Agência France-Presse
postado em 13/03/2010 11:54
O porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, afirmou neste sábado (13/03) que os "esforços para envolver pessoalmente" o Papa Bento XVI nos escândalos de pedofilia na Igreja Católica "fracassaram", em declarações a Rádio Vaticano.Mas para a imprensa da Alemanha o Pontífice deveria apresentar explicações sobre um caso ocorrido quando era o arcebispo de Munique.
"É mais que evidente que nos últimos dias alguns buscaram - com certo rancor em Ratisbona e Munique - elementos para envolver pessoalmente o Santo Padre nas questões dos abusos sexuais, mas está claro que os esforços fracassaram", disse o padre Lombardi na rádio em que dirige.
Ao citar Ratisbona e Munique, Lombardi se referia ao fato do escândalo de pedofilia na Alemanha ter envolvido o coral de Ratisbona, dirigido durante 30 anos pelo irmão do Papa, monsenhor Georg Ratzinger, e o questionamento ao Papa por um jornal alemão de que Bento XVI teria abrigado um padre suspeito de pedofilia quando dirigia a diocese de Munique.
A arquidiocese de Munique reconheceu na sexta-feira que Joseph Ratzinger, que mais tarde se tornaria o Papa Bento XVI, aceitou em 1980 receber um suposto padre pedófilo, condenado mais tarde por abuso sexual de menores.
"O Papa sabia que este padre voltaria a exercer suas funções no arcebispado? Ou não sabia de nada, o que seria provavelmente uma negligência?", pergunta o jornal Tagesspiegel, de Berlim, em um editorial.
"As duas hipóteses são, para dizer o mínimo, pouco gloriosas", completa.
"Restam dúvidas que são cruciais, e sobre as quais apenas o Papa Bento XVI pode responder. Deveria responder em nome da clareza e da verdade, e não por obrigação", destaca um longo editorial do Süddeutsche Zeitung, de Munique, que revelou o envolvimento do Pontífice nos escândalos que afetam a Igreja Católica alemã desde o fim de janeiro.
"Bento XVI usou as palavras mais duras para os abusos sexuais e, portanto, não pode ser acusado de negá-los ou de querer dissimulá-los. No entanto, finalmente se viu atingido por este tipo de caso", afirma o Süddeutsche Zeitung.
"O que está em jogo agora é a confiança que podem ter ou não no Sumo Pontífice um bilhão de católicos em todo o mundo", conclui o jornal.
Ao mesmo tempo, um ex-membro do coral de meninos de Ratisbona, dirigido entre 1964 e 1994 pelo monsenhor Georg Ratzinger, relatou as violências que este era capaz de infligir em uma entrevista à revista Spiegel.
"Ratzinger era muito irritado e irascível durante os ensaios. Eu o vi muitas vezes jogar com raiva uma cadeira contra o coral de vozes masculinas ao qual eu pertencia", conta Thomas Mayer, que foi interno entre 1988 e 1992.
"Uma vez a fúria era tanta que a dentadura dele saiu da boca", relata Mayer na entrevista.
Georg Ratzinger admitiu há alguns dias, em entrevista a um jornal, ter dado "vários tapas" quando iniciou o trabalho como diretor.
Ele disse que sempre teve a "consciência pesada" pela atitude e que se sentiu "aliviado" com a aprovação de uma lei que proibia qualquer castigo corporal no início dos anos 80. O irmão do Papa afirma que cumpriu "estritamente" a lei a partir de então.
Na entrevista à Spiegel, o ex-interno recorda ainda que as violências sexuais eram comuns entre os alunos no período em que passou no centro. Também cita os trotes dos colegas mais velhos.
"Faziam repercutir a pressão do sistema totalitário que imperava no coral", afirma.
A arquidiocese de Ratisbona reconheceu dois casos de abusos sexuais contra crianças no coral, ambos anteriores ao período de Ratzinger como diretor.
Dezenove das 27 dioceses da Igreja Católica alemã estão envolvidas em escândalos de abusos sexuais, que começaram a emergir no fim de janeiro.
Um total de 3.000 acusações de pedofilia contra padres foram examinadas pela justiça do Vaticano de 2001 a 2010, por fatos cometidos nos últimos 50 anos.
"De 2001 a 2010 recebemos aproximadamente 3.000 acusações envolvendo padres diocesanos ou religiosos por crimes cometidos nos últimos 50 anos", declarou o monsenhor Charles J. Scicluna, do Ministério Público do tribunal da Congregação da Fé, em uma entrevista concedida ao Avvenire, o jornal da Conferência Episcopal Italiana.
"Em mais ou menos 60% dos casos são atos de ;efebofilia;, ou seja, atração física por adolescentes do mesmo sexo. Em 30% relações heterossexuais e os 10% restantes de verdadeira pedofilia, ou seja, de atração sexual por jovens impúberes", afirmou o religioso, para estabelecer uma diferença entre os casos.
Para ele, "em nove anos os casos de padres acusados de pedofilia são por volta de 300".
"É muito, com certeza, mas é preciso constatar que o fenômeno não é tão extenso como se quer fazer acreditar", completou, antes de destacar que existem "400.000 padres diocesanos e religiosos no mundo".