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A guerra está perto do fim, diz Obama

Em discurso para veteranos incapacitados, o presidente americano revela que a missão de combate no país termina no próximo dia 31, mas admite que a situação no Afeganistão ainda é complicada

postado em 03/08/2010 08:15

A plateia era formada por militares que quase perderam a própria vida no front e ficaram com graves sequelas. Sob aplausos, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, reafirmou a promessa de campanha. Dessa vez, suas palavras soaram mais como um anúncio. ;Enquanto candidato à Presidência, prometi levar a guerra no Iraque a um fim responsável. Logo após tomar posse, anunciei nossa nova estratégia para o Iraque e para uma transição para a reponsabilidade iraquiana absoluta;, disse Barack Obama, na manhã de ontem, durante a Convenção Nacional dos Veteranos Americanos Incapacitados, em Atlanta (Geórgia).

;Deixei claro que, em 31 de agosto de 2010, a missão de combate no Iraque chegaria ao fim. E é exatamente o que estamos fazendo ; conforme o prometido e dentro do cronograma;, acrescentou Obama. O mandatário lembrou que, em muitas áreas do país ocupado, os iraquianos já se responsabilizam pela segurança. ;No próximo mês, mudaremos nossa missão do combate para o apoio e o treinamento das forças de segurança iraquianas.;

Ouça entrevista com o cientista político iraquiano Louay Bahry

Ainda segundo Obama, todos os soldados norte-americanos serão retirados do Iraque antes do fim de 2011 ; até lá, uma força de transição ajudará as tropas iraquianas em missões de contraterrorismo, além de treiná-las, e a proteger civis e militares. O presidente admitiu que ;haverá aqueles que, com bombas e balas, tentarão deter o progresso do Iraque;. No entanto, ele foi enfático sobre a mudança de postura de seu governo. ;Nosso comprometimento no Iraque está mudando ; de um esforço militar, liderado por nossas tropas, para um esforço civil, conduzido por nossos diplomatas;, declarou. Obama assegurou que, ;por causa do sacrifício; das tropas dos EUA e de parceiros iraquianos, ;a violência no Iraque continua próxima de seu nível mais baixo em anos;.

O otimismo presidencial contrasta com os números do conflito. De acordo com autoridades do Iraque, 535 pessoas morreram em atentados no país apenas em julho ; o mês mais mortífero em dois anos. Ex-professor de ciência política na Universidade de Bagdá, o iraquiano Louay Bahry acredita que a filosofia por trás da guerra mudou nos Estados Unidos. ;Se (George W.) Bush pretendia construir a democracia no Iraque, Obama almeja levar estabilidade ao país e dar autonomia ao governo do premiê xiita Nuri Al-Maliki;, explica ao Correio, por telefone, de Washington. ;Meu povo quer resolver seus próprios problemas, não quer depender tanto dos soldados americanos, mas usar as ferramentas políticas para trazer paz ao Iraque;, acrescenta.

Barack Obama saúda veteranos, em Atlanta: cronograma cumprido à risca e apoio à autonomia do governoBahry não teme a ação da rede terrorista Al-Qaeda no Iraque e confia que o governo de Al-Maliki construirá uma inteligência coesa, capaz de fazer frente à ameaça. ;A Al-Qaeda já não é tão forte como foi em 2005. Por isso, está começando a assassinar líderes sunitas e membros do Exército ; antes, os xiitas eram alvo;, comenta. ;Os extremistas seguirão com sua campanha de desestabilização, com assassinatos espetaculares e atentados à bomba. Mas isso tem ocorrido pelos últimos cinco anos.; Por sua vez, Kawa Karem Sabir, morador de Sulaimanya (norte do Iraque), elogia a ;sabedoria; de Obama em anunciar o fim da guerra. ;Nossa economia tem se fortalecido, os EUA aumentaram os passos rumo à democracia em nosso país e as pessoas não creem na Al-Qaeda. Todos os ataques aqui têm sido realizados pelos serviços de inteligência do Irã e da Síria;, denuncia.

Desafios
Barack Obama aproveitou o discurso aos veteranos de guerra para alertar que os militares norte-americanos ainda enfrentarão ;imensos desafios no Afeganistão;. ;Quase todas as forças que eu destaquei para o país estão em seus lugares. Com nossos parceiros afegãos e internacionais, estão realizando uma ofensiva contra o Talibã, atingindo seus líderes, desafiando-os em regiões onde reinavam livremente e treinando forças de segurança nacional afegãs;, disse. Segundo ele, se o Afeganistão for tragado por uma insurgência mais ampla, a Al-Qaeda e seus terroristas afiliados terão mais espaço para planejar o próximo ataque. ;Como presidente dos Estados Unidos, eu me recuso a permitir que isso ocorra;, garantiu.

Irã quer debate na TV

Desafiador, irônico e destemido, o presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, respondeu à suposta ameaça de uma ofensiva militar dos Estados Unidos com um convite. ;Tenho que viajar em setembro a Nova York para participar da Assembleia Geral das Nações Unidas. Estou disposto a sentar com Obama, cara a cara, de homem para homem, para falar livremente sobre questões mundiais, ante os meios de comunicação;, afirmou o mandatário, durante discurso transmitido pela TV estatal do Irã.

Na véspera, o almirante Mike Mullen, chefe do Estado-Maior das Forças Armadas norte-americanas, havia admitido que os EUA já têm um plano para atacar o país de Ahmadinejad, apesar de reconhecer que uma ação militar é ;indesejável;. ;Nossa resposta a qualquer ataque será firme, e os EUA estão cientes de que o Golfo Pérsico é uma região estratégica, e colocá-la em perigo também seria o mesmo que pôr em risco os interesses americanos;, advertiu o general Yadollah Javani, vice-chefe da Guarda Revolucionária Islâmica.

Por e-mail, o iraniano Ali Alfoneh ; analista do American Enterprise Institute ; afirmou que o governo Obama considera um circo midiático o convite de Ahmadinejad para um debate televisivo. ;A percepção americana é especialmente verdadeira, porque as instâncias decisórias na República Islâmica do Irã, incluindo as relações com os EUA, são controladas não pela presidência, mas pelo aiatolá Ali Khamenei;, afirma ao Correio. O historiador Mariaz Behrooz, da Universidade Estadual de San Francisco, tem a mesma opinião. ;A oferta de Ahmadinejad é um golpe de publicidade. Não acho que Teerã espera uma resposta positiva de Washington. Esse tipo de debate não consta da tradição das Nações Unidas e nunca antes ocorreu;, explica, também por e-mail.

Behrooz duvida que os Estados Unidos planejem realmente lançar bombas sobre seu país. ;Atacar o Irã resultaria em uma resposta iraniana que envolveria muitos alvos, inclusive bases dos EUA espalhadas pelo Oriente Média;, adverte. ;Mas os americanos já estão envolvidos demais na região e é mais provável que a Casa Branca aguarde para ver que efeitos as sanções terão;, acrescenta. Na opinião do historiador, uma campanha bélica contra Teerã não colocaria ponto final ao programa nuclear iraniano. ;Ahmadinejad se retiraria do Tratado de Não Proliferação e manteria o enriquecimento de urânio;, aposta.

Insanidade
O também iraniano Farideh Farhi, especialista em Irã pela Universidade do Havaí, sustenta que Teerã é incapaz de debelar uma ofensiva norte-americana. ;O regime tem se preparado para uma guerra de guerrilha irregular e não convencional, que incluiria a completa interrupção do fornecimento de petróleo por meio do Estreito de Hormuz e ataques a forças americanas no Iraque, no Afeganistão e em todo o Golfo Pérsico;, prevê, em entrevista ao Correio. Para ele, uma ação militar poderia desestabilizar o Oriente Médio, região crucial para a economia mundial. ;Um ataque dos EUA ao Irã seria uma ideia insana;, adverte.

Ouça a entrevista com o cientista político iraquiano Louay Bahry

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