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Presidente desembarca em Teerã sob pressão dos EUA e aliados

Eles querem que presidente arranque concessões do regime islâmico no impasse nuclear

postado em 16/05/2010 11:13
A decisão do governo brasileiro de se colocar no centro de um dos mais polêmicos impasses internacionais ; o embate sobre o programa nuclear do Irã ; acabou por colocar o país também na berlinda. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou na noite de ontem em Teerã na mesma posição incômoda da qual pretendia poupar o colega iraniano, Mahmud Ahmadinejad: contra a parede. Nos últimos dias, fontes norte-americanas e até o presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, apontaram a visita de Lula como a última tentativa de diálogo antes que entre na agenda do Conselho de Segurança das Nações Unidas a imposição de novas sanções ao Irã. Se não conseguir um gesto favorável(1) de Teerã, o presidente terá de decidir se o Brasil vai se unir ao coro, cada vez mais uníssono, em favor das punições.

Anters de embarcar, Lula demonstrou surpresa com as proporções que sua visita assumiu. ;Criou-se uma expectativa exagerada;, disse o presidente depois de se reunir em Doha com o emir do Catar, Hamad bin Khalifa Al-Thani. Segundo Lula, o Brasil não pretende colocar o Irã na parede, nem quer que sua viagem seja vista como a ;última chance;. ;Não queria ser tão fatalista. Vou conversar com muita franqueza com o presidente iraniano, lamentando que os outros presidentes não tenham feito o mesmo;, alfinetou. O presidente lembrou que o Brasil não é membro permanente do Conselho de Segurança ;nem tem armas nucleares;, como EUA e Rússia. ;O país pode contribuir, mas essa não é uma negociação entre o Brasil e o Irã.;

O assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, que integra a comitiva, assumiu que o governo enfrentou uma ;pressão pesada; de outros países às vésperas do encontro de Lula com Ahmadinejad, marcado para as 9h de hoje (1h30 em Brasília). Em entrevista ao jornal francês Le Figaro, publicada ontem, o assessor já havia rechaçado a ideia de um ;ultimato;, e disse que a viagem tinha como meta ;tentar obter garantias de que o Irã adotará uma postura similar à do Brasil sobre a questão nuclear;. Entre elas estariam a aceitação de inspeções por parte a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e a renúncia ;à produção e utilização de armas atômicas;.

Há a expectativa até de que o governo Lula tente obter as garantias por escrito. Para acertar esses detalhes, o chanceler Celso Amorim antecipou sua ida a Teerã e reuniu-se ontem com o colega Manouchehr Mottaki, por cerca de uma hora e meia. Hoje, Lula terá um encontro reservado com Ahmadinejad e, em seguida, com o líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei, que dá a palavra final quando o assunto é defesa e política externa. Às 16h (8h30 no Brasil), o brasileiro será recebido pelo presidente do Majlis (Parlamento), Ali Larijani, e fará ; provavelmente acompanhado de Ahmadinejad ; o encerramento do fórum de empresários dos dois países.

Alto risco
Para o professor de relações internacionais Virgílio Arraes, da Universidade de Brasília (UnB), a situação delicada em que o Brasil se encontra é resultado de uma decisão ousada. ;Foi uma aposta de alto risco, na qual tanto um resultado positivo quanto um negativo serão significativos ;, afirma. Segundo Arraes, o governo tinha consciência de que, ao oferecer uma intermediação, estaria se colocando no centro da questão. ;E o Irã não é uma questão pequena, seja pelo porte econômico, geográfico ou populacional. A diplomacia brasileira tinha consciência de que não era impacto apenas regional;, observa.

Michael Shifter, presidente Diálogo Interamericano, de Washington, avalia que a ;autoconfiança extrema; de Lula pode ter cegado o governo brasileiro. ;Lula tem muito orgulho e ambição, mas parece ter subestimado as dificuldades para tornar-se um vencedor nessa questão tão delicada;, avalia. ;Se ele for bem-sucedido no Irã, será aplaudido. No entanto, isso parece improvável, então a questão é o que ele vai fazer e dizer se falhar;, questiona Shifter.

