No dia em que completou 53 anos, o general da polícia colombiana Luis Herlindo Mendieta recebeu de presente a liberdade depois de quase 12 anos em poder das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). O coronel Enrique Murillo, que também foi resgatado ontem pelo Exército, vai ter a chance de ver os dois filhos que se lembram dele apenas por fotos. Os dois oficiais foram capturados em 1; de novembro de 1998, quando a guerrilha tomou Mitú, capital do departamento (estado) de Vaupés, na fronteira amazônica com o Brasil.
A libertação dos dois reféns foi anunciada pelo presidente Álvaro Uribe, a uma semana do segundo turno da eleição presidencial. O candidato de Uribe à sucessão, o ex-ministro Juan Manuel Santos, não perdeu tempo e aproveitou o encerramento oficial da campanha para prometer que, em seu governo, continuará a política de resgatar pela força os cerca de 20 policiais que continuam em cativeiro(1). Santos, que há dois anos respondia pela Defesa quando o exército libertou das Farc a ex-candidata presidencial Ingrid Betancourt ; além de três assessores americanos e uma dezena de militares e policiais ;, apareceu na última pesquisa com 65% das intenções de voto.
Durante visita a Quibdó, no noroeste do país, Uribe informou que as tropas continuavam enfrentando os guerrilheiros nas selvas do departamento de Guaviare, no leste, onde os oficiais foram resgatados. ;É uma operação muito difícil e estamos trabalhando nela durante meses. Mataram um de nossos sargentos, mas o general Mendieta e o coronel Murillo estão salvos, em poder das Forças Armadas, e continuamos o combate para tentar resgatar outros;, disse, sob aplausos.
A notícia foi recebida pelos familiares de Mendieta durante um almoço de comemoração do aniversário. ;Estávamos preparando uma galinha com toda a família quando escutamos o presidente. Nesse momento todos nos ajoelhamos e demos graças. É um milagre;, contou ao jornal El Tiempo Carmenza Mendieta, irmã do general. A mulher do ex-refém, Maria Teresa, comemorou com os dois filhos. ;Sou a mulher mais feliz do mundo e não vejo a hora de abraçá-lo;, disse à Rádio Caracol. Luiz Mendieta era conhecido na Colômbia por uma frase escrita em uma carta enviada à família: ;Não é a dor física que me detém, nem as correntes no meu pescoço o que me atormentam, e sim a agonia mental, a maldade do mau e a indiferença do bem;.
A notícia dominou o encerramento das campanhas para o segundo turno da eleição presidencial, marcado para este domingo. Santos, que nos últimos sete anos incentivou operações militares de resgate, muitas vezes sob críticas e protestos das famílias de reféns, reafirmou sua oposição frontal a qualquer negociação com as Farc para a troca dos sequestrados por rebeldes presos. ;O chamado acordo humanitário, de humanitário não tem nada. A única coisa que as Farc podem fazer é libertá-los unilateralmente. Troca não faremos, porque isso estimularia novamente o sequestro;, discursou. O ex-prefeito de Bogotá Antanas Mockus, candidato do Partido Verde, também reiterou que a libertação dos reféns é condição prévia para qualquer diálogo: ;A sociedade não cede ao terrorismo;.
1 - Decano na selva
O militar José Libio Martínez é o prisioneiro das Farc com mais tempo de cativeiro. O sargento do Exército foi capturado há quase 13 anos, em 21 de dezembro de 1997. Ele tinha 21 anos quando uma estação de comunicações no departamento de Nariño, no sul do país, foi atacada e destruída pelos guerrilheiros. A libertação do sargento é aguardada com ansiedade principalmente pelo filho Johan Steven, que nasceu três meses depois do sequestro e não conhece o pai.
Personagem da notícia
O comandante
Luis Herlindo Mendieta era até ontem o oficial da Polícia Nacional mantido por mais tempo em poder das Farc. Casado, pai de dois filhos, ele completou 53 anos no dia em que foi resgatado pelas tropas. Em novembro de 1998, Mendieta era tenente-coronel e comandava 120 homens na guarnição de Mitú, capital do departamento de Vaupés, uma cidade de 15 mil habitantes em plena Amazônia, próxima ao Brasil. Depois de resistir por 72 horas, sem chance de obter reforços, Mendieta se rendeu aos guerrilheiros, que o aprisionaram com mais 60 policiais. Antes, conseguiu telefonar para a mulher e os dois filhos, a quem deixou uma mensagem de amor e um pedido: ;Orem por mim e pelos rapazes;. Nos mais de 11 anos de cativeiro, o oficial assistiu a companheiros serem libertados ou morrerem. Apareceu em vídeos como prova de sobrevivência e sofreu enfermidades. Em 2009, graças a uma lei especial, foi promovido a general.
O insubmisso
Enrique Murillo Sanchéz era capitão da polícia e o terceiro na cadeia de comando de Mitú quando a guerrilha tomou de assalto a cidade e a guarnição, há mais de 11 anos. Nascido em Bogotá, o mais velho de quatro irmãos, Murillo tinha deixado para trás a mulher e duas crianças pequenas para ocupar o posto na remota capital amazônica. Durante o cativeiro, nas cartas que pôde enviar à família, manifestou sempre a esperança de rever e criar os filhos, cujo crescimento acompanhava apenas por fotos e correspondência, separados por longos intervalos. Entre as mensagens que pôde enviar, uma em especial chamou a atenção da opinião pública, pelo tom de desafio quase aberto aos captores. Dirigindo-se a sua mãe, Murillo pedia firmeza e dignidade nos apelos em favor da liberdade: ;Mamãezinha, não implore a eles (as Farc), não se humilhe diante deles;. Há sete anos, a família suportou a angústia de saber da morte do terceiro oficial que integrava o comando da polícia em Mitú, o capitão (promovido postumamente a major) Julián Guevara, cujos restos continuam em poder das Farc. Como Mendieta, Murillo foi beneficiado pela lei de promoções e recuperou a liberdade com a patente de tenente-coronel.