Agência France-Presse
postado em 27/11/2009 11:26
DUBLIN - A investigação sobre os abusos sexuais cometidos contra crianças pelos padres católicos na Irlanda deveria ser ampliada para todo o país, pediu uma das vítimas nesta sexta-feira (27/11), um depois da apresentação de um relatório que condena décadas de encobrimento dos fatos pela arquidiocese de Dublin."Peço a extensão das atribuições da comissão de investigação ao conjunto das arquidioceses do país", declarou Marie Collins, vítima de abusos nos anos 1960.
A imprensa da católica da Irlanda se mostrou horrorizada nesta sexta-feira diante de tantas revelações. "Satânico", escreveu o Irish Examiner, denunciando "horrores que só podem ser definidos como diabólicos". "Há alguns anos a história de abusos sexuais e físicos contra crianças era descrita como o Holocausto irlandês. Na época, a descrição parecia extrema. Lamentavelmente, o tempo a justificou", acrescentou. O jornal afirma ainda que a "corrupção do poder e a natureza fundamentalmente podre das relações entre a Igreja católica e o Estado foi revelada no informe".
O Irish Times critica também o "silêncio estudado do Vaticano" ante os pedidos de mais informações, que "alimentará a suspeita de que a Igreja continua fixada em proteger sua arruinada imagem". Segundo o relatório de uma investigação oficial, publicado na quinta-feira, a Igreja Católica da Irlanda encobriu os abusos sexuais cometidos por padres da região de Dublin envolvendo centenas de crianças durante várias décadas,
O documento, de mais de 700 páginas, fala sobre a atitude da hierarquia católica no arcebispado de Dublin entre os anos 1975 a 2004. Acusa, principalmente, quatro arcebispos por não terem denunciado à Gardai (polícia) que sabiam dos abusos sexuais, cometidos a partir dos anos 60.
"A preocupação do arcebispado de Dublin na gestão dos casos de abusos sexuais com crianças, pelo menos até metade dos anos 1990, foi de guardar segredo, evitar o escândalo, proteger a reputação da Igreja e de preservar seus bens", continuou o documento. "A comissão não tem dúvidas de que os abusos a crianças pelo clero foram dissimulados pelo arcebispado de Dublin e as outras autoridades eclesiásticas durante o essencial do período", destacou o relatório.
"As autoridades do Estado facilitaram esta dissimulação, ao não assumirem suas responsabilidades" e "o bem-estar das crianças, que deveria ter sido a prioridade, não era nem um fator levado em consideração no início", acusou o relatório.
A comissão divulgou ainda "o caso de um padre que admitiu ter abusado sexualmente de mais de 100 crianças" e de um outro que "reconheceu ter cometido abusos, em média, uma vez a cada quinze dias durante seu ministério que durou mais de 25 anos". Em entrevista à imprensa, o ministro islandês da Justiça Dermot Ahern manifestou seu sentimento de "repugnância e de cólera" ao ler este informe.
Ahern disse que o relatório é um "catálogo de atos maléficos cometidos em nome do que era considerado como o bem geral". Ele destacou a "ironia cruel de uma igreja que, motivada em parte pelo desejo de evitar o escândalo, criou um outro, de dimensão incrível".
As conclusões desta investigação apareceram seis meses após um outro relatório que horrorizou a Irlanda em maio, revelando décadas de abusos sexuais, a partir dos anos 1930 em instituições para crianças dirigidas pela Igreja Católica.
O arcebispo de Dublin, Diarmuid Martin, pediu desculpas e expressou "pesar e vergonha" pelo encobrimento dos abusos sexuais cometidos por padres católicos contra crianças em suas arquidioceses.
"Ofereço a todos e a cada um dos sobreviventes minhas desculpas, meu pesar e minha vergonha pelo ocorrido", declarou o arcebispo, acrescentando: "tenho consciência de que nenhuma palavra de desculpa será suficiente". "O fato de que os autores dos abusos eram padres constitui, ao mesmo tempo, uma ofensa a Deus e uma afronta ao sacerdócio", destacou.