Mundo

Chefe das Farc condena o "continuísmo" do governo na Colômbia, mas convida ao diálogo

Exército reforça as operações para capturar o líder máximo da guerrilha

postado em 31/07/2010 07:00
A chegada à Presidência do homem que esteve por três anos à frente da luta contra a guerrilha na Colômbia foi o momento escolhido pelo líder das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Alfonso Cano, para abrir a guarda. A uma semana da posse de Juan Manuel Santos, que foi ministro da Defesa entre 2006 e 2009, foi divulgado pelo blog da revista dos paramilitares colombianos Resistencia um vídeo no qual Cano propõe ao novo governo ;conversar; e buscar uma ;saída política; ao conflito armado. Esta é a primeira vez desde que Álvaro Uribe assumiu, em 2002, que uma autoridade das Farc oferece abertamente uma saída diplomática com o governo.

Cano, como é conhecido Guillermo León Sáenz, disse esperar que o governo ;não engane mais o país;, como alega que foi feito nos dois mandatos de Uribe. ;O que estamos propondo hoje, mais uma vez, é conversarmos. Continuamos empenhados em buscar saídas políticas. Desejamos que o futuro governo reflita;, disse o intelectual que comanda as Farc desde 2008, quando seu fundador, Manuel Marulanda ;Tirofijo;, morreu de ataque cardíaco. O vídeo de 36 minutos teria sido gravado neste mês, ;nas montanhas da Colômbia;. Para evitar que seu paradeiro seja reconhecido, no entanto, Cano, aparece em frente a um tecido camuflado.

Ele propõe que, nas conversas com o governo, sejam abordados assuntos que ;precisam ser tocados;. ;Temos de buscar o ponto de confluência, onde possamos, com a maioria dos colombianos, identificar as dificuldades, os problemas, as contradições, e gerar a partir disso perspectivas, caminhos, saídas, possibilidades. (;) Falaremos da falta de dignidade que representa ter na Colômbia sete bases com tropas militares dos Estados Unidos;, declarou um Cano visivelmente envelhecido em comparação com as imagens mais recentes, de dois anos atrás.

Mas, ao mesmo tempo em que estende a mão ao diálogo, o líder da guerrilha afirma que a vitória de Santos ; aliado de Uribe ; garante à oligarquia colombiana a continuação de suas políticas e estratégias, e deixa ao novo mandatário a missão de ; blindar o governo que sai da ação da justiça nacional e internacional;. ;Este regime político está cheio de ilegitimidade, porque foi permeado profundamente pelo narcotráfico, pela corrupção administrativa e pela impunidade;, acrescenta.

Caçada
O anúncio de Cano coincide com intensas operações militares para capturar o líder das Farc. As Forças Militares têm se concentrado nos comandantes responsáveis diretamente pela segurança do líder máximo. Para isso enviaram uma força-tarefa de 5 mil homens para os departamentos (estados) de Tolima, Nariño, Huila e Cauca. Uma das maiores perdas para Cano ocorreu no último dia 11, quando Angie Marín, conhecida como Mayerly, e os outros 11 rebeldes que ela liderava, morreram em um bombardeio aéreo ao acampamento em que se encontravam, no município de Planadas (Tolima).

Em entrevista à revista colombiana Semana, o general Juan Pablo Rodríguez, comandante da 5; Divisão do Exército, comemorou as conquistas recentes das operações no sudoeste do país, apesar de admitir que não será fácil chegar a Cano. ;As informações que temos estão nos levando ao local certo, mas é uma área inóspita, difícil de penetrar;, disse. ;Temos de continuar, o êxito vem da perseverança;, completou, indicando que, para Santos aceitar a oferta de diálogo das Farc, terá antes de convencer o Exército a frear as operações.

Para o cientista político León Valencia, diretor da Corporação Novo Arco Íris e guerrilheiro desmobilizado do grupo M-19, seria interessante para o novo presidente considerar o convite de Cano ao diálogo. ;Esse seria o momento perfeito para achar uma saída negociada para acabar com o conflito;, destaca, em referência à mudança de governo e ao enfraquecimento da guerrilha. Ele acredita, contudo, que o avanço militar não pode parar.

ONU denuncia impunidade
O Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas denunciou ontem a impunidade dos esquadrões de direita que cometeram graves violações dos direitos humanos na Colômbia, nos últimos anos. ;Entre os mais de 30 mil paramilitares desmobilizados, a grande maioria não se enquadrou à Lei n; 975 de 2005, e falta clareza sobre sua situação jurídica;, indica uma resolução publicada em Genebra. ;Conseguiu-se apenas uma sentença condenatória contra duas pessoas e foram abertas poucas investigações, apesar da sistemática violência revelada pelos paramilitares em declarações informais;, acrescenta o documento do comitê, que vigia o cumprimento do Pacto de Direitos Civis e Políticos da ONU.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação