Silvio Queiroz
postado em 02/01/2010 07:00
Dialogar ou apenas continuar combatendo será possivelmente a questão central sobre a qual candidatos e eleitores se debruçarão nos próximos meses na Colômbia. Em março, o país renova o Congresso, e em maio escolhe um sucessor para o presidente Álvaro Uribe - ou, caso a Constituição seja emendada, pode confirmá-lo para o terceiro mandato. Desde que chegou à Casa de Nariño, em 2002, Uribe escalou os cumes da popularidade com sua política de Segurança Democrática, estratégia de guerra total contra as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Mas o sequestro seguido de assassinato do governador de um departamento (estado) do sul do país, às vésperas do Natal, serviu para corroborar os questionamentos de um setor da oposição que insiste na urgência de capitalizar os êxitos militares do Estado recolocando sobre a mesa a opção de uma saída política para meio século de conflito interno.
Em julho de 2008, o presidente chegou perto da unanimidade depois do espetacular resgate de Ingrid Betancourt, ex-candidata à presidência, sequestrada seis anos antes. Nos meses anteriores, as Farc haviam perdido seu fundador e líder histórico, Manuel "Tirofijo" Marulanda, morto aos 80 anos, e dois outros integrantes do alto comando. Comandantes militares e analistas davam o conflito por vencido. Mas a ressurgência da guerrilha, em especial em um arco que se estende de sudeste a sudoeste (veja mapa) não é a única pedra no sapato do uribismo.
Nos últimos dias de 2009, o prefeito em exercício do segundo maior centro urbano, Medellín, lançou a ideia de instalar uma base do Exército em um setor particularmente vulnerável das comunas - bairros populares - incrustados nas montanhas que circundam a cidade. Na semana anterior, bandos ligados ao narcotráfico haviam ordenado aos moradores que deixassem suas casas, em meio a uma guerra travada com fuzis automáticos e metralhadoras. Medellín, sinônimo de violência impune nos anos 1980 e 1990, não assistia a nada semelhante desde o fim de 2002, quando as tropas combateram por uma semana até expulsar das comunas as milícias das Farc e seus adversários, os paramilitares de extrema direita. O ano passado terminou com uma taxa de 70 homicídios por 100 mil habitantes, ainda distante dos patamares históricos, mas equiparada ao índice registrado em 2003.
Acordo humanitário
O desfecho trágico do sequestro do governador de Caquetá, Luis Francisco Cuéllar, recolocou na agenda das campanhas eleitorais o tema dos reféns da guerrilha, que mantém em seu poder cerca de 20 militares e policiais. Assim como Ingrid Betancourt e outros políticos, eles representam para as Farc a moeda de troca por centenas de guerrilheiros presos. Uribe, porém, descarta a opção de negociar um acordo humanitário e insiste em libertar os cativos pela via militar. "Foi o maior erro que se podia cometer", disse Luis Eladio Pérez, um ex-congressista libertado do cativeiro em 2008, comentando a morte do governador. Em março, Pérez e outros ex-reféns disputarão cadeiras no Congresso - quase todos sob o compromisso de colocar a troca de prisioneiros no topo da agenda política.
O debate invadirá inevitavelmente a campanha presidencial, especialmente se não prosperar a emenda da segunda reeleição. (1) Se o presidente é considerado imbatível, o mesmo não vale para seu favorito a disputar o cargo, o ex-ministro da Defesa Juan Manuel Santos. Numa disputa com Santos, aumentam as chances da oposição, seja com o liberal Rafael Pardo ou com o esquerdista Gustavo Petro. Este último, que integrou a guerrilha do M-19 e foi um dos artífices de sua desmobilização, em 1991, sustenta que os bons resultados da Segurança Democrática colocam o Estado em posição de vantagem. De olho nas chances eleitorais, Petro trata de descartar concessões aos rebeldes e coloca a questão em termos de prioridade humanitária: "Até aqui, o que ambos os lados fizeram foi desumanizar os reféns e transformá-los em objeto de troca. Isso tem que mudar".
1 - Batalha legal
Está nas mãos da Suprema Corte o destino político de Álvaro Uribe. Depois de inúmeras batalhas, a maioria governista aprovou no Congresso o projeto de convocar um referendo sobre a emenda que permitiria ao presidente disputar o terceiro mandato consecutivo. Em 2006, quando deu aval à primeira reeleição, o Judiciário fixou dois períodos como limite.