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De Guantánamo para os EUA

Obama compra prisão, no estado de Illinois, para abrigar suspeitos detidos em Cuba. Analistas veem desespero do presidente

postado em 16/12/2009 07:00
Um pequeno centro de detenção no estado de Illinois será o primeiro, em território norte-americano, a receber parte dos cerca de 210 homens confinados na controversa prisão de Guantánamo, em Cuba. Segundo uma carta assinada pelos secretários de Estado, Hillary Clinton, e de Defesa, Robert Gates, e endereçada ao governador de Illinois, Patrick Quinn, a Casa Branca decidiu comprar o Thomson Correctional Center para abrigar ;prisioneiros federais e um número limitado de detentos da Baía de Guantánamo;. O estabelecimento tem capacidade para 1,6 mil presos.

;Isso não só ajudará a resolver o urgente problema de superlotação nas nossas prisões federais como também ajudará a cumprir a meta de fechar o centro de detenção de Guantánamo de forma desembaraçada, segura e legal;, afirmam os secretários na carta. A transferência será a primeira grande ação do governo no sentido de retirar os presos de Guantánamo ; compromisso assumido pelo presidente Barack Obama ainda na primeira semana no poder. Contudo, Obama não conseguirá cumprir o prazo que ele mesmo estipulou de um ano para o fechamento da prisão na ilha cubana.

Segundo o maior jornal do estado de Illinois, o Chicago Tribune, a prisão receberá entre 35 e 90 prisioneiros vindos da baía cubana. Atualmente, o Thomson Correctional Center, construído em 2001, abriga apenas 200 detentos ; oito vezes menos que a sua capacidade total ;, por conta de ;restrições orçamentárias;. O centro deverá ser vendido ao Departamento Federal de Prisões, e a parte que abrigará os suspeitos de terrorismo será cedida ao Departamento de Defesa.

Neste ano, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma lei que proíbe a transferência dos presos de Guantánamo para o território norte-americano, a não ser que eles sejam levados à Justiça comum do país. Os governistas, entretanto, querem derrubar a restrição, e enfrentam a oposição dos republicanos. Para o líder do partido no Senado, Mitch McConnell, a prisão de Illinois será uma espécie de ;Guantánamo do Norte; e não ;tornará os americanos mais seguros do que mantendo esses terroristas fora das nossas costas, numa instalação segura em Cuba;.

Para especialistas, a decisão do governo de transferir os detentos para uma prisão comum mostra o ;desespero; do presidente para terminar o ano com ações mais ;concretas; e não somente com promessas. ;Obama lançou sua campanha para presidente e alcançou um sucesso inicial com o apoio da esquerda contrária à guerra. A decisão sobre o Afeganistão a irritou. Se ele não acalmar a esquerda sobre Guantánamo, colocará em risco seu partido nas eleições de 2010;, afirmou ao Correio John Baker, professor da Louisiana State University. Segundo ele, transferir os presos para o pequeno centro de detenção foi uma ;péssima ideia;. ;Essas pessoas deveriam estar em uma prisão militar. Esta ação os coloca como criminosos, e não como participantes de uma guerra;, afirma.

Progresso
Apesar de concordar que Obama está ;desesperado; para conseguir algum avanço no tema, o especialista Ivan Eland, do Instituto Independente, de Washington, acredita que a decisão representa um progresso. ;Isso garantirá que mais deles tenham julgamentos justos no sistema de justiça dos EUA. Não elimina a perda de direitos para alguns presos, mas já é um passo positivo;, opina. Eland, contudo, alerta que é preciso monitorar a trajetória desses presos daqui para a frente, ;para se certificar de que todos os detidos tenham um julgamento justo, como estipula a Constituição dos EUA;.

Eficaz ou não, a decisão agradou a muitos moradores da cidade de Thomson, a 240 km de Chicago, e ao governador de Illinois. Segundo Quinn, o projeto pode proporcionar até 2 mil empregos no estado, além de US$ 1 bilhão em investimentos federais. Para o comerciante Todd Baker, que possui loja em Thomson, a compra da prisão não só vai garantir mais empregos, como segurança. ;Esta notícia me faz querer manter as minhas portas abertas. Vai ter muitos guardas vindo por conta da ;isca;;, disse à rede CNN.

A nova prisão

Números do Thomson Correctional Center, em Illinois:

  • 15 prédios no total, totalizando 58 mil metros quadrados de área construída, em um terreno de 590 mil metros quadrados

  • Instalações de segurança máxima: 1.600 celas, oito prédios de dormitórios

  • Instalações de segurança mínima: 200 camas


Bombas matam 47 no Afeganistão e Paquistão
Rodrigo Craveiro
A cada atentado, o medo dá lugar à indiferença, ainda que perturbadora. Foi o que ocorreu ontem com o intérprete afegão Sayed Abdul Wakil, 23 anos. Às 9h30 (hora local), o impacto da bomba estilhaçou os vidros de seu escritório, no distrito de Wazir Akbar Khan, em Cabul. ;A explosão foi pesada, ocorreu a apenas 500m de mim;, contou ao Correio, pela internet. Os extremistas tinham alvos predeterminados: o Hotel Heetal, que abriga vários ocidentais, e a casa do ex-vice-presidente Ahmed Zia Massud, irmão do herói afegão e guerrilheiro Ahmed Shah Massud. Pelo menos nove pessoas, incluindo quatro mulheres, morreram no ataque, que também deixou 40 feridos e coincidiu com uma conferência contra a corrupção. Em Gardez, capital da província de Paktia (96km ao sul de Cabul), outra explosão diante da sede da organização não governamental USAid matou cinco seguranças ; um nepalês e quatro afegãos.

Wakil não se ressente da onda de violência que atinge seu país. Questionado sobre o motivo de os extremistas desejarem a morte de Massud, ele adotou um tom ríspido. ;Não são extremistas. São servos de Deus;, argumentou, afirmando ser favorável aos atentados. ;Os ocidentais e seus apoiadores têm que ser mortos. O ex-vice-presidente é um grande cachorro dos demônios do Ocidente. Quem trouxe os americanos para o Afeganistão? Foram pessoas como ele que trouxeram a América e ainda apoiam os americanos;, disparou.

No vizinho Paquistão, outra região sensível ao terrorismo, uma pequena cidade de 15 mil habitantes praticamente parou às 14h45 (hora local) de ontem. O estudante Muhammad Shahbaz, 23, escutou um som distante. ;Parecia um prédio desabando;, comparou. Minutos depois, dirigiu-se até um mercado, localizado na avenida principal de Dera Ghazi Khan (na província de Punjab), e vislumbrou nuvens de fumaça e pânico. ;Todas as pessoas corriam para ajudar os feridos. As lojas fecharam suas portas e alguns cidadãos choravam por parentes que não foram vistos no local;, descreveu, em entrevista pela internet.

Os 900kg de explosivos acondicionados em um carro deixaram ao menos 33 mortos e 60 feridos. De acordo com Hasan Iqbal, chefe da administração municipal, o ataque foi perpetrado por um extremista suicida. A detonação abriu uma cratera de 4,5m de profundidade por 9m de largura. Até o fechamento desta edição, as autoridades acreditavam que cerca de 20 civis estavam desaparecidos. Segundo a agência de notícias Associated Press, a casa do deputado Zulfiqar Khosa ; membro do partido Liga Muçulmana do Paquistão-N (Liga-N) e opositor a Islamabad ; foi atingida. Dois primos do parlamentar ficaram feridos.

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