Agência France-Presse
postado em 19/03/2010 16:07
A ambição mediadora do presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, deparou-se com a complexidade do Oriente Médio, ao encerrar nesta semana uma intensa visita à região, num momento de forte tensão entre as partes e à sombra do diálogo brasileiro com o Irã."Lula quer um papel de mediador para o Brasil nas conversações entre palestinos e israelenses, como a Noruega fez há alguns anos, como forma de projetar um país grande e influente", resumiu à AFP o analista e professor da Universidade de Brasília, David Fleischer.
"Simbolicamente foi uma viagem importante: a primeira de um presidente do Brasil a Israel, mas em termos práticos, a pretensão brasileira de se constituir em força de pacificação defrontou-se com uma realidade complexa", destacou por sua vez o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Marcelo Coutinho.
[SAIBAMAIS]A visita de Lula a Israel, aos territórios palestinos e à Jordânia esteve marcada por um boicote do ministro das Relações Exteriores israelense, o ultranacionalista Avigdor Lieberman, e por uma escalada de violência, depois do anúncio de Israel sobre novas construções de casas em Jerusalém Oriental.
Lula recebeu outra mensagem pouco encorajante dos palestinos, depois de sua oferta de diálogo com todas as partes, sem exceção, incluindo o grupo islamita Hamas: não meter-se em questões internas e pedir ao Irã que não financie o Hamas, como declarou o presidente palestino Mahmud Abbas, em entrevista ao jornal brasileiro O Estado de São Paulo.
O Brasil, que foi conquistando um papel de maior projeção na arena internacional e aspira a uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU, onde agora ocupa um lugar rotativo por dois anos, expressou disposição de mediar o conflito no Oriente Médio. Recebeu, recentemente, os presidentes de Israel, Shimon Peres; palestino, Mahmud Abbas, e o iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, em Brasília.
Lula deixou Amã na quinta-feira reiterando a intenção de participar do processo de paz, assegurando que israelenses, palestinos e jordanianos assim o querem: "Convenci-me de que o Brasil (...) pode ajudar nesse debate", disse.
Ele explicou como o Brasil vê essa contribuição: "aproximar os que se mantêm distantes (...)".
Já o Irã, que Lula visitará em maio, mostrou-se um interlocutor incômodo para o Brasil - tendo sido assunto abordado durante praticamente toda a visita do presidente brasileiro. A posição de Brasília sobre a questão nuclear iraniana está marcando fortes diferenças com uma comunidade internacional que pede sanções para bloquear o programa nuclear iranino, enquanto os brasileiros defendem mais diálogo.
Segundo Coutinho, "ficou muito claro no parlamento de Israel a insatisfação causada pela manutenção de laços do Brasil com o Irã", com o Brasil também ganhando certa simpatia do Hamas.
No Brasil, que em maio acolherá o III Fórum da Aliança de Civilizações, destinado a reforçar o diálogo entre o mundo ocidental e o muçulmano, a viagem foi questionada pela oposição; charges na imprensa mostraram Lula e o chanceler Celso Amorim retornando da viagem de mãos vazias.
"A ideia de o Brasil se tornar um megamediador mundial de todos os conflitos beira o ridículo", afirmou o analista político Amaury de Souza, citado pelo jornal O Globo.
"Lula não tem nenhuma influência na região", declarou o professor Moshe Maoz, da Universidade Hebraica de Jerusalém ao mesmo jornal.
Em compensação, para o professor da Universidade do Cairo, Mustafah Elwi, "o Brasil pode ser um mensageiro justo, com a vantagem que lhe dá sua posição histórica de neutralidade no Oriente Médio".