Nem todo o ouro e o cobre da mina San José, no norte do Chile, substituirão o valor da água, do oxigênio e dos alimentos que começaram a ser enviados ontem a 33 operários presos 700m abaixo da superfície. O estreito duto por onde os mineiros se comunicaram com as equipes de resgate foi reforçado, e ontem as autoridades enviaram a primeira sonda para os sobreviventes do desabamento, ocorrido há 19 dias. ;Iniciamos o envio de água com glicose e de outros elementos que permitirão mantê-los com vida;, disse o ministro da Mineração, Laurence Golborne.
No acampamento batizado de Esperança, em frente à entrada da mina, que fica na cidade de Copiapo (veja o mapa), familiares e amigos celebraram com orações e festa a mensagem recebida em um papel amassado, na noite de domingo: ;Estamos bem no refúgio, os 33;. Um dos familiares, entrevistado pelo jornal La Tercera, até brincou. ;Estou aqui há 18 dias e não vou embora. Sabe por quê? Porque o Omar me deve dinheiro e vou cobrá-lo quando ele sair;, gracejou Claudio Acevedo, sogro do mineiro Omar Reygadas. As autoridades calculam que as escavações podem durar de um mês a quatro meses.
Depois do desabamento, os 32 operários chilenos e um boliviano conseguiram chegar ao ponto de refúgio e passam bem. Eles já perderam cerca de 7kg cada um, mas conseguiram se manter vivos graças aos mantimentos armazenados. O desafio agora será manter o controle psicológico: conservar o ritmo de sono, alimentar a esperança, manter a coesão do grupo no espaço de confinamento. ;É mais fácil sobreviver em grupo. Sozinho, você pode acabar ficando desesperado, achando que tudo está perdido. Em grupo, se você fraquejar, os outros vão te ajudar;, explicou à agência de notícias France Presse o espeleólogo e cientista Michel Siffre, que passou dois meses sozinho a menos de 100m de profundidade e à temperatura de zero grau, em 1962.
No entanto, uma experiência conduzida há várias décadas pela Nasa mostrou que quatro dos membros de uma missão espacial não conseguiam suportar o quinto companheiro e quiseram até matá-lo. ;Em situações entre a vida e morte, Darwin explica, o mais forte sobrevive. E a atitude mental é primordial. É preciso ter fé. Aqueles que acreditam na sobrevivência têm mais chances de sair com vida do que aqueles que se entregam à sorte;, pondera Sif-fre. O especialista diz que, para organizar a vida em grupo, é necessário que apareçam ;chefes; ou ;líderes;. ;A ajuda que os ;velhinhos; prestarão também é fundamental;, acredita Alicia Ocaranza, parente dos mineiros Esteban e Paulo Rojas. ;Nota-se que os mineiros mais experientes começaram a liderar o grupo, e isso serviu para mantê-los unidos;, contou Alicia.
Outro problema será a percepção da passagem do tempo pelo organismo de cada um. ;Esse relógio biológico difere ligeiramente de indivíduo para indivíduo. Algumas vezes, todos vão sincronizar o ;relógio; em um ritmo médio; em outras, um indivíduo vai impor o seu ritmo aos outros;, explicou Sophie Lumineau, professora e pesquisadora de cronobiologia da Universidade de Rennes. A comunicação com os socorristas deverá informar o ritmo do mundo exterior. A prefeita de Atacama, Ximena Matas, disse ontem que um telefone de campanha será instalado em um segundo duto. A comida deverá ser enviada em horários fixos, e eles poderão ter iluminação com a ajuda de lâmpadas encaminhadas através de um tubo.
Além do desafio de sobreviver ao calor de 33 graus e à umidade dentro da mina, o secretário-geral da Federação Francesa de Espeleologia, Henry Vaumoron, diz que o ideal será que os sobreviventes recebam alimentos liquefeitos. ;Quanto menos eles forem ao banheiro, melhor. Quando se está preso sob a terra, é preciso enterrar os excrementos;, explicou. ;O que precisamos fazer agora é garantir a segurança desse cordão umbilical, para ficarmos conectados com os mineiros e os mantermos vivos;, concluiu Andre Sougarret, gerente da mineradora El Teniente, que realiza a escavação.