postado em 02/09/2010 07:00
Palestinos e israelenses retomam hoje as negociações diretas, em Washington, em meio à tensão acirrada sobre um dos temas mais controversos no processo de paz: os assentamentos judaicos em territórios palestinos. Apesar da disposição demonstrada tanto pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, quanto pelo presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmud Abbas, ficou claro que a moratória de construções nas colônias terminará mesmo neste mês, contrariando uma condição que o lado árabe considera ;vital; para o avanço das conversações. O anfitrião, Barack Obama, pediu aos dois líderes que ;aproveitem a chance;: ;É hora de os líderes que têm coragem e visão selarem a paz que seus povos merecem;.Netanyahu e Abbas chegaram aos EUA sob impacto de um ataque reivindicado pelo grupo radical palestino Hamas, que deixou quatro israelenses mortos na Cisjordânia, na última terça-feira. Ontem, mais dois israelenses ficaram feridos por disparos enquanto passavam pela colônia de Rimonim, na região de Ramallah. O primeiro atentado levou os parlamentares israelenses mais conservadores a pedirem a suspensão do início do diálogo direto. A Autoridade Palestina, por sua vez, tentou amenizar a situação ordenando a prisão de 250 integrantes do Hamas na Cisjordânia, a fim de mostrar compromisso com uma solução pacífica. A decisão da AP, contudo, foi considerada uma ;traição sem precedentes; pelos extremistas.
Sob pressão intensa dos colonos, que formam parte substancial do eleitorado de seu partido, o direitista Likud, Netanyahu disse à secretária de Estado Hillary Clinton que não vai prorrogar o período de congelamento das colônias, que se encerra no próximo dia 26. O porta-voz da Presidência palestina, Nabil Abu Rudeina, alertou que essa decisão significará ;o fim do processo de paz;: ;O reatamento da colonização condenaria as negociações ao fracasso;.
A posição foi reforçada pelo presidente do Egito, Hosni Mubarak, um dos principais mediadores do conflito, que também se encontrou com Obama ; também era esperado na Casa Branca o rei da Jordânia, Abdullah II. ;Uma completa interrupção da expansão dos assentamentos na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental é vital para que as negociações sejam um sucesso;, afirmou Mubarak em entrevista ao The New York Times.
Parceiros na paz
No discurso, contudo, os dois lados se disseram empenhados. Netanyahu declarou que deseja pôr um fim ao conflito com os palestinos ;de uma vez por todas;, e chamou Abbas de ;parceiro na paz;. O presidente palestino, por sua vez, disse que é possível alcançar a paz com Israel no prazo de um ano, estipulado pelo Quarteto (ONU, EUA, Rússia e União Europeia), quando as negociações diretas foram anunciadas. ;Um ano é muito tempo;, disse Abbas ao jornal palestino Al-Ayyam. Ele, entretanto, pediu que Netanyahu considere o que já foi negociado com os governos israelenses anteriores e que, nas conversas que se reiniciam hoje, sejam considerados todos os detalhes discutidos, por meio de mediadores, nos últimos 10 meses. Já o premiê israelense destacou que ;a paz também deve ser defendida por seus inimigos;.
Na véspera do ;reinício; das negociações diretas, outro tema espinhoso voltou à tona e causou aparente mal-estar na cúpula israelense. Em entrevista ao jornal israelense Haaretz, o ministro da Defesa, Ehud Barak, disse que ;os bairros árabes de Jerusalém; ; o que pode ser interpretado como Jerusalém Oriental ; poderiam ser entregues aos palestinos, como parte de um acordo de paz. ;Jerusalém Ocidental e os 12 bairros judaicos, onde vivem cerca de 200 mil israelenses, ficariam conosco. Os bairros árabes, onde vivem cerca de 250 mil palestinos, serão deles;, disse. Em Washington, um assessor de Netanyahu desmentiu que tal possibilidade esteja sendo estudada. ;Jerusalém é um dos assuntos centrais que estão sobre a mesa de negociações. Nossa postura é de que continuará sendo a capital indivisível de Israel;, assegurou.
Cronologia das negociações diretas israelo-palestinas desde Oslo
A retomada das negociações diretas entre israelenses e palestinos será o mais recente episódio no longo histórico das conversações de paz iniciadas em 1993 em Oslo, na Noruega. Apesar dos avanços registrados em pontos isolados, as negociações nunca levaram a um acordo geral. Assim, 17 anos depois, as duas partes encontram-se praticamente de volta à estaca zero.
13 de setembro de 1993
Após seis meses de negociações secretas e diretas em Oslo, Israel e a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) se reconhecem mutuamente e assinam em Washington uma declaração de princípios estabelecendo uma autonomia palestina transitória de cinco anos. O primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin e o dirigente palestino Yasser Arafat apertam as mãos em um gesto histórico.
4 de maio de 1994
Acordo sobre a autonomia de Gaza e Jericó (Cisjordânia) é ratificado no Cairo. Israel evacua 70% da Faixa de Gaza e do enclave de Jericó.
28 de setembro de 1995
Em Washington, é fechado o acordo interino ("Oslo II") sobre a extensão da autonomia na Cisjordânia, que prevê uma série de retiradas israelenses.
23 de outubro de 1998
Em Wye Plantation (Estados Unidos), é assinado um acordo interino sobre as modalidades de uma retirada israelense de 13% da Cisjordânia.
11-25 de julho de 2000
Na cúpula de Camp David (Estados Unidos), palestinos e israelenses não conseguem checar a um consenso, principalmente em torno do problema de Jerusalém e dos refugiados de 1948. Dois meses depois começa a segunda Intifada.
Janeiro de 2001
Começam em Taba, no Egito, conversações sobre a base do plano de paz do presidente americano Bill Clinton. Apesar dos avanços sem precedentes, a falta de tempo impede um acordo concreto. Um mês depois, o primeiro-ministro israelense Ehud Barak é derrotado nas eleições pelo líder da direita conservadora Ariel Sharon.
30 de abril de 2003
Publicação do "Mapa do Caminho", elaborado pelo Quarteto para o Oriente Médio (Estados Unidos, Rússia, União Europea, ONU), que prevê a criação de um Estado palestino até 2005 depois do fim da violência palestina e a suspensão da colonização israelense. O "Mapa do Caminho" foi ratificado em 4 de junho de 2003 em Aqaba (Jordânia) pelos primeiros-ministros de Israel, Ariel Sharon ; com reservas em relação à colonização ; e da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, na presença do presidente americano George W. Bush.
27 de novembro de 2007
Em Annapolis (Estados Unidos), Israel e a Autoridade Palestina, que passou a controlar apenas a Cisjordânia depois de ter sido expulsa de Gaza pelo Hamas, é negociado um acordo de paz para 2008. Durante dezenas de sessões avançam sobre uma troca de territórios na Cisjordânia, sem resultados.
Janeiro de 2009
A Autoridade Palestina se retira das negociações em protesto à operação militar israelense na Faixa de Gaza.
Os temas que dominam o conflito entre israelenses e palestinos
Dezessete anos depois do início do processo de paz de Oslo, as posições dos dois lados continuam muito afastadas, mas as grandes linhas de um acordo de paz são amplamente conhecidas.
* Criação de um estado palestino e seus poderes
Os palestinos querem um Estado soberano no conjunto dos territórios palestinos ocupados por Israel em junho de 1967: Jerusalém Oriental, toda a Cisjordânia e a Faixa de Gaza. Israel reclama a desmilitarização deste Estado, o controle de seu espaço aéreo e de suas fronteiras.
* Traçado das fronteiras do estado palestino, destino das colônias
Os palestinos exigem uma retirada israelense de todos os territórios ocupados desde 1967, mas estão dispostos a aceitar modificações fronteiriças menores com base em trocas de territórios equivalentes com Israel.
Israel descarta categoricamente voltar às fronteiras anteriores a 1967, mas está disposto a aceitar retiradas na Cisjordânia. Quer anexar os blocos de assentamentos onde vive a grande maioria dos 300.000 colonos judeus, à parte de Jerusalém Oriental.
Os palestinos exigem o congelamento da colonização, que compromete a continuidade territorial do futuro Estado. Já advertiram que a retomada das atividades de colonização marcaria o fim das conversações.
* Estatuto de Jerusalém
Israel considera Jerusalém, incluindo sua parte oriental, como sua capital " indivisível e eterna" .
A Autoridade Palestina quer fazer de Jerusalém Oriental, cuja anexação nunca foi reconhecida pela comunidade internacional e onde vivem 260.000 palestinos e mais de 200.000 israelenses, a capital de seu Estado.
Israel insiste em manter o controle de toda a área da Cidade Antiga, sede de alguns dos principais locais sagrados das três religiões monoteístas (islamismo, judaísmo e cristianismo). Os palestinos são categoricamente contrários a isto.
* Destino dos refugiados
Há quatro milhões de refugiados palestinos, em sua grande maioria descendentes de 700.000 palestinos que fugiram ou foram expulsos de suas terras durante a criação do Estado de Israel, em 1948.
Os palestinos exigem que Israel reconheça um direito ao retorno dos refugiados em suas fronteiras, de acordo com resolução 194 da Assembleia Geral da ONU.
Na prática, os negociadores palestinos insistem sobretudo no reconhecimento do princípio deste direito mais que em sua aplicação, que de fato dependeria de Israel.
Israel rejeita categoricamente a aplicação do " direito ao retorno" . O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu quer que os palestinos reconheçam Israel como " o Estado do povo judeu" para que, segundo ele, fique garantido que a questão dos refugiados será resolvida dentro do futuro Estado palestino.
* Controle da água
Israel se reserva grande parte dos lençóis freáticos no subsolo da Cisjordânia. Os palestinos reclamam uma distribuição equitativa.