Agência France-Presse
postado em 22/09/2010 14:16
Cidade do Vaticano - A investigação judicial contra dois dirigentes do Banco do Vaticano, suspeitos de violar as leis italianas contra a lavagem de dinheiro, reconduz a instituição bancária da Santa Sé para o olho do furacão após os escândalos que a abalaram na década de 80.[SAIBAMAIS]"Um erro de procedimento foi usado como pretexto para atacar o Instituto para as Obras de Religião (mais conhecida como Banco do Vaticano), o presidente e o Vaticano", defendeu-se nesta quarta-feira (22/9) Ettore Gotti Tedeschi, presidente do banco, em declarações ao jornal Il Giornale.
Designado no ano passado para gerenciar as contas do IOR, Gotti Tedeschi, simpatizante do Opus Dei e presidente do Banco Santander na Itália durante anos, está no centro do novo escândalo de lavagem financeira no Vaticano.
"Sinto (a denúncia) como algo injusto, porque levamos 10 meses trabalhando com as autoridades nacionais e internacionais em torno deste tema, em particular com a Gafi", organismo internacional à frente do combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, explicou.
Junto com o presidente do IOR está sendo interrogado o diretor geral da entidade, Paolo Cipriani, também acusado de ter cometido irregularidades na transferência de 23 milhões de euros (US$ 30 milhões).
"É inevitável que esses escândalos se repitam, uma vez que o IOR não adere às normas internacionais contra a lavagem", disse à AFP o italiano Gianluigi Nuzzi, autor do livro "Vaticano Spa" ("Vaticano Sociedade Anônima").
"O problema do IOR são as contas anônimas de fundos de beneficência inexistentes ou de sacerdotes testa-de-ferro, que o banco não sabe quem são", explicou Nuzzi, que investigou as finanças da Santa Sé depois do colossal escândalo político-financeiro dos anos 80 provocado pela quebra fraudulenta, em 1982, do então maior banco privado da Itália, o Banco Ambrosiano.
O IOR, que continua manejando contas de ordens religiosas e outras associações católicas que utilizam o status de paraíso fiscal da Santa Sé, foi dirigido na década de 80 pelo polêmico arcebispo americano Paul Marcinkus, muito próximo a João Paulo II, que sempre o protegeu.
O escândalo, que custou a vida, entre outros, do banqueiro Roberto Calvi, encontrado misteriosamente enforcado sob a ponte Blackfriars, em Londres, trouxe à tona as relações ocultas entre o banco do Vaticano, a loja maçônica P2 de Licio Gelli e a máfia siciliana.
Pela primeira vez em 30 anos, os diretores do IOR estão na mira da justiça italiana, a pedido das autoridades bancárias nacionais, que acompanham com mais atenção e independência as atividades da instituição vaticana.
"Não é correto atribuir a Bento XVI o escândalo do banco, como ocorreu com João Paulo II, porque este papa começou a mudar as regras da gestão financeira da Santa Sé", defende o vaticanista Iacopo Scaramuzzi, procurado pela AFP.
Para o Avvenire, jornal da Conferência Episcopal Italiana, o comportamento dos juízes italianos é "inexplicável e ofensivo".
O Vaticano, que nesta quarta-feira ainda não voltou a se pronunciar sobre o assunto, expressou na terça-feira "surpresa" e "perplexidade" diante da investigação judicial, declarando sua "máxima confiança" nos dirigentes do banco envolvidos.
"Queremos cumprir as recomendações do Banco Central italiano e dos demais organismos internacionais", declarou Gotti Tedeschi, prometendo o que muitos observadores e especialistas reclamam: "transparência".