, Portugal, Espanha, França, Suécia, Austrália, Dinamarca, Austrália, Reino Unido, Suíça e Letônia. Os Estados Unidos não assinaram nem se opuseram à proposta. 1 - Recuo desconhecido O Itamaraty não recebeu informações oficiais sobre uma alegada desistência do presidente interino, Roberto Micheletti, sobre o ultimato dado ao governo brasileiro para que defina o status de Manuel Zelaya em sua embaixada em Tegucigalpa. Apesar de o governo e a diplomacia brasileira não reconhecerem o governo de Micheletti, e, consequentemente, seu ultimato, o deputado Claudio Cajado (DEM-BA) revelou ao Correio que depois da visita dos deputados brasileiros os congressistas hondurenhos decidiram pedir ao governo interino a ampliação do prazo para que o governo brasileiro esclareça a situação de Zelaya. Garantias anti-invasão da embaixada Seis deputados brasileiros chegaram ontem à capital de Honduras, Tegucigalpa, para verificar a situação da embaixada brasileira, que abriga há 11 dias o presidente deposto, Manuel Zelaya. "A recepção foi tranquila, inclusive montaram um aparato para nos locomover", disse o deputado Ivan Valente (PSol/SP) ao Correio. Além de visitar a representação diplomática, os congressistas brasileiros conversaram com magistrados da Suprema Corte de Honduras, com integrantes da Comissão Nacional de Direitos Humanos e com membros da comunidade brasileira em Honduras. "A Comissão de Direitos Humanos colocou que o Brasil não tinha outra alternativa senão receber o presidente Zelaya lá, conforme a Convenção de Viena, e que não tinha participado ativamente do processo de retorno ao país", disse Valente. "O presidente da Suprema Corte, Jorge Rivera, e vários dos ministros também nos garantiram que não haverá invasão e violação da embaixada brasileira", revelou. O jornal hondurenho El Heraldo afirmou ontem que os deputados brasileiros teriam pedido uma audiência com o presidente interino, Roberto Micheletti, o que foi negado por Valente. "Eles estão precisando tanto de reconhecimento (internacional) que estão inventando mentiras. Pelo contrário, não haverá nenhum contato com o senhor Micheletti. A interlocução é só com os congressistas e com a embaixada", assegurou. O coordenador da comissão, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), também negou que o grupo de parlamentares tenha a pretensão de negociar de maneira mais abrangente uma eventual solução para a crise política de Honduras. "O que nós faremos é conversar com a elite política, com o Parlamento, com a comunidade e, evidentemente, pedir pela integridade da embaixada", acrescentou. Outros deputados que integram a comitiva são Janete Rocha Pietá (PT-SP), Claudio Cajado (DEM-BA), Bruno Araújo (PSDB-PE) e Maurício Rands (PT-PE). Ontem, Micheletti disse que os deputados eram "bem-vindos". Na quarta-feira, ele afirmou que "nenhuma medida adicional" seria tomada contra a embaixada. "Não vamos fazer neste país nada que possa romper os tratados internacionais", chegou a dizer. "A única coisa que precisamos é a garantia por parte do Brasil de que não permitam fazer uma campanha política em sua própria sede", afirmou Micheletti.

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