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Lula recebe o colega iraniano e tem chances reduzidas de intervir no impasse nuclear

postado em 21/11/2009 11:00
A julgar pela reação do representante iraniano no Brasil, o embaixador Mohsen Shaterzadeh, ao discutir a possibilidade de o Brasil ser um facilitador do diálogo com os Estados Unidos no que concerne ao programa nuclear desenvolvido por Teerã, são mínimas as possibilidades de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encontre abertura para falar sobre concessões com o colega Mahmud Ahmadinejad.

Em entrevista coletiva concedida ontem, o embaixador se esquivou de comentar diretamente uma possível interlocução do Brasil, mas afirmou que as atividades nucleares de seu país são transparentes, e frisou que a "unidade legal para monitorar e observar as atividades nucleares é a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica)". "Não há necessidade de todo esse barulho, dessas mentiras (sobre o programa iraniano)", completou.

Ahmadinejad chega a Brasília na manhã de segunda-feira para uma visita de apenas um dia. A viagem coincide com o momento em que as seis potências envolvidas nas negociações sobre o programa nuclear iraniano discutem a aplicação de novas sanções(1) a Teerã - e há uma semana a Petrobras anunciou que estuda encerrar suas atividades no país.

Apesar de dizer que seu governo não foi oficialmente informado sobre a possibilidade de a empresa brasileira deixar o Irã, o embaixador deu a entender que quem sairá perdendo é a Petrobras. "O mercado de energia iraniano é o segundo em jazidas de gás e o quarto em petróleo. Então, se uma empresa não quer fazer parte do projeto, é ela que se prejudica", declarou Shaterzadeh. Ele revelou que o escritório da Petrobras no país é tido como central para atender todo o Oriente Médio.

Daqui, Ahmadinejad seguirá para a Bolívia e, de lá, para a Venezuela. Acompanharão o presidente iraniano cerca de 280 pessoas, entre elas aproximadamente 200 empresários de áreas como eletroeletrônica, transportes, energia, mineração, siderurgia e metalurgia. Eles ficarão no Brasil por três dias e participarão de um seminário empresarial coordenado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), no Itamaraty. O embaixador negou que venham empresários ou responsáveis pelo programa nuclear do Irã.

Além da reunião que terá com Lula no Itamaraty, Ahmadinejad será recebido no Congresso pelos presidentes da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). No fim da tarde, participará de um debate no Instituto de Ensino Superior de Brasília (Iesb). A visita de Ahmadinejad será retribuída por Lula no primeiro semestre de 2010, segundo o embaixador iraniano.

Lado a lado


Em artigo endereçado à população brasileira, e distribuído ontemà imprensa, Ahmadinejad assumiu a posição do governo Lula em relação ao seu programa nuclear como "do povo brasileiro". "Se nessa polêmica injusta dos países ocidentais contra o programa nuclear iraniano com fins pacíficos o povo brasileiro fica do lado do povo iraniano, será por motivo de uma experiência semelhante na qual o povo entendeu que alguns poucos poderes arrogantes, na continuidade de seus comportamentos injustos, tentam impedir que as outras nações tenham acesso a ciências avançadas", diz o presidente.

No mês passado, o chanceler iraniano, Manouchehr Mottaki, afirmou que Brasil e Irã "compartilham da mesma visão sobre o uso da energia nuclear". Em setembro, o presidente dos EUA, Barack Obama, classificara como "positiva" a ideia de que Lula conversasse com Ahmadinejad sobre o assunto.

Quanto a uma possibilidade de diálogo entre Washington e Teerã, o embaixador iraniano disse que seu governo aguarda "mudanças práticas" na posição norte-americana para iniciar qualquer tipo de conversa. "Estamos esperando uma ação concreta. Os EUA devem esquecer o passado de ameaças de diversas maneiras contra o Irã", disse. Segundo Shaterzadeh, o processo poderia começar com o desbloqueio dos bens iranianos nos Estados Unidos e um pedido de perdão pela explosão de um avião de passageiros sobre o Golfo Pérsico. O embaixador, no entanto, procurou transparecer tranquilidade, por parte de seu país, quanto à ausência de relações com Washington. "Estamos percebendo que os EUA é que estão ficando isolados, e não o Irã", afirmou.

1 - Decepção

Na última quinta-feira, o presidente Barack Obama disse que os EUA e outros países discutiriam "um pacote" de medidas a serem adotadas caso o Irã não aceite um acordo para seu programa nuclear. Ontem, os seis países envolvidos nas negociações - EUA, China, Rússia, França, Reino Unido e Alemanha - se disseram "decepcionados" com Teerã, que não aceitou a proposta da Agência Internacional da Energia Atômica (AIEA) de enriquecer seu urânio no exterior. "Fazemos um apelo ao Irã para que reconsidere", diz uma nota divulgada pelos seis países. Um alto representante da União Europeia esclareceu que as sanções contra Teerã não foram estudadas "de forma específica", por não ser este o ;momento apropriado" para mais punições.

Amigo dos palestinos


Antes da chegada de Mahmud Ahmadinejad, o presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, que visita o Brasil desde a última quinta-feira, manifestou o desejo de que o colega brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, pedisse ao iraniano para parar com o financiamento ao grupo palestino Hamas. Em entrevista à Folha de S. Paulo, Abbas disse que faria o pedido a Lula no encontro em Salvador. Questionado sobre a intenção do líder palestino, o embaixador do Irã no Brasil, Mohsen Shaterzadeh, desconversou. Segundo ele, ;o Irã é amigo de toda a população palestina; e, como ;o povo palestino é oprimido e alvo de crueldades há décadas;, qualquer país que possa contribuir para seu reconhecimento como nação será bem-vindo.


"Essas duas grandes nações estão desempenhando papéis importantes e merecidos na governança mundial"
Mahmud Ahmadinejad, presidente do Irã, em artigo para a imprensa brasileira

Lula exige recuo de Israel

Durante encontro em Salvador com o presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmud Abbas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que Israel deve congelar "imediatamente" a colonização judaica na Cisjordânia, além de preservar as fronteiras com os territórios palestinos e permitir que as pessoas tenham "mais liberdade de circulação" nos locais ocupados. "A situação humanitária na Faixa de Gaza é insustentável. A dignidade humana não pode continuar a ser ignorada", acrescentou Lula.

Abbas, por sua vez, advertiu que as construções do governo israelense, particularmente em Jerusalém Oriental, são mais motivos para que o conflito não chegue ao fim. "Se o governo israelense continuar construindo em territórios ocupados, especialmente em Jerusalém ocupada, que a gente considera a capital da Palestina, isso quer dizer que ele está pondo todos os empecilhos no caminho da paz", lamentou o líder palestino, que pediu ontem a Lula que interceda pelas negociações de paz no Oriente Médio.

Ajuda

O líder da AP destacou que "a relevância de Lula" na comunidade internacional pode ser de grande importância para a implementação da paz entre israelenses e palestinos. "Vossa Excelência conquistou a admiração internacional, é muito capaz. Necessitamos da sua ajuda. Precisamos que o senhor assuma esse papel, pois está preparado para isso", ressaltou Abbas. Em resposta, o anfitrião garantiu que o Brasil tem interesse em contribuir para o avanço das negociações.

Lula explicou que a mediação dos Estados Unidos é insuficiente para um acordo definitivo, e defendeu a inclusão de mais países no processo de paz. "Quem deveria estar à frente do processo é a ONU, não os EUA, que são um dos responsáveis pela crise", criticou. O presidente condenou o conflito entre palestinos e israelenses e afirmou que, se for realizada uma pesquisa em todo o mundo sobre a situação, "mais de 80% dos países se manifestarão favoráveis à paz". "Todos os governos devem colocar esse tema entre as suas prioridades", pontuou o brasileiro.

O presidente brasileiro lembrou a necessidade de a persistência prevalecer sobre o conformismo, e observou não considerar possível que "os interesses de uma minoria beneficiada pelo conflito se sobreponham aos interesses gerais". Abbas, então, reiterou o pedido para que o Brasil "continue colocando os interesses palestinos acima dos seus". Além disso, apontou o país como um exemplo de convivência com as diferenças, "sem olhar cor, sexo ou religião".

Abbas chegou na quarta-feira passada à Bahia, primeira escala de uma viagem pela América Latina na qual busca apoio para a proclamação do Estado palestino. O embaixador da AP no Brasil, Ibrahim Al-Zeben, aproveitou a ocasião para assinar um acordo de cooperação técnica com o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Segundo Amorim, o Brasil já vinha contribuindo financeiramente com a sociedade palestina, e o novo documento amplia essa participação para áreas como esporte e agricultura.

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