1 - Condições definidas
Horas antes da chegada de Lula, o porta-voz da chancelaria iraniana, Ramin Mehmanparast, disse que as condições para um ;acordo sério; sobre a troca de urânio já estão definidas. Segundo o funcionário, já haveria ;entendimento; sobre a quantidade e o momento da troca do material radioativo por combustível nuclear, e só restaria determinar o país por meio do qual a troca seria feita. ;Falta um acordo sobre o lugar. O Irã está disposto a discutir sobre esse ponto, caso existam garantias concretas;, disse Mehmanparast.

Farpas de todos os lados
À medida que se aproximava a hora de Lula desembarcar em Teerã, aumentavam as críticas ao otimismo do governo brasileiro em relação ao regime iraniano. Ontem, em editorial, o jornal The Washington Post disse que nenhum outro governo, exceto os do Brasil e da Turquia, acredita que as conversas com Teerã possam surtir efeito. O Post ainda apontou que a persistência dos governantes dos dois países se explica, em parte, pela ambição em demonstrar que são ;capazes de desafiar os Estados Unidos;. Para o também americano The New York Times, a posição brasileira ultrapassou a barreira da ingenuidade e vem incomodando quem está envolvido diretamente com a discussão sobre sanções.

;Nas Nações Unidas, alguns diplomatas dizem que a viagem do senhor Da Silva projetou sombras sobre as conversas, porque deram à China e à Rússia (;) razões para continuar enfatizando a via diplomática;, diz o Times. No dia anterior, a própria secretária de Estado, Hillary Clinton, sugeriu que o Brasil não tinha noção das dificuldades que encontraria em Teerã.

Em resposta, Lula criticou o fato de Washington enviar de ;funcionários de terceiro escalão; para discussões importantes. ;A política existe exatamente para você exercitá-la na sua plenitude, para tentar conversar, convencer os outros. Política não é uma coisa de que se pode fazer transferência, terceirizando ou mandando um funcionário de terceiro escalão do governo para negociar uma coisa grave que o Conselho de Segurança está decidindo;, disse.

Em Doha, Lula recebeu do emir do Catar, Hamad bin Khalifa Al-Thani, advertências sobre a seriedade do governo de Teerã. Segundo a agência sw notícias France Presse, o chefe de Estado catariano teria advertido o presidente brasileiro de que o Ahmadinejad não é confiável e pode descumprir qualquer acordo que venha a ser selado hoje. O pessimismo parece ter contagiado até mesmo a Turquia, parceira do Brasil na empreitada de mediação. O primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan resolveu suspender a viagem que faria a Teerã para conversar com Lula e Ahmadinejad. ;Parece que uma viagem a Teerã na segunda-feira não é mais possível, já que o Irã não deu nenhum passo adiante no tema;, afirmou.


Deu no...
The New York Times

Santo milagreiro

O jornal mais influente dos Estados Unidos ressalta no título as preocupações do governo americano com a visita do presidente a Teerã e a aproximação entre Brasil e Irã. A reportagem ouve o diretor do centro de pesquisas Diálogo Interamericano, Michael Shifter, que aponta uma atitude auto-suficiente de Lula: ;Existe uma impressão de que o presidente acredita ser um mágico, capaz de obter resultados onde outros falharam;.


HAARETZ.COM

Aceno de Teerã

O principal diário israelense destacava na tarde de ontem os acenos da liderança iraniana em direção a um acordo. O jornal cita declarações feitas horas antes do desembarque de Lula pelo porta-voz da chancelaria iraniana, Ramin Mehmanparast, que disse ver ;todas as condições capazes de levar a um acordo sério;.

Prós e contras
A emissora árabe discute a arojada manobra da diplomacia brasileira, que ;assume posição de liderança em uma questão internacional arriscada, que está além de sua esfera de influência;. E exibe comentários do professor Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos, contrário à aproximação com o Irã, e do embaixador Jório Dauster, favorável à iniciativa.

